De Niro rejuvenescido nas novas imagens de O Irlandês, o filme Netflix que voltará a tentar mudar o mercado
O filme de Martin Scorsese, com Robert De Niro e Al Pacino, estreia-se no Festival de Cinema de Nova Iorque e chega a salas limitadas e ao streaming no Outono.
O Irlandês, o filme que volta a reunir Martin Scorsese a Robert De Niro, divulgou as suas primeiras imagens na segunda-feira, dia em que também foi anunciado que o filme terá a sua estreia mundial no Festival de Cinema de Nova Iorque. É uma produção para a Netflix e terá também estreia em sala, à semelhança do que aconteceu com Roma, de Alfonso Cuarón. A estreia voltará a confrontar o mercado com a relação tensa dos exibidores e distribuidores tradicionais com o modelo da Netflix, que tem também implicações nas condições de divulgação de dados de bilheteira mundiais.
O Irlandês tem argumento de Steven Zaillian, que vem com o pedigree recente da televisão de autor de The Night Of e sobretudo com o Óscar por A Lista de Schindler, de Steven Spielberg, ou da nomeação por Moneyball. Tem por base o livro I Heard You Paint Houses, de Charles Brandt. É uma história protagonizada também por Al Pacino e que, como indica a Netflix em comunicado, é um “épico” que se” centra na América pós-Guerra e decorre através da visão do veterano da II Guerra Mundial Frank Sheeran [De Niro], um bandido e assassino a contrato que trabalhou lado a lado com as figuras mais notórias do século XX. Abrangendo várias décadas, aborda um dos maiores mistérios por resolver da história norte-americana: o desaparecimento de Jimmy Hoffa [Pacino]”, diz ainda a nota, que promete “uma visão monumental sobre os corredores do crime organizado — os seus mecanismos, rivalidades e conexões à política”.
O projecto estava a ser desenvolvido há anos pelo realizador de Mean Streets, mas foi em 2017 que a Netflix entrou em cena. O filme é aguardado como qualquer título de um realizador respeitado como Scorsese, mas também e sobretudo por ser uma nova reunião entre De Niro e o autor de Taxi Driver, pelo restante elenco de luxo e por utilizar efeitos visuais que rejuvenescem o protagonista. O facto de ser um projecto de um cinéfilo convicto na importância da experiência do cinema em sala é também um chamariz para a reflexão sobre O Irlandês.
O 57.º Festival de Nova Iorque marca a primeira vez que o evento abre com um filme de Scorsese. O filme conta ainda com Joe Pesci, que interpreta o líder da Máfia Russell Bufalino, Harvey Keitel, Jesse Plemons, Anna Paquin ou Bobby Cannavale. A revista Esquire escreveu há meses que este poderá ser o projecto mais caro da Netflix e que o seu orçamento, inflaccionado pelos custos da pós-produção de efeitos visuais, rondará os 155 milhões de euros.
A estratégia de lançamento, da qual pouco ainda se sabe fora que será tanto em streaming quanto no circuito comercial de salas, começará então a 27 de Setembro na sessão de abertura do festival norte-americano – e não no Festival de Cannes, que decorreu em Maio, nem no Festival de Veneza, que decorre no início de Setembro, certames que não conseguiram programá-lo, como pretendiam, devido à complexa pós-produção. O filme, indica o New York Times, terá estreia comercial durante o Outono de 2019.
A chegada às salas de cinema de todo o mundo deverá realizar-se não de forma massificada mas apenas num número limitado de salas. O plano ainda não é claro mas se Roma for exemplo, mesmo a sua nomeação para o Óscar de Melhor Filme não impediu uma distribuição acidentada nos cinemas. Perante as condições criadas pela Netflix, que libertou o filme para as salas num prazo limitado variável antes da sua estreia no serviço de streaming (entre três semanas a um dia antes, como foi o caso em Portugal, e não com uma janela de exclusividade de mais de três ou quatro meses, como é a regra não-oficial), em vários países os grandes exibidores rejeitaram calendarizar o filme a preto e branco de Cuarón e Roma ficou-se pelas salas independentes.
A Netflix tem ainda uma política de não divulgação ou libertação selectiva de números e audiências e a sua posição de produtor cinematográfico criou também uma excepção portuguesa na divulgação dos números de bilheteira do filme, que o Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) se comprometeu a não divulgar “a título excepcional e por tempo limitado”. A base de dados europeia de cinema associada ao Observatório Europeu do Audiovisual indica que em Portugal o filme teve — em 2018 (estreou-se a 13 de Dezembro e chegou à Netflix a 14) — 7506 espectadores em sala. Mas o site BoxOfficeMojo, que colige as receitas de bilheteira mundiais, conta com dados portugueses a rondar os 98 mil euros de box office, o que corresponde a mais do dobro de espectadores do que os contabilizados pela base de dados Lumiere e que incluirá dados já de 2019. O filme esteve em sala até Março.
O director do festival acrescentou mais alguns detalhes ao que já se sabe sobre o projecto de grande orçamento de Martin Scorsese; “O Irlandês é muitas coisas: rico, engraçado, perturbador, entretém e é, como todos os grandes filmes, absolutamente singular”. Kent Jones, citado num comunicado do festival, já viu o filme e descreve-o de forma entusiástica: “É uma obra de mestre, feito com um domínio da arte do cinema que raramente vi na minha vida, e desenrola-se a um nível de subtileza e intimidade humana que me desconcertaram. Tudo o que posso dizer é que assim que acabou a minha reacção imediata foi que o queria ver outra vez”.