Estudio P
A alma da Cerâmica de Valadares tem um novo corpo
A histórica e quase centenária Cerâmica de Valadares faz parte do imaginário colectivo de todos os portugueses. Com um interregno de quase dois anos na produção, está de volta ao activo com um novo nome, ARCH Valadares, mas com a experiência e alma de sempre.
A história da Cerâmica de Valadares confunde-se com a da localidade que lhe dá nome: fundada em 1921, a quase centenária empresa de Vila Nova de Gaia passou por uma fase complicada mas voltou a erguer-se com base na sua história e alma. Depois de um processo de insolvência, em 2012, a Cerâmica de Valadares voltou ao activo em 2014 graças à resiliência de ex-funcionários e da Câmara Municipal de Gaia. ARCH (Advanced Research Ceramic Heritage) dá nome à nova sociedade mas o saber e a arte da Valadares original nunca se perdeu.
Ao longo dos anos, a empresa foi inovando, foi-se especializando e foi crescendo. A Cerâmica de Valadares chegou a ter mais de 600 colaboradores, sendo um dos mais importantes pólos de emprego da região. Quando a produção foi interrompida, foram 300 trabalhadores para o desemprego. Curiosamente, não foi a crise financeira que quase a fez falir – para o engenheiro Henrique Barros, ex-funcionário, uma das pessoas envolvidas no processo e hoje administrador da ARCH, a Cerâmica de Valadares “fechou por razões financeiras, associadas a questões de opção, por estar integrada num grupo empresarial que não tinha muito a ver com cerâmica directamente e que acabou, de algum modo, por criar condições para que houvesse esse desenlace negativo.”
Desenvolvem os produtos de raiz, testando materiais no laboratório, criando design próprio e garantindo que, pelo menos durante 20 anos, os produtos não sofrerão alterações. Apesar de utilizarem a tecnologia necessária, as peças da ARCH distinguem-se pelo molde manual e pela personalização. Metaforicamente, Henrique Barros diz que “obrigou a alma a mudar de corpo”: “recuperei aquilo que havia de bom e arranjei um corpo novo, embora com muitos membros antigos.” Aos 76 anos, Armando Gaspar, colaborador da Valadares durante toda a sua vida, estava reformado quando a Cerâmica parou mas foi uma das pessoas que fez questão de participar no processo de recuperação. Com muita dedicação, continua a trabalhar na criação dos moldes, um processo artesanal, calculado ao pormenor e é um dos “membros antigos do novo corpo”.
Henrique Barros recorda ainda a reacção das pessoas quando a sirene da Cerâmica voltou a tocar, depois de quase dois anos silenciada: “Quando ela ligou desta vez, acordaram para um significado que nunca tinham percebido bem mas que naquele momento era muito importante. Portanto, até isso acaba por emprestar à empresa e a toda a gente que cá trabalha, uma responsabilidade adicional. Não podemos deixar que a sirene se apague novamente”.