PCP prefere o PS “preso” à esquerda: “As maiorias absolutas têm servido sempre para liquidar direitos”

A dois meses e meio das eleições, os comunistas já estão no apelo directo ao voto na CDU avisando que os socialistas também fazem “política de direita”, sobretudo quando estão sozinhos no poder. PCP faz balanço do trabalho parlamentar e salienta a “seriedade” de não ter sido desmentido nos anúncios que fez.

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Nuno Ferreira Santos

Mais do que o medo da direita, o problema que o PCP quer combater desta vez é o fantasma da maioria absoluta do PS. Porque as maiorias absolutas “nunca serviram o povo e o progresso social”, antes só “serviram para liquidar direitos”, avisa o líder parlamentar João Oliveira. Os comunistas não admitem, mas não se cansam de fazer contas e, se se concretizarem as previsões que as últimas sondagens têm avançado, aos socialistas bastará em Outubro um PAN robustecido ou então optar por um dos dois grandes companheiros desta legislatura – PCP ou BE.

Por isso, os comunistas começam já com o apelo ao voto na CDU e no PCP para que das legislativas volte a sair uma correlação de forças à esquerda e não uma maioria absoluta socialista. E quando fala dessa correlação de forças, o líder parlamentar do PCP refere-se “ao seu todo” sem “excluir” ninguém, mas com atenção ao “peso relativo” de cada um – e é aí que insiste que a força do PCP na nova solução política “permitiu recuperar direitos”, e que o peso que o PS tem se revelou um “bloqueio” para diversas propostas do PCP.

Questionado nesta quinta-feira, durante a apresentação do balanço da actividade do PCP nesta legislatura, sobre se o PAN teria lugar, a partir de Outubro, numa solução à semelhança da actual, João Oliveira preferiu ser indirecto. “Tem que ser uma correlação que permita a construção de uma política alternativa e exige, em primeiro lugar, o compromisso de cada partido e grupo parlamentar com as bases dessa política alternativa, patriótica e de esquerda. Eu não identifico essa possibilidade em vários outros partidos”, afirmou, sem especificar.

“O que sabemos, de experiência feita, é o que o passado nos diz: maiorias absolutas ou maiorias de conveniência nunca serviram os interesses dos trabalhadores e do povo e nunca serviram verdadeiramente os objectivos de progresso e justiça social”, apontou o deputado. “Temos os exemplos das maiorias absolutas de um só partido, com uma experiência muito dolorosa no retrocesso das condições de vida e de trabalho, e várias experiências de maiorias de conveniência que se foram formando servindo os mesmos objectivos de liquidação de direitos económicos e sociais”, acrescentou.

A CDU ou o “caminho de incerteza"

João Oliveira insistiu na ideia de que o voto dos portugueses será a “escolha entre dois caminhos possíveis: ou o voto no PCP e na CDU para garantir o aprofundamento do que foi conquistado nesta legislatura e a possibilidade de termos uma verdadeira política alternativa, ou ter um caminho de incerteza e insegurança que eventualmente deixe o caminho aberto para o retrocesso e a liquidação de direitos, e que ponha em causa o que foi conquistado.”

Vincando saber que os portugueses “valorizam” o que recuperaram nestes quatro anos, o deputado comunista alertou que essa “valorização tem que ter correspondência nas opções políticas e eleitorais”. Ou então corre-se o risco de se voltar “em força às opções da política de direita, seja ela efectivada pelo PSD, pelo CDS ou pelo PS”.

Num longo balanço da actividade parlamentar destes quatro anos, o líder da bancada do PCP enumerou medidas que partiram do PCP ou que apoiou, desde a reposição dos salários e feriados, e aumentos das pensões, até ao alívio no IRS para os rendimentos mais baixos, passando pela redução do IVA, eliminação do PEC, alargamento do passe social, gratuitidade dos manuais escolares e da entrada nos museus ao domingo, reversão de privatizações, reposição do horário de 35 horas, redução das taxas moderadoras e das propinas, aprovação das leis de bases da saúde e da habitação ou a contratação de funcionários para as escolas.

Não faltaram as críticas às “limitações” e “bloqueios” do PS que, disse, não permitiram um maior aumento do salário mínimo, mais protecção dos trabalhadores na lei laboral, e maior reforço dos serviços públicos – e onde os socialistas procuraram apoio à direita.

Campeão dos projectos de lei

Em termos estatísticos, o grupo parlamentar do PCP foi o que mais iniciativas legislativas apresentou (373), com 306 projectos de lei e 67 apreciações parlamentares, enquanto nos 458 projectos de resolução (iniciativas sem força de lei e que apenas representam recomendações ao Governo) entregues só foi ultrapassado pelo Bloco (513).

João Oliveira enumerou ainda as 48 audições públicas promovidas, com temas como os direitos laborais, política cultural, cuidadores informais, reforma da PAC, lei de bases da saúde ou direito à habitação. A que acrescentou as mais de 1400 audiências no Parlamento a entidades e representantes de todos os sectores da sociedade e as 1350 reuniões e visitas dos deputados um pouco por todo o país e nas comunidades portuguesas que lhes permitiu trazer à Assembleia os “problemas concretos das pessoas”.

Questionado sobre se esse trabalho passou para a opinião pública, João Oliveira aproveitou para dar uma alfinetada ao Bloco afirmando ser “motivo de orgulho” que o grupo parlamentar do PCP tenha sido o único que, depois de anunciar que tinha conseguido fazer aprovar uma proposta, não foi desmentido. Vincou o “trabalho de seriedade e empenho na discussão política” e a opção de “não antecipar anúncios que ponham em causa a concretização” das medidas.

Propostas eleitorais

João Oliveira aproveitou para deixar três novas propostas para o programa eleitoral: a limitação do trabalho nocturno e em regime de turnos e de laboração contínua (entre as 20h e as 7h), com o pagamento de um subsídio mínimo de 25%, permitindo a antecipação da idade da reforma sem penalizações, um dia de férias adicional por cada três anos neste regime, e o direito a sair desse regime aos 55 anos; o reforço orçamental do programa de arrendamento Porta 65 Jovem; e um plano de investimento no alojamento estudantil que garanta o acesso a residência pública a mais 20 mil estudantes de menores recursos.

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