A campanha eleitoral que já foi
É pena que Tancos tenha tomado conta desta campanha eleitoral.
Devo confessar que gosto muito de campanhas eleitorais. Gosto ainda mais quando não estou ativamente envolvida. São momentos muito animados na nossa pacata vida política.
Os líderes partidários, em caravana e rodeados de gente mobilizada, visitam mercados, empresas, lares da terceira idade, escolas, feiras, centros de investigação, lojas e cafés, fazem passeios pelas ruas de cidades e vilas, andam de carro, comboio ou metro. E, de repente, entram pela nossa casa mundos muito diferentes daquele em que cada um de nós vive. Sobre esses outros mundos, sobre essas pessoas com outras vidas, em regra ignoradas e sem voz, saber delas, em concentrado, ao longo dos 15 dias de campanha, é muito surpreendente. Algumas das reportagens apresentadas pelos meios de comunicação são peças cheias de alegria e de boa disposição.
Depois, os debates nas televisões e nas rádios, com regras complicadas de gestão do tempo, são oportunidades para darmos atenção à controvérsia pública sobre os temas da política. Da educação ao ensino superior e à ciência, às pensões e apoios sociais, dos temas económicos à imigração, tudo é debatido. É verdade que nem sempre com muita profundidade e clareza, mas é ótimo que possamos ter um tempo em que se procuram explicar e compreender as alternativas políticas.
Os comentários e as análises da campanha nos jornais e nas televisões por jornalistas, analistas ou cientistas políticos são momentos em que, verdadeiramente, a política entra em competição com o futebol. Tal como por vezes acontece nos programas de comentário e análise desportiva, nos quais nos explicam as táticas e as jogadas, temos, nas campanhas eleitorais, horas e horas de explicação dos jogos políticos. É verdade que os comentários políticos são, tal como no futebol, por vezes pouco fundamentados, transmitem-nos a sensação de estarmos a ouvir grupos de amigos a fazer conversa de café sobre política.
Uma palavra ainda sobre os programas de humor e as sínteses diárias que, em fotos ou em pequenos vídeos, nos mostram uma espécie de coleção de apanhados: os políticos a dançar, a comer, a beijar, a abraçar, a rir e a chorar, isto é, a parecerem, afinal, pessoas comuns. O humor destes programas proporciona verdadeiros momentos de descompressão.
É pena que Tancos tenha tomado conta desta campanha eleitoral. Percebe-se: Rui Rio e Assunção Cristas precisavam de mobilizar as suas bases, bastantes desmotivadas. Caiu-lhes no colo o tema de que precisavam para dramatizar e provar ao seu eleitorado potencial que são capazes de ser bravos, acutilantes, guerreiros, que são capazes de ser oposição. E assim se foi o que as campanhas eleitorais têm de melhor.