Um Inventário Florestal em conserva
Comparado com uma empresa de produção de conservas, ao que se assemelha o 6.º Inventário Florestal Nacional com um inventário de armazém?
Foram disponibilizados há dias os dados preliminares do 6.º Inventário Florestal Nacional (IFN6), operação da responsabilidade do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). O ministro Capoulas Santos já havia dado nota desta disponibilização para muito breve. O IFN6 estava “concluído”, anunciou!
Todavia, este exercício de 2019 repete um outro de 2013. do tempo da ministra Assunção Cristas. Num caso, a cobertura aerofotográfica terá sido de 2010. Agora será de 2015. Na prática, o IFN6 não passa da fase do anúncio de dados preliminares. No primeiro caso, após três anos de tratamento de dados. Agora, de quatro. Num e no outro caso, só são anunciados dados de ocupação do solo e sua evolução no tempo
Comparado com uma empresa de produção de conservas, ao que se assemelha o IFN6 com um inventário de armazém? Digamos que o IFN6 nos indica qual a área ocupada pelas latas de conserva de sardinha, de atum e de anchovas. Mas nada nos diz quanto ao número de prateleiras, número de latas por prateleira, por latas de diferentes gramagens, sobre as datas de validade do produto ou quanto ao estado de conservação da lataria. Com certeza, não será possível dar a indicação a um hipermercado sobre as existências de que dispomos por metro quadrado de espaço ocupado em armazém! Isso equivaleria a quantas toneladas por diferentes produtos?
Não há espaço aqui para detalhar as especificidades de um Inventário Florestal Nacional, seja em Portugal ou num outro qualquer país. No entanto, a um Inventário desta natureza estão associados a quantificação e qualificação de um vasto conjunto de parâmetros. A ocupação do solo e sua evolução nem são dos mais relevantes. Digamos que a Direcção-Geral do Território já se debruça em detalhe sobre estes parâmetros, com as Castas de Ocupação do Solo. Um inventário florestal vai muito além.
Como atrás dado nota, importa que se quantifiquem existências, disponibilidades em volume, por espécie e classes de idade, para se perspectivar a evolução da indústria sem que haja sobre-exploração dos recursos naturais. No mesmo sentido, tem de dar indicadores da disponibilidade em biomassa, para que seja utilizada para energia sem comprometer o fundo de fertilidade dos solos. Ao contrário do que anunciou o secretário de Estado João Galamba, não precisamos de especialistas finlandeses para quantificar e qualificar a biomassa florestal. Um IFN deveria dar essa resposta.
O IFN tem ainda de dar indicadores dos problemas que vitimam os espaços arbóreos, seja no que respeita a incêndios, mas também no que respeita ao impacto provocado por pragas e por doenças. E este último aspecto tem sido cada vez mais relevante. Exponencialmente relevante. Tem de dar ainda indicação sobre o carbono armazenado, sobre a biodiversidade que os diferentes espaços arbóreos albergam. Ora, o último Inventário que temos com todos estes parâmetros remonta a 2006, com recolha de dados em 2005. Já lá vão 14 anos.
Sobre a “super-actualidade” desta segunda fase preliminar, com base em 2015, importa ter em conta a posição de Portugal no ranking de área ardida na União Europeia. De facto, não somos um país grande, mas detemos a posição cimeira por três anos consecutivos, em 2016, em 2017 e em 2018. Sequência nunca registada anteriormente.
Parece que o ministro Capoulas Santos considerou oportuna uma sugestão do sector para a realização do IFN a cada cinco anos. Brilhante! O que o ministro parece ignorar é que a Administração já pensou, estudou e propôs a realização de Inventários anuais, tendo por base o estabelecimento de parcelas permanentes. Essa proposta remonta a 2006, na sequência do 5.º Inventário Florestal Nacional. Convinha que se actualizasse.
Uma nota final! O INE disponibilizou recentemente os dados provisórios das Contas Económicas da Silvicultura de 2017. Todos temos na memória os acontecimentos trágicos desse ano, não havia grande esperança em dados positivos. Mas o que há aqui a realçar é a sina do ministro Capoulas Santos. No seu anterior mandato com o pelouro das florestas, entre 1999 e 2002, o valor acrescentado bruto e o rendimento da silvicultura registaram uma queda digna de um escorrega de parque infantil. Até 2009 manteve-se o declínio. Entre 2009 e o 2015 ocorreu uma tímida recuperação. Agora, em 2016 e 2017, novo mandato do ministro e voltamos ao declínio. É má sina!