Marcelo teme “efeito camionistas” nas legislativas
O Presidente acredita que a greve dos motoristas pode facilitar ao PS a conquista da maioria absoluta nas eleições de Outubro
O Presidente da República está preocupado com a anunciada greve dos motoristas e com os seus efeitos políticos nas eleições de Outubro. Marcelo, que já tinha mostrado compreensão com os problemas laborais dos camionistas, disse esta semana que a anunciada greve não vai ser percebida pela maioria dos portugueses e que, não havendo apoio popular, a opção por esta forma de luta pode ser contraproducente para os trabalhadores e dar mais força ao Governo.
O Presidente acredita que o Governo está a gerir este caso para obter o máximo efeito nas eleições legislativas de Outubro. E, com a direita exangue – tanto quanto revelam as sondagens – Marcelo admite, sabe o PÚBLICO, que a imagem de “mão de ferro na ordem pública” venha a cativar, além do eleitorado tradicional do PS e do centro político, também o eleitorado de direita, o que facilitaria a vida ao PS que poderia mesmo vir a conquistar a maioria absoluta. Na terça-feira, o Presidente fez uma espécie de apelo aos motoristas para desconvocarem a greve, admitindo que se há “na sociedade portuguesa um sentimento de que uma parte da sociedade está refém dessa luta, deixa de se identificar com a luta. E aqueles que prosseguem fins, em muitos aspectos legítimos e justos, passam a ter contra si não o patronato, mas também a generalidade dos portugueses”.
A 31 de Maio, o Presidente admitiu em público, numa sessão na Fundação Luso-Americana, que “há uma forte possibilidade de uma crise na direita portuguesa nos próximos anos” e afirmou que “o PS fortaleceu a sua posição e quem sabe se isso acontecerá de forma ainda mais profunda nas próximas eleições legislativas”.
A “mão de ferro” com que o Governo está a gerir a crise dos camionistas causa desconforto em alguns socialistas, que acham que o direito à greve está a ser posto em causa – mas a maioria, incluindo a chamada ala esquerda onde se destaca Pedro Nuno Santos, o ministro das Infra-Estruturas, ou Duarte Cordeiro, secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, estão em total acordo com o rumo seguido pelo primeiro-ministro.
João Correia, advogado, ex-secretário de Estado da Justiça no tempo em que Alberto Martins era ministro, defende a actuação do Governo, que é proporcional mas admite que se pode “abrir uma caixa de Pandora” que pode ter consequências no sistema e no “apetite do patronato, o que é altamente perigoso”. O ex-secretário de Estado recorda o que se passou em França há 30 anos quando as associações patronais investiram contra os sindicatos por “abuso de direito”: “Estamos no fio da navalha”. Mas, acreditando que esta situação pode configurar “um abalo telúrico na vida social portuguesa”, João Correia culpa o sindicato pela situação presente: “Há uma mão por detrás do arbusto que não sei qual é. Esta greve não tem nada de inocente”.