E se António Costa não desistiu de Rui Rio?

Ao conseguir adiar a posse de todo o Governo, o PSD quis dar um sinal: as legislativas não mataram os sociais-democratas.

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Costa e Rio em 2012, ainda como autarcas DÁRIO CRUZ/Arquivo

Não tenho dúvidas de que a “geringonça” já tinha morrido antes das eleições. A razão é mais do que óbvia: estava escrito em todas as sondagens que o PS ia sair vencedor, mesmo que ficasse aquém da maioria absoluta. A “geringonça” de 2015 foi inédita não só por ter juntado a esquerda numa solução governativa mas também, e sobretudo, porque fez com que fosse o segundo partido mais votado a formar Governo. Ora, nada fazia prever que isso se repetisse desta vez. E é por essa razão que entendo que a “geringonça” já tinha morrido antes das eleições. O que aconteceria depois das legislativas, a acontecer, podia ser uma aliança ou um acordo mais informal, mas nunca seria uma coligação parlamentar negativa, com vista a derrubar o executivo do partido vencedor. Dito isto, RIP "geringonça”.

O futuro do PS e do Governo é agora outro e joga-se em tabuleiros vários. Já se fizeram gráficos e análises sobre as geografias parlamentares que permitirão ao PS fazer maiorias pontuais com estes e com aqueles. E convém dizer que, de todos os líderes de partidos que conseguiram eleger uma bancada parlamentar e que estão actualmente em funções, só um assumiu que não quer ter nada a ver com os socialistas. Foi Assunção Cristas - que está demissionária. No seu partido, contudo, António Pires de Lima já deixou uma nota: “É do interesse nacional que PS e CDS saibam pelo menos conversar”.

O PS, por sua iniciativa, já conversou com Livre, PAN, PEV, PCP e BE. Deu primazia à esquerda em matéria de programa e Orçamento. Mas não é só disso que se faz uma legislatura. Estou, aliás, em crer que António Costa ainda não desistiu de Rui Rio - nem Rui Rio de António Costa. O líder do PSD sempre disse que estaria disponível para acordos estruturais com o PS em nome do interesse do país. Do seu ponto de vista, nada mudou. Vai ser preciso conseguir tirar Rio da liderança do PSD para que o partido mude de rumo. E essa tarefa pode não ser tão fácil como parece.

Na última sexta-feira, ao conseguir adiar a posse de todo o Governo - quando suspendeu a publicação dos resultados eleitorais com uma queixa ao Tribunal Constitucional - o PSD quis dar um sinal: as legislativas não mataram os sociais-democratas, eles existem e podem ter uma palavra a dizer. Foi uma espécie de “estamos aqui”. Para quê? Para já, começando pelo princípio, para mudar a lei eleitoral, como disse claramente Hugo Carneiro na conferência de imprensa em que explicou porque é que o PSD pediu a impugnação dos resultados dos círculos da emigração.

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, ainda considerou que tudo não passava de uma “picuinhice”, mas disse-o depois de admitir que há “muitas coisas ainda a aperfeiçoar” quanto ao voto por correspondência, manifestando disponibilidade para o fazer. “Pensamos aperfeiçoá-lo. A Assembleia da República vai também certamente fazer a avaliação. [...] O número de eleitores passou para 1,4 milhões e, em termos de votos, isso significou cinco vezes mais votos nestas eleições do que tinha ocorrido nas eleições anteriores, que é um resultado notável”, mas “há muitas coisas ainda a aperfeiçoar”, disse.

Para esse aperfeiçoamento em concreto ou para outros, e independentemente de vir a haver - ou não - maioria de esquerda que salve o PS, há uma porta aberta do lado do PSD. Do PSD que Rui Rio ainda lidera e que, mesmo que um dia não lidere, vai ter muitos deputados escolhidos por si com assento na Assembleia da República.

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