Aumentar o salário mínimo nacional (SMN) é uma questão de justiça social e também uma das formas mais directas de intervenção do Estado na economia. Ainda mais em tempos em que os radicalismos orçamentais europeus e a financeirização da economia conduziram ao apagamento do papel intervencionista do Estado.
Os resultados são os que se sabem. Em Portugal, os rendimentos provenientes do trabalho ocupam uma fatia cada vez menor face aos rendimentos de capital. Na luta secular entre capital e trabalho, os trabalhadores estão a perder a batalha. Veja-se a ironia: a redução de salários, a redução do poder dos trabalhadores e o enfraquecimento da regulação laboral são contemporâneos de um século marcado por crise, estagnação ou crescimento risível em Portugal e na Europa.
Ao mesmo tempo, no recente caso português, o aumento do salário mínimo acompanhou uma assinalável retoma económica e uma extraordinária recuperação na criação de emprego. Uns dirão que terá sido “apesar do aumento do SMN”, outros não farão relação. Na verdade, uma das causas (a maior!?) para esta retoma foi o aumento de rendimentos dos trabalhadores mais pobres. E é por isso que não se deve parar por aqui.
O aumento do salário mínimo é a mais poderosa intervenção contra o maior veneno económico e social em Portugal: a desigualdade na distribuição de rendimentos. 635 euros mensais: líquidos, serão pouco mais de 18 euros por dia.
Portugal concentra praticamente todos os argumentos a favor do aumento do SMN: dignificação do trabalho e dos trabalhadores, uma mais justa distribuição de rendimentos entre patrões e assalariados, a redução da pobreza entre os que trabalham e o combate à desigualdade salarial entre homens e mulheres. Além destes, os argumentos económicos são centrais: o aumento do SMN funciona como impulso para a melhoria da produtividade, via priorização das actividades geradoras de maior valor acrescentado. E, num momento de inflação baixa, o aumento do SMN contribui para um estímulo à procura e potenciação do crescimento económico. Aumentar o SMN, no nosso cenário, no nosso contexto, não é um perigo, mas sim um estímulo para a economia nacional.
Os baixos salários não são consequência do atraso económico do país. São fundamentalmente a sua causa.
É verdade que o aumento do SMN abrange muitos trabalhadores — cerca de um quarto do total. Mas essa é precisamente a demonstração do quão importante é aumentar este valor e de como tanta gente, demasiada gente, permanece em níveis tão baixos de rendimento. Ainda assim, aumentar o SMN não tem efeitos excessivos na massa salarial a pagar pelas empresas. Os custos das empresas com salários são uma parcela dos custos totais da sua actividade (valores entre 10% a 15% conforme os sectores). Isto significa que aumentar o SMN em 10% teria um efeito inferior a 1% nos custos totais das empresas. E ainda teríamos o impacto positivo na procura que esse aumento acarretaria.
Com um SMN muito baixo, os países tendem a competir em actividades de pouco valor acrescentado. Manter esse salário baixo promove a economia da precariedade e atrai as empresas deste tipo de economia. A precariedade produz desigualdade e a desigualdade é inimiga do crescimento, do bem-estar social e é injusta. A precariedade não é um assunto apenas dos que dela sofrem directamente, é um assunto de todos, que tem efeitos no conjunto da sociedade.
Aumentar o SMN não é uma cedência, nem pode ser uma moeda de troca. Aumentar o salário mínimo nacional é uma urgência.