Pressionado por protestos, Presidente do Equador retira sede do Governo da capital
Há mais de uma semana que o país está paralisado por grandes manifestações contra a subida do preço dos combustíveis. Presidente culpa o antecessor e pede mediação internacional.
O Presidente equatoriano, Lenín Moreno, anunciou a transferência da sede do Governo de Quito para Guayaquil, por causa dos protestos contra o fim dos subsídios aos combustíveis. As autoridades apostam na dramatização da situação, dizem que a ordem democrática está em causa e acusam o anterior Presidente, Rafael Correa, de tentar promover um golpe de Estado.
Um grupo de jornalistas aguardava o início de uma conferência de imprensa de Moreno no palácio de Carondelet, a sede da presidência, na segunda-feira à tarde quando recebeu ordens para abandonar o edifício na capital Quito. Pouco depois, descreve o El País, foi transmitida pela televisão uma declaração do Presidente rodeado pela cúpula militar a partir de Guayaquil, no sul do país, em que era anunciada a transferência da sede governamental.
A decisão foi justificada pela chegada iminente de mais de 20 mil índios para uma manifestação contra as medidas económicas do Governo. Os protestos foram motivados pela decisão do Governo em acabar com os subsídios ao preço do combustível - uma medida do anterior Presidente, Correa, o que causou um aumento do preço da gasolina superior a 100% . Na semana passada, o Governo tinha já decretado o estado de emergência por causa dos distúrbios causados pelas manifestações e greves, mas nem por isso a tensão desceu.
Nos últimos dias, milhares de pessoas têm ocupado estradas e invadido lojas e fábricas, que são saqueadas, diz o jornal equatoriano El Comércio. Há notícias de confrontos com a polícia. Em Quito, o presidente da câmara decretou o estado de emergência para manter os serviços básicos em funcionamento, diz o jornal equatoriano Também em Guayaquil foram encerradas todas as pontes e vários acessos rodoviários. Jorge Yunda pelou a outros autarcas para actuarem como mediadores entre os grevistas e o Governo para normalizarem a situação.
A polícia pôs nas ruas veículos blindados e usou gás lacrimogéneo, e segundo os números oficiais citados pela Reuters, deteve 570 pessoas.
Moreno tinha assegurado que não recuaria face aos protestos e qualificou a eliminação do subsídio como uma “decisão histórica”. “É essencial para que a nossa economia seja saudável”, justificou. A medida deverá traduzir-se em poupanças de 1,4 mil milhões de dólares para as contas públicas.
Mas esta terça-feira mostrou-se aberto a uma “mediação internacional, através das Nações Unidas ou da Igreja Católica”.
O Presidente equatoriano, eleito em 2017, denunciou o que disse serem as “intenções políticas” dos protestos e manifestou dúvidas quanto à sua espontaneidade - o El País diz existirem nas redes sociais falsos comunicados oficiais, que agitam os ânimos da população. Moreno apontou mesmo o dedo ao seu antecessor, Rafael Correa, que se tornou um forte opositor de Moreno, apesar de este ter sido seu vice-presidente.
Lenin Moreno afirmou não ter sido coincidência que Correa e outros responsáveis da sua Administração tivessem viajado há pouco tempo para a Venezuela. De lá, continuou, vieram com um “plano de desestabilização” orquestrado pelo líder venezuelano, Nicolás Maduro. “Os roubos, o vandalismo e a violência demonstram que há uma tentativa de subverter a ordem democrática”, acrescentou o Presidente do Equador.
A partir da Bélgica, onde vive, Rafael Correa refutou as acusações. “São tão mentirosos. Dizem que sou tão poderosos que com um iPhone, a partir de Bruxelas, consigo liderar os protestos”, disse à Reuters, de telefone na mão. “A realidade é que as pessoas já não aguentam mais”, afirmou o ex-Presidente, referindo-se às medidas de austeridade impostas por Moreno, com o apoio do Fundo Monetário Internacional.
Mas a ideia de uma manipulação das massas, relacionada com o ex-Presidente, é propagada pelo Governo, que moveu processos por corrupção contra Rafael Correa, que fez parte da vaga de governantes de esquerda da América Latina.
O secretário da Presidência, Juan Sebastián Roldán, disse que as comunidades indígenas estão a ser manipuladas para fins políticos – embora seja tradicional no Equador a mobilização popular dos índios contra os governos. “Os irmãos indígenas nunca roubaram, na serra central nunca tínhamos visto imagens como as que acabámos de ver: fábricas a serem saqueadas, pessoas a impedir outros de trabalhar, ameaçando-os, destruindo os seus camiões”, afirmou Roldán, citado pelo El País.
Sem que nenhum dos lados pareça disposto a ceder, a tensão deverá continuar a subir nos próximos dias. Para quarta-feira foi convocada uma greve geral. O Governo “declarou guerra ao povo”, afirmou o presidente da Frente Unitária de Trabalhadores, Nelson Erazo.