Publicados em França os contos inéditos de Proust que ficaram na gaveta por serem demasiado ousados
As edições Fallois marcaram o lançamento para Outubro. Estes textos em breve reunidos, escritos quando o autor de Em Busca do Tempo Perdido era ainda muito jovem, falam sobretudo do “amor físico” tão “injustamente condenado” entre pessoas do mesmo sexo.
Contos inéditos do escritor francês Marcel Proust (1871-1922) vão ser publicados no próximo dia 9 de Outubro, sob o título Le mystérieux correspondant et autres nouvelles inédites, anunciaram na segunda-feira as edições Fallois, em Paris.
O volume reúne nove textos de Proust, escritos de juventude, datados de quando o autor de Em Busca do Tempo Perdido tinha cerca de 20 anos, e abordam sobretudo “o amor tão injustamente condenado” entre pessoas do mesmo sexo.
De acordo com o editor, estes relatos deveriam ter feito parte do primeiro livro do escritor, Les plaisirs et les jours (1896), mas que ele rejeitou.
A descoberta dos inéditos foi feita pelo fundador da casa editorial, Bernard de Fallois, especialista na obra de Marcel Proust, que morreu no ano passado. Fallois foi também o responsável pela revelação de um romance inédito do escritor, redigido entre 1895 e 1899, Jean Santeuil, publicado pela Gallimard em 1952, assim como pela edição de Contra Sainte-Beuve, em 1954.
“Com esta colectânea de textos inéditos regressamos às origens de Em Busca do Tempo Perdido, a grande obra de Marcel Proust”, afirmam as edições de Fallois, no comunicado agora divulgado, na sua página na internet. “Estes relatos reflectem um trabalho minucioso”, escreve a casa Fallois, que destaca o facto de se inscreverem nos parâmetros do conto, da narrativa breve, encenando “uma situação, os seus reveses e a resolução final”, com uma enorme poupança de meios.
“Vemos o jovem escritor multiplicar as experiências narrativas, sugeridas por vezes pelas suas leituras, mas já decididamente comprometido com um processo de criação que prenuncia o seu trabalho futuro”, lê-se ainda no comunicado.
Com transcrição, anotação e apresentação do professor Luc Fraisse, da Universidade de Estrasburgo, O Correspondente Misterioso e Outros Contos Inéditos (na tradução livre, em português) “não possui o apuro” posterior da obra de Proust, segundo a editora, mas, por isso mesmo, “ajuda a compreender melhor as suas origens”.
O tema dominante destes contos, escreve a casa Fallois, é uma reflexão sobre “o amor tão injustamente condenado”, o “amor físico”, entre pessoas do mesmo sexo, como se estabelecesse um “diário íntimo” de si mesmo.
“A consciência da homossexualidade é vivida como uma maldição, algo exclusivamente trágico”, acrescenta a Fallois, sobre a obra do escritor que teve no compositor Reynaldo Hahn a sua grande paixão. “Sem dúvida [Proust] considerou que, pela sua ousadia, os contos poderiam pôr em causa um ambiente dominado pela moralidade tradicional”, conclui.
A publicação do livro coincide com a passagem dos cem anos da atribuição do Prémio Goncourt a Proust, pela obra À Sombra das Raparigas em Flor, em 1919.