Sandy trocou o Canadá e um hotel de luxo pela casa e a horta do avô
Deixou o Canadá para se instalar numa pequena localidade de Aveiro. Sandy Branco de Sousa regressou às origens para criar um espaço que cultiva o slow living.
Nasceu e cresceu no Canadá, em Montreal, mas toda a sua família é portuguesa. Apesar da distância que separa o Quebeque de Portugal, lá em casa “comia-se bacalhau, assistia-se à RTP e falava-se a língua de Camões”. Quando chegou à idade de ir para a escola, foi confrontada com “crianças que falavam outra língua”, recorda, testemunhando que só nessa altura começou a aprender o francês e depois o inglês. Sandy Branco de Sousa reconhece que teve sempre um pé na terra dos pais. Em 2018, decidiu ter mais do que isso. Pegou na casa do avô materno, situada na Quinta do Picado, em Aveiro, e transformou-a num espaço de alojamento, workshops e retiros. Um projecto que cultiva o slow living, desafiando os hóspedes ou convidados a descobrirem o seu próprio ritmo.
Para trás, Sandy Branco de Sousa deixou um emprego num hotel de luxo. Hoje, cultiva a horta, cuida das galinhas e da casa que pretende ser muito mais do que um alojamento. Uma grande mudança de vida, reconhece, que acabou por ser resultado de várias viagens. Em especial à Tailândia e à Índia, onde Sandy foi tentar encontrar respostas para “o vazio” que sentia na sua vida. “Numa meditação, visualizei esta casa e eu estava aqui a receber pessoas”, confessa, a propósito do momento em que decidiu trocar Montreal por Aveiro.
Voltou, assim, a abrir as janelas e as portas de uma casa que tinha passado demasiado tempo fechada e que, para Sandy, estava associada à imagem “dos últimos anos de vida e de doença” do avô, que ela tanto estimava. “Cresci com ele, no Canadá. Como estava em casa, porque tinha problemas renais, quando eu chegava da escola era ele que me aquecia a sopa e estava comigo”, recorda. Depois da sua morte, Sandy esteve vários anos sem conseguir regressar à casa que o avô havia construído na sua terra natal, para toda a família. Uma habitação igual a tantas outras – com fachada de azulejo, gradeamento em ferro e um jardim carregado de plantas e flores –, mas que tem agora um nome especial: Swara Slow Living Home.
A carta de despedimento escrita no final do ano
A ideia de abraçar um projecto na casa da família, em Portugal, acabou por ser o culminar de uma trajectória que Sandy Branco de Sousa já tinha iniciado uns anos antes. Uma vez que no hotel lhe davam a opção de não trabalhar durante a época baixa, aproveitava esse período para se ausentar e fazer longas viagens. O “bichinho” tinha-a atacado quando ainda estava na universidade – formou-se em tradução e depois em relações públicas. “Fui para Espanha, mais concretamente para Valência, fazer uma espécie de intercâmbio e adorei”, testemunha. Mais tarde, voltou a sair, aproveitando uma bolsa de estudo para aprender italiano. “E lá fui eu parar a uma aldeia chamada Castelraimondo, carregada de malas, vinda do Canadá”, lembra.
México, Chile, Argentina, Brasil e Uruguai foram alguns dos destinos aos quais viria, depois, a dedicar atenção, nessa altura em que “deixava de trabalhar durante os cinco meses de Inverno e só regressava ao emprego na Primavera”. “Depois voltei-me para a Ásia e como já andava a sentir um vazio na minha vida, à procura de respostas, fui viver cinco semanas com uma comunidade auto-suficiente”, relata. “Saber que eu consigo viver do que a terra me dá, andar descalça, sem me olhar ao espelho, com toda a simplicidade, mudou-me para sempre”, repara, a propósito da experiência vivida na Tailândia. Efectivamente, nos últimos anos, as viagens de Sandy Branco de Sousa têm sido muito mais do que a simples descoberta de um destino – tem feito formações de ioga, ayurveda, meditação, entre outras terapias – e assim deverá continuar a ser.
Depois de ter tido a coragem de assinar a carta de demissão, no final de 2015, sente que este é um caminho sem retorno. “Faltavam duas semanas para o final do ano e eu senti que tinha de deixar aquele emprego que não me preenchia”, desabafa. Era concierge num hotel de luxo, estava “ao serviço dos caprichos”, tinha acesso a um mundo de glamour mas isso não lhe dizia nada. Confessa que teve medo, sentiu receio por trocar o certo pelo incerto, mas acabou por perceber que, “depois de tomar decisões, a vida faz com que as coisas se encaminhem”.
Hoje, aos 38 anos (acabados de fazer), está determinada em levar o Swara Slow Living Home por diante. Depois de um primeiro ano que tem servido, essencialmente, de teste e preparação do conceito, em Abril de 2020 irá dar cumprimento à abertura oficial. “Neste primeiro ano, vieram vários voluntários, amigos e conhecidos, ajudar-me a preparar o projecto, realizando retiros e praticando ioga e meditação”, enquadra.
A casa encerrará no Inverno e Sandy irá aproveitar esse período para voltar a viajar. Desta vez, sente-se tentada a rumar a África – provavelmente a São Tomé e Príncipe –, mas a decisão ainda não está fechada. Fica, para já, apenas esta certeza: “Tem de ser um sítio onde me sinta bem, com comida fresca e orgânica”, aponta. E o Canadá? “Ainda não senti necessidade de lá voltar pois as minhas amigas têm vindo cá visitar-me. Talvez quando sentir saudades das pessoas.”