Dois terços dos navios de recreio no Mediterrâneo transportam espécies invasoras
As marinas na zona oriental do Mediterrâneo apresentam a maior concentração de espécies de invertebrados não nativas.
O Mediterrâneo é o mar que alberga o maior número de espécies não nativas. É também um dos destinos preferidos para os navios de recreio, que chegam de vários pontos do mundo. Cientistas da Universidade de Pavia (Itália) quiseram saber se existia alguma relação entre o número de espécies exógenas e a circulação dessas embarcações. Descobriram que 71% dos barcos analisados transportavam pelo menos uma espécie de invertebrado não nativa no casco, através de incrustação biológica – presença de seres vivos nas partes submersas das embarcações.
As marinas na parte oriental do Mediterrâneo apresentavam a maior concentração de espécies invasoras. Aylin Ulman, primeira autora do estudo, explica, em comunicado da Sociedade Ecológica Britânica, que isso acontece porque a maior parte dessas espécies entra pelo Canal do Suez – a leste do Mediterrâneo. Assim, os barcos que visitam as marinas no Leste estão mais propensos à proliferação de espécies exógenas nos seus cascos. Mais de metade dos navios abrangidos pelo estudo transportava espécies que não eram endémicas da marina que iam visitar.
Os barcos de recreio abrangidos pelo estudo visitavam em média 7,5 marinas diferentes anualmente e chegavam de diferentes partes do mundo, acentuando o risco de disseminação de espécies invasoras. A maioria das embarcações visitava o Mediterrâneo durante os meses de Verão, altura em que normalmente ocorre a desova dos invertebrados, o que também pode contribuir para o aumento da dispersão das espécies não indígenas.
O estudo, publicado na revista Journal of Applied Ecology, é o primeiro a fazer a análise da incrustação biológica juntamente com entrevistas às tripulações no mar Mediterrâneo. A equipa recolheu amostras de incrustação biológica em mais de 600 barcos presentes em 25 marinas diferentes, da França até a Chipre, passando por Itália, pela Grécia e Turquia. As tripulações foram entrevistadas para saber o percurso feito pelas embarcações e a última vez que os cascos tinham sido limpos para remover a incrustação biológica.
É preciso regulamentação
Os barcos eram limpos em terra, por profissionais, ou na água, pelos próprios donos. Após serem limpos por profissionais, havia espécies a reaparecer semanas mais tarde, em algumas embarcações – devido à elevada incrustação de certas marinas. Quando o casco era limpo pelos proprietários, algumas partes de difícil alcance podiam escapar à limpeza. Nesse caso, as espécies voltavam a proliferar uma semana depois. “De modo a impedir que a dispersão continue, os pontões das marinas devem ser limpos regularmente e os barcos que chegam às marinas devem ser examinados para perceber se precisam de limpeza profissional ou não”, aconselha Aylin Ulman.
Alguns navios apresentavam pequenos amontoados de incrustação biológica, que, apesar das pequenas dimensões, podiam conter até 11 espécies não nativas. “A incrustação biológica é um factor determinante na difusão de espécies invasoras marinhas no Mediterrâneo e precisa de ser regulamentada”, avisa Aylin Ulman.
Os investigadores identificaram várias espécies de invertebrados nas amostras, incluindo moluscos e crustáceos. O número de espécies invasoras pode ser ainda maior, uma vez que neste estudo não foram identificadas as espécies de algas, por falta de tempo. Além disso, não foram analisados os navios e as marinas do Sul do Mediterrâneo, devido a limitações de financiamento.