Um novo Indicador de Saúde a incluir nos Cuidados de Saúde Primários
Atualmente, com a disponibilidade cada vez maior e mais generalizada a todo o país de cuidados e vigilância em saúde oral nos Centros de Saúde, esta medida tem todas as condições para poder e dever ser posta em prática no mais curto espaço de tempo.
A criação do Plano Nacional de Promoção de Saúde Oral, cuja versão 2019 acabou recentemente de estar em Audição Pública, foi um marco muito importante no que respeita aos cuidados de saúde oral da população portuguesa no âmbito da promoção da saúde, da prevenção e do tratamento precoce das doenças orais. Tendo por base esse documento, e no decurso das estratégias adotadas ao longo de mais de uma década, a contratualização de Médicos Dentistas para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) para a prestação de consultas de saúde oral nos Cuidados de Saúde Primários (CSP), integrando a Unidade de Recursos Assistenciais Partilhados dos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES), foi sendo concretizada e disseminada por todo o território português.
O acesso a cuidados de medicina dentária, alargado em 2017 a todos os utentes inscritos nos ACES que já disponham de Médico Dentista, passou a estar apenas na dependência do critério do médico de família para a respetiva referenciação. Creio, por isso, que chegou o momento de se integrar a medicina dentária na matriz multidimensional constante da Lista de Indicadores e da Operacionalização da Contratualização nos CSP das Unidades de Saúde Familiar (USF) e Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP). A própria Administração Central do Sistema de Saúde reconhece que “para efeitos de monitorização da respetiva matriz, foram indexados um conjunto de indicadores a cada dimensão, que permitem acompanhar o percurso de cada unidade, promovendo assim uma monitorização contínua e uma avaliação sustentada na evidência do que é traduzido pelos indicadores validados na matriz” e, nesse sentido, deverá também a Saúde Oral/Medicina Dentária ser incluída como indicador-complemento duma avaliação clínica de qualidade em CSP.
É de todo aconselhável, pela evidência científica por um lado e, por outro lado, pela sua inequívoca viabilidade, a inclusão da Saúde Oral no Bilhete de Identidade dos Indicadores dos CSP no setor Gestão da Doença, mais especificamente da Diabetes Mellitus, a exemplo do que já ocorre com a avaliação oftalmológica anual, por exemplo. A doença periodontal é particularmente comum nos doentes diabéticos, sendo por isso necessária uma especial diligência para que estes doentes possam ter acesso e serem sujeitos a consultas regulares de saúde oral. Os dados e as tendências atuais alertam para os seguintes factos preditores: entre os jovens adultos, as pessoas com diabetes correm duas vezes maior risco de desenvolverem periodontite; adultos com idades entre os 45 ou mais anos, com diabetes mal controlada, são 2,9 vezes mais propensos a contrair periodontite severa do que aqueles sem diabetes; pessoas que fumem e que tenham persistentemente níveis elevados de glicemia têm 4,6 vezes maior risco de desenvolver periodontite; por fim, cerca de um terço das pessoas com diabetes possuem periodontite severa.
Atualmente, com a disponibilidade cada vez maior e mais generalizada a todo o país de cuidados e vigilância em saúde oral nos Centros de Saúde, esta medida tem todas as condições para poder e dever ser posta em prática no mais curto espaço de tempo.
Convém lembrar que a medida ora proposta tem garantido impacto na promoção dos cuidados de saúde oral ao doente diabético e na prevenção dos efeitos da diabetes nos portadores desta doença crónica cada vez com maior dimensão epidemiológica, bem como na consciencialização dos médicos de família (e não só) para as consequências nefastas da diabetes em termos de saúde oral e, por conseguinte, para a importância da referenciação de todos estes doentes diabéticos para consulta de medicina dentária.
Em suma: uma consulta anual de vigilância de medicina dentária deverá fazer parte da contratualização das USF e UCSP com um Plano de Ação operacionalizado através do portal BI-CSP, principal ferramenta orientadora das USF, UCSP e UCC.
No início de uma nova legislatura, com a entrada em vigor de um novo programa de Governo, a saúde oral deve ser uma aposta mais vincada e com medidas concretas refletidas nesse documento de gestão do país e, por conseguinte, da saúde e bem-estar de todos os portugueses. Para isso, é fundamental e premente aprovar a carreira de Médico Dentista no SNS. Não só para operacionalizar medidas como aquelas que acima se propõem, mas também para promover e reforçar uma verdadeira e indispensável interdisciplinaridade que deve sempre existir no âmbito dos CSP e nos cuidados hospitalares. A bem da população utente.
Tem a palavra o poder político.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico