James Dean ressuscitado digitalmente para o elenco de Finding Jack

Os realizadores de um filme sobre cães abandonados no Vietname pelas tropas americanas adquiriram os direitos para reanimar digitalmente o actor de Fúria de Viver, que morreu em 1955, aos 24 anos.

Foto
James Dean dr

Mais de 64 anos após a sua morte, no dia 30 de Setembro de 1955, James Dean prepara-se (por assim dizer) para interpretar o seu quarto filme, Finding Jack, que aborda a realidade dos cães que as tropas americanas abandonaram no Vietname quando regressaram da guerra. Produzido pela Magic City Filmes, que adquiriu os direitos para reanimar digitalmente o actor a partir de filmes e fotografias, Finding Jack deverá chegar às salas de cinema americanas a 11 de Novembro de 2020, para coincidir com as comemorações do Dia do Veterano nos Estados Unidos.

Segundo a informação já adiantada pela produção, James Dean, que morreu aos 24 anos num acidente de automóvel e só teve tempo de protagonizar três filmes – A Leste do Paraíso, de Elia Kazan, Fúria de Viver, de Nicholas Ray, e O Gigante, de George Stevens –, irá agora interpretar (digitalmente) um dos principais papéis secundários deste seu futuro quarto filme, baseado no romance homónimo do sul-africano Gareth Crocker acerca de um soldado americano, Fletcher, que recebe ordens para regressar do Vietname deixando para trás um cão que viera dar um novo alento à sua vida. 

“Procurámos muito até encontrarmos o actor ideal para interpretar o papel de Rogan, uma personagem extremamente complexa, e após meses de pesquisa decidimo-nos por James Dean”, contaram ao site Hollywood Reporter os realizadores de Finding Jack, Anton Ernst e Tati Golykh, ambos com algum currículo como produtores, mas estreantes na realização.

É a normalidade das suas declarações que se torna um pouco inquietante, já que, se não soubéssemos de antemão que James Dean morreu em meados do século passado, poderíamos pensar que era um talentoso jovem actor que Ernst e Golykh teriam descoberto nalguma audição. E parece legítimo deduzir-se que os responsáveis pelo casting do filme não fizeram distinção, na sua aturada pesquisa, entre actores que respiram e os que já abandonaram esse hábito. Uma abertura do leque de actores disponíveis que, a tornar-se norma, poderá de resto dificultar seriamente a vida aos actores que dela ainda usufruem. Quem é que vai agora contratar um Tom Hanks quando pode ter um James Stewart?

“Sentimo-nos muito honrados por ter o apoio da família [de James Dean] e tomaremos todas as precauções para assegurar que o seu legado como uma das mais épicas estrelas de cinema se mantenha firmemente intacto”, afirmaram os realizadores. “A família olha para isto como o seu quarto filme, um filme que já não pôde fazer, e não temos intenção de desapontar os seus fãs”.

Do exacto modo como Dean irá ser recriado sabe-se ainda pouco, salvo que outro actor, ainda não anunciado, irá dar-lhe voz, e que as empresas encarregadas dos efeitos especiais de Finding Jack são a canadiana Imagine Engine e a sul-africana MOI Worldwide. Anton Ernst adiantou apenas que irá ser criada uma versão de “corpo inteiro” de Dean em CGI, sigla inglesa para imagens geradas por computador.

O recurso a ressurreições digitais de actores mortos está longe de ser inédito e tem sido usado, por exemplo, na publicidade, com Audrey Hepburn a recomendar os chocolates Galaxy, ou actrizes como Marlene Dietrich, Grace Kelly ou Marilyn Monroe a contracenarem, num anúncio do perfume J’Adore, da Dior, com a bastante viva Charlize Teron.

No cinema, para lá de meros efeitos de rejuvenescimento radical, como o que sofreram Robert De Niro e Al Pacino em O Irlandês, de Martin Scorsese, a estrear este mês, ou Sean Young para Blade Runner 2049 (2017), de Denis Villeneuve, Marlon Brando fez uma breve aparição póstuma em Super-Homem: O Regresso (2006), de Bryan Singer, Peter Cushing levantou-se do túmulo para reinterpretar o Grand Moff Tarkin em Rogue One: Uma História de Star Wars (2016), proeza que aliás não surpreende num experimentado intérprete do conde Drácula, e a morte de Carrie Fisher levou J. J. Abrams a usar materiais das suas interpretações em filmes anteriores da saga Guerra das Estrelas para compor o papel da princesa Leia em Star Wars: Episódio IX - A Ascensão de Skywalker, que chegará aos cinemas este Natal.

Mas todas estas recriações digitais foram baseadas em anteriores interpretações da mesma personagem, o que não acontece agora com a utilização da imagem de James Dean, que está a gerar alguns protestos nas redes sociais e nas caixas de comentários dos jornais. No Twitter, Chris Evans, intérprete do Capitão América nos filmes baseados nas personagens da Marvel, escreveu no Twitter: “Isto é terrível. Talvez possamos arranjar um computador para pintar um novo Picasso ou compor canções de John Lennon”.

Uma das críticas mais ácidas veio do crítico de cinema Stuart Heritage, que num texto publicado no jornal The Guardian, defendeu que teria sido preferível os que realizadores exumassem o corpo de James Dean, lhe vestissem um uniforme militar e usassem fios para o movimentar de um lado para o outro.

Bastante mais entusiástica, e possivelmente anunciadora do que podemos esperar num futuro próximo, foi a reacção do presidente da administração da CMG Worldwide, a empresa que representa os herdeiros de James Dean, bem como os de cerca de 1700 figuras de várias áreas, incluindo actores como Jack Lemmon, Bette Davis ou Ingrid Bergman. “Isto abre toda uma nova oportunidade para muitos dos nossos clientes que já não estão entre nós”, congratulou-se Mark Roesler ao Hollywood Reporter.

Sugerir correcção
Comentar