Greve climática
Cartazes ensopados, gargantas quentes: no Porto, a chuva afugentou, mas não calou os grevistas
Vestido de Mãe Natal, um jovem segura um cartaz com a lista dos “meninos mal-educados” que não merecem receber prendas este Natal: João Pedro Matos Fernandes, António Costa, Donald Trump e Jair Bolsonaro. Chama-se André Paupério, tem 20 anos e tirou a tarde para participar na Greve Climática Estudantil, que esta sexta-feira, 29 de Novembro, juntou activistas em frente à Câmara Municipal do Porto, pela quarta vez este ano. Por todo o mundo, centenas de milhares de estudantes saíram à rua para pedir justiça climática — mas, no Porto, a chuva prejudicou os protestos, juntando apenas cerca de 100 pessoas, estimaram agentes da PSP ao P3. Em Lisboa, terão sido cerca de mil.
Mesmo assim, as más condições meteorológicas não intimidaram os que marcaram presença na Avenida dos Aliados, poucos dias antes da chegada de Greta Thunberg a Portugal. Ainda não eram 15h — a hora marcada para o início da manifestação — quando se começaram a ouvir as primeiras palavras de ordem. Debaixo de guarda-chuvas ou cobertos por capas impermeáveis, com cartazes ensopados, os jovens gritavam: “A nossa luta é todo o dia, é pela água, floresta e energia.”
Renata Cambra, de 28 anos, participa pela segunda vez na Greve Climática e todas as sextas-feiras, desde 27 de Setembro, senta-se em frente à Câmara Municipal, em protesto silencioso, com um grupo que varia “entre as cinco e 20 pessoas”. A pouca adesão a esta greve não foi uma surpresa: “Já sabíamos que a chuva e a época de exames iriam prejudicar o protesto”, explica. Ainda assim, os jovens decidiram manter os planos e sair à rua em plena Black Friday. Tudo propositado: “Pensámos isso a nível internacional. Participámos em algumas reuniões internacionais do Fridays for Future e o tema era ‘Stop overproduction’, no sentido em que a sobreprodução de presentes é a sobreprodução de CO2.”
Voltaram a sair à rua porque “há muita coisa que o Governo ainda tem de mudar”, explica Gabriela Gomes. Em vez de um cartaz, a activista de 14 anos segura o megafone (que lhe é retirado das mãos enquanto fala com o P3 — “Posso gritar?”, pergunta-lhe a jovem que o leva). “Os partidos estiveram todos virados para as alterações climáticas nestas eleições, mas agora arrancaram com o projecto do aeroporto do Montijo e continuam as explorações de lítio”, refere. Além destas preocupações, Renata Cambra aponta também “as dragagens do Sado e a prospecção de gás natural na Bajouca e Aljubarrota” e “o fecho das centrais termoeléctricas de Sines e do Pego — que é importante, mas deveria acontecer com transição energética”.
Por tudo isso, reivindicam “acção concreta”. A declaração de emergência climática feita pelo Parlamento Europeu esta quinta-feira é “positiva”, mas Gabriela teme que a acção não passe do “simbolismo”. E por recear o mesmo, Renata sublinha a importância “do movimento e de continuar a protestar”: “Não precisamos só de retórica, precisamos de prática.”
A gritar palavras de ordem sem cessar, estes estudantes unem-se pelo medo de um futuro incerto: “Temo que não haja maneira de voltar atrás no que toca às alterações climáticas”, diz Miguel Costa, de 15 anos; “O meu maior medo é que daqui a uns anos o mundo se envolva em guerras pelos mais básicos recursos naturais”, aponta João Leal, 22 anos. Para André Paupério, a Mãe Natal desta greve, é tão simples quanto isto: “Que o nosso planeta não dure muitos mais Natais”.