Cristiana Lopes conta como é a vida dos novos emigrantes

Viveu cinco anos no México e quando regressou sentiu-se estrangeira no seu país. Juntou a sua experiência à de outros quatro jovens e escreveu um livro.

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“Acho muito importante que Portugal acolha estes jovens que trazem novas maneiras de trabalhar, novas visões e nova energia às nossas empresas” Paulo Pimenta

É apenas uma entre muitos protagonistas da nova diáspora portuguesa. Jovens com formação superior que ousaram (ou foram obrigados a) procurar oportunidades de carreira além-fronteiras. Cristiana Lopes saiu para o México e acabou por ficar por lá cinco anos. Tentou regressar a Portugal em 2017 mas a readaptação não correu como esperava. Hoje, vive e trabalha em Madrid – é gestora de contas numa empresa de estudos de mercado que tem clientes em todas as partes do mundo. Diz que já não sabe ao certo de que nacionalidade é. Uma cidadã do mundo, com certeza, tal como os outros quatro millennials portugueses que Cristiana Lopes nos apresenta nas páginas do livro que acaba de lançar. Um conjunto de relatos que pretende dar a conhecer os desafios e as exigências por que passam estes novos emigrantes.

Ao longo das cerca de 220 páginas de Millennials – Cidadãos do Mundo, relatos da nova diáspora (Sana Editora) Cristiana Lopes apresenta-nos a sua história e também as da Cláudia, da Constança, do Daniel e do Francisco, com passagens por cenários que vão do Catar ao Quénia, passando pela Jordânia ou Uruguai. E o México, claro está. O país que é apresentado ao leitor na primeira pessoa, pela própria autora. Foi viver para Cidade do México aos 22 anos, já depois de se formar em Gestão na Universidade de Aveiro e de ter trabalhado na AIESEC.

Sendo natural da Gafanha da Nazaré, cidade do concelho de Ílhavo com cerca de 15 mil habitantes, sentiu-se desafiada pela ideia de sair de um lugar onde todos a conheciam “para uma cidade com uma zona metropolitana de 20 milhões de habitantes”, confessa. Mal chegou, teve oportunidade de provar esquesites (um copo com milho-cozido, maionese, lima e molhos variados), água de horchata (uma espécie de sumo de arroz-doce) e margaritas, entre outras comidas e bebidas locais.

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Paulo Pimenta

Teve que se adaptar a uma cultura diferente, fazer novos amigos, enfrentar despedidas “agridoces” e substituir o “portunhol” pelo espanhol. Também partilhou casa com gente de várias nacionalidades, vivendo experiências mais ou menos positivas, grande parte delas retratadas no livro. Cristiana Lopes fez questão de escrever o bom e o menos bom, recusando-se a romancear a história, ainda que ela termine com o cupido a fazer das suas. Namorou e casou-se com um mexicano e têm já uma filha com seis meses.

O casamento aconteceu em 2017, em Portugal, uma vez que Cristiana e Bernardo estavam decididos a ficar por cá a viver. Tentaram estabelecer-se em Lisboa mas a experiência ficou aquém das expectativas. Em grande medida devido aos salários baixos e à falta de valorização por parte das entidades empregadoras, agravada pelo mercado imobiliário de arrendamento, “com muita procura e pouco oferta”.

Em Julho de 2018, Cristiana Lopes aceita uma proposta de trabalho em Madrid e mudam-se de armas e bagagens para a capital espanhola. “Tirei da cabeça a dúvida antiga: E se voltasse para Portugal”, repara, reconhecendo que a “readaptação não correu bem”. Viria a perceber que é “mais mexicana do que pensava” e que jamais voltará a ser a portuguesa que era quando pisou o México pela primeira vez. “Comecei a ver Portugal e os portugueses com outros olhos e a sentir-me estrangeira no meu próprio país”, conta.

Desengane-se quem possa pensar que Cristiana Lopes, actualmente com 30 anos, está magoada com Portugal. Muito pelo contrário. Sempre que pode faz-se à estrada, fazendo o percurso Madrid-Aveiro-Madrid, para passar uns dias na sua cidade e com as suas gentes. E não afasta a ideia de, no futuro, tentar um novo regresso. “Quando estiveram reunidas outras condições no mercado profissional, talvez”, equaciona. Enquanto essa decisão ou oportunidade não surge, faz questão de sair em defesa dos outros protagonistas da nova diáspora portuguesa. “Acho muito importante que Portugal acolha estes jovens que trazem novas maneiras de trabalhar, novas visões e nova energia às nossas empresas”, argumenta.

No fundo, o livro Millennials – Cidadãos do Mundo, relatos da nova diáspora – que vai ser apresentado no próximo dia 8 de Novembro, pelas 19h, em Lisboa (Livraria da Travessa) – pretende ser mais um contributo para que esse acolhimento ocorra da melhor forma. Em que medida? “Porque estes relatos dão a conhecer a vida dos que se aventuraram em terras estrangeiras, para que se compreenda que, ao voltar, somos pessoas diferentes, ganhámos uma nova visão das coisas”, testemunha. “Erradamente, a nossa geração é rotulada de pedir salários elevados e querer trabalhar pouco, mas não é assim e este livro mostra que os millennials quando acreditam em algo, arriscam, saem da zona de conforto”, faz questão de vincar.

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