Prancha de surf inteligente feita em Portugal vai facilitar aprendizagem — e ajudar o ambiente
Feita de material reciclável, terá sensores que permitirão monitorizar e corrigir o posicionamento dos praticantes. Ideia foi apresentada por antigo campeão de longboard e desenvolvimento será feito pelo Instituto Superior de Engenharia de Coimbra.
Em média, todos os anos, saem de circulação entre oito a 15 pranchas em cada escola de surf. Esse número, multiplicado pelas 350 instituições de ensino desta modalidade registadas em Portugal, diz-nos que são entre três e cinco mil pranchas que, devido ao material derivado de petróleo, não podem ser recicladas e reutilizadas, acabando inevitavelmente no lixo.
O cálculo foi feito por Eurico Gonçalves, professor de surf desde 1998 e antigo campeão nacional de longboard. Foi precisamente com este pensamento ecológico que decidiu propor ao Instituto Superior de Engenharia de Coimbra (ISEC) a construção de uma prancha totalmente reutilizável.
“Chegámos à conclusão de que mais de 90% dos praticantes de surf não são competidores”, realça, em conversa com o PÚBLICO. Por esse mesmo motivo, não vê qualquer necessidade de as escolas utilizarem as pranchas de alta performance que, devido ao plástico polipropileno, conseguem ser mais rápidas e ágeis do que as de madeira.
O professor de surf garante que não há qualquer diferença a nível de conforto. A madeira — revestida de cortiça por questões de segurança — é mais durável do que o material utilizado nas restantes pranchas, não existindo a necessidade de uma substituição tão frequente. “A nível de preço também são equivalentes”, atesta.
Tecnologia vai facilitar aprendizagem
Depois de decidir que queria uma prancha amiga do ambiente, Eurico Gonçalves passou a pasta ao Laboratório de Biomecânica do ISEC, onde, para além da preocupação ecológica, se identificou a possibilidade de acrescentar uma vertente tecnológica ao projecto.
“O Eurico veio ter connosco no sentido de perceber se estaríamos interessados em desenvolver uma prancha com uma pegada ecológica reduzida. Decidimos colocar-lhe o desafio de, para além disso, criarmos uma prancha [tecnologicamente] mais evoluída. Existem métodos de cálculo computadorizados, a que conseguimos acrescentar uma componente de engenharia mais complexa”, relembra Mário Velindro, presidente do ISEC.
Os responsáveis pelo projecto tiveram a ideia de incorporar sensores na prancha, com o objectivo de monitorizar quanta pressão os aprendizes da modalidade exercem, bem como a sua localização. Todos estes factores permitirão aos praticantes corrigirem comportamentos, de modo a potenciarem o rendimento e facilitarem a iniciação na modalidade.
“As pernas do surfista fazem exactamente o mesmo que um amortecedor de um carro. O praticante tem de criar flexibilidade, como uma mola. Essa pressão é monitorizável e esses dados podem ser analisados no computador. No fundo, é colocar na prancha algo que permita fazer a leitura do que aconteceu durante o treino: o tempo que esteve na água, quantos metros conseguiu surfar, a energia que consumiu. Um conjunto de dados que vai tornar a prancha inteligente”.
O chip inserido na prancha poderá depois ser extraído e os dados introduzidos no computador, à semelhança do que acontece com uma pen drive. Através de gráficos de leitura acessível, o praticante terá indicações sobre o que deverá fazer para exponenciar o rendimento e garantir melhores resultados. “Se precisa de fazer mais força na perna esquerda ou inclinar-se para trás” serão algumas das dicas que poderão ser providenciadas pela análise dos pontos de pressão que os sensores controlarão, explica Mário Velindro. Este controlo terá também impacto na saúde, visto que permitirá aos praticantes corrigir eventuais posicionamentos corporais prejudiciais.
Ainda não há uma estimativa para quando existirá um protótipo funcional, mas o presidente do ISEC gostaria que “no próximo Verão” já existisse algo que pudesse ser mostrado. O académico avança que vários ramos de engenharia vão contribuir para a materialização do projecto, que ainda se encontra na fase conceptual. Em relação a um eventual preço deste produto caso chegue ao mercado, Mário Velindro desdramatiza: “Actualmente, temos este tipo de sensores a preços relativamente baixos. Se uma prancha normal custar 500 euros, por exemplo, uma inteligente custará por volta de 700”.
Eurico Gonçalves não esconde que o objectivo seria que estas pranchas fossem massificadas. “Estou muito motivado pela vertente ecológica do projecto e entusiasmado pela tecnológica”, finaliza.