Ofensiva turca leva ao encerramento de hospitais e põe evangélicos contra Trump

Fundador da Christian Broadcasting Network diz que o Presidente norte-americano pode “perder o mandato do Céu” se permitir “o massacre de curdos e cristãos” no Norte da Síria.

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Dois carros armadilhados explodiram perto da fronteira com o Iraque, numa zona de habitação Reuters/RODI SAID

Dois hospitais no Norte da Síria, junto à fronteira com a Turquia, foram encerrados esta sexta-feira quando médicos e enfermeiros se juntaram ao resto da população civil numa fuga em direcção ao interior do país. Desde quarta-feira, a ofensiva do Exército turco para expulsar da região as milícias curdas já fez vítimas civis nos dois lados da fronteira, incluindo duas crianças.

Os combates estão espalhados por cerca de 400 km ao longo da fronteira entre os dois países, mas a artilharia e a força aérea turcas têm concentrado os ataques em Ras al-Ain e em Tel Abiad, duas cidades controladas pelos curdos na zona Leste e separadas por pouco mais de 100 km. O objectivo da ofensiva turca, segundo Ancara, é criar uma “zona de segurança” entre a Turquia e as regiões controladas pelas milícias curdas, que acusa de serem um braço das milícias do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, o seu principal inimigo interno.

Em Ras al-Ain, as forças turcas bloquearam as saídas para as principais cidades da região controladas pelas Forças Democráticas Sírias – o exército em que se destaca a milícia curda YPG, que combateu ao lado das forças norte-americanas contra os extremistas islâmicos do Daesh nos últimos quatro anos. E as forças sírias árabes – que lutam contra o regime de Bashar al-Assad e são apoiadas pela Turquia – estão a cercar Tel Abiad com o apoio dos bombardeamentos aéreos turcos.

Segundo os relatos do Rojava Information Center, uma organização independente que presta ajuda aos jornalistas estrangeiros no Nordeste da Síria, esta sexta-feira houve duas explosões de carros armadilhados mais a Leste, em Qamishli, perto da fronteira com o Iraque.

Testemunhas no local dizem que um automóvel “com matrícula do regime sírio” explodiu e um bombista-suicida accionou os explosivos num outro veículo, perto de um popular restaurante da cidade. Para além da morte do bombista, pelo menos cinco pessoas ficaram feridas com gravidade.

O facto de as explosões não terem sido provocadas por um ataque das forças turcas mostra que a instabilidade dos últimos dias pode tornar a região num novo ponto de extrema violência com várias frentes, meses depois de o Daesh ter sido dado como derrotado no terreno.

Um dos maiores receios dos críticos da ofensiva turca é que os combates no Norte da Síria, e o caos que daí pode resultar, leve os extremistas islâmicos a reagruparem-se. O Governo turco disse que não vai permitir que isso aconteça, mas nas últimas horas já foram evacuados dois campos de deslocados onde estavam instaladas famílias de combatentes do Daesh.

Os responsáveis pela segurança desses e de outros 18 campos espalhados pelo Nordeste da Síria, onde mais de 11 mil combatentes do Daesh estão detidos, são as milícias curdas que a Turquia quer desalojar da região. E, à medida que os combates se prolongam, muitos dos curdos que guardam os campos vão sendo transferidos para a frente de combate, o que pode levar à fuga de milhares de extremistas.

Na quinta-feira à noite, os membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas não chegaram a acordo para assinarem um comunicado conjunto a condenar a operação turca. Os EUA ameaçaram responder a ataques contra “populações vulneráveis”, mas não chegaram ao ponto de condenarem a ofensiva; e a Rússia diz que a situação tem de ser resolvida no âmbito das negociações para o fim da guerra civil síria e da “ocupação militar ilegal no país”, numa referência indirecta à presença norte-americana na região.

Nos EUA, a decisão do Presidente Donald Trump de permitir o avanço da Turquia ao mandar recuar os soldados norte-americanos que estavam na fronteira está a ser muito criticada por alguns dos seus aliados, numa altura em que a Casa Branca precisa de ter a sua base de apoio unida perante as investigações da Câmara dos Representantes que podem levar à impugnação do Presidente.

No Congresso, o Partido Republicano tem criticado a decisão por considerar que é uma “traição” aos aliados curdos. A congressista Liz Cheney e o senador Lindsey Graham vão mesmo pôr a votação um pacote de sanções contra a Turquia em resposta à ofensiva no Norte da Síria.

E alguns líderes do movimento evangélico criticaram Trump pela primeira vez desde a sua eleição, em 2016, acusando-o de abrir caminho à “matança” de curdos e cristãos na Síria pelas forças turcas. O fundador do influente grupo de media Christian Broadcasting Network, Pat Robertson, disse estar chocado e avisou que o Presidente Trump arrisca-se “a perder o mandato do Céu se permitir que isso aconteça”.

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