Câmara de Lisboa vai criar grupo de trabalho para decidir o que fazer com espólio da Biblioteca-Museu República e Resistência
Vereadora admite que parte do acervo — “que não está completamente estudado” — da biblioteca-museu possa ser dividido por outros equipamentos, como o Museu do Aljube.
O assunto tem gerado grande discussão entre vereadores, deputados municipais e mesmo entre quem trabalha na Biblioteca-Museu República e Resistência (BMRR). Este espaço, instalado num rés-do-chão comercial da Rua Alberto Sousa há 18 anos, precisa de obras que implicarão o encerramento da biblioteca. A câmara diz que o espaço fecha apenas durante as obras, mas a dúvida tem persistido porque a Junta de Freguesia das Avenidas Novas tem a ambição de ali fazer uma biblioteca de bairro.
O assunto voltou a ser discutido na reunião pública do executivo desta quarta-feira, na qual a vereadora da Cultura, Catarina Vaz Pinto, garantiu que a sua proposta “nunca será a de encerrar a biblioteca” — apenas durante as obras que devem durar entre cinco a seis meses. “Este pretexto de requalificar o espaço é também um pretexto para reavaliar a colecção”, disse, admitindo que o espólio não está “completamente estudado”. A biblioteca-museu guarda a colecção Dulce Ferrão (mulher do jornalista Carlos Ferrão), com 26 mil volumes, obras e documentos relacionados com a República, a maçonaria e a resistência à ditadura.
A vereadora lembrou que desde a fundação daquela biblioteca-museu, em 1993, muita coisa mudou nas bibliotecas municipais e nos equipamentos culturais da câmara. “O que nos parece ter sentido, e nesta perspectiva de racionalização de espaços e de colecções, é pensar que a parte desta colecção que está relacionada com a resistência fique à guarda do centro de documentação do Museu do Aljube e que seja dado um tratamento diferenciado à parte do espólio sobre a República”, declarou a vereadora.
Mas dada a discussão que se gerou nos últimos meses acabou por propor a criação de um grupo de trabalho para estudar o assunto, que será constituído por especialistas na matéria. “Já convidamos a professora Fernanda Rolo, já contactámos o professor João Madeira, mas o grupo não está fechado”, disse, convidando os partidos a indicarem um representante para fazer parte desse grupo.
“O objectivo é primeiro requalificar o edificado e segundo valorizar os espólios que temos consciência que não têm sido suficientemente valorizados nos últimos anos e dar-lhes um enquadramento à luz do que são hoje as nossas condições em termos de equipamento”, insistiu.
No entanto, estas propostas não convencem algumas forças políticas da oposição. Os vereadores do PCP e PSD apresentaram as suas próprias propostas, que acabaram rejeitadas.
Os vereadores comunistas defendem que “sejam adoptadas as medidas necessárias para a não desagregação do acervo da Biblioteca-Museu República e Resistência e não proceder à separação de materiais da República e da resistência anti-fascista, o que traria prejuízos claros do ponto de vista histórico, académico e social”.
E consideram que o encerramento da BMRR para a realização de obras é “uma oportunidade para a sua requalificação e para estudar e inventariar os seus acervos”. “Estranhamos não terem ainda sido estudados e inventariados”, notou João Ferreira, que questionou a vereadora da Cultura se há mesmo intenção de deslocar a parte do acervo referente à resistência e à luta anti-fascista para o Museu do Aljube, assim como retirar a palavra “Resistência” do nome do equipamento.
Já os vereadores do PSD propuseram que fosse constituída a Casa da República, “sem pôr em causa a unidade do espólio do República e Resistência”. “Existe um vazio a que importa preencher sobre os ideais republicanos que pode e deve trabalhar com o espólio existente na Biblioteca-Museu República e Resistência”, frisou João Pedro Costa.