Nasceu na margem esquerda do Douro e com uma vista imbatível sobre o serpentear do sereno rio Tedo o Vila Galé Douro Vineyards, uma unidade hoteleira com uma forte componente de agro e enoturismo que não pretende mudar a paisagem que a rodeia — antes fundir-se com ela —, mas que já vai marcando a mudança daquele que é o segundo maior grupo hoteleiro a operar em Portugal com uma rede de 24 hotéis (mais nove no Brasil), entre os quais o recém-nascido Vila Galé Collection Elvas.
A Fugas encontrou um espaço altaneiro (com pouco mais de um mês de Douro), ansioso por assentar o pó das últimas obras, por ganhar raízes e por relaxadamente, de preferência com um Porto tónico na mão, contar a história da centenária propriedade próxima da aldeia do Marmelal, entre Folgosa e Pinhão. Localizada no Cima Corgo, a Quinta do Val Moreira consta do mapa (do século XIX) do Barão de Forrester, que tinha o sonho de tornar o rio Douro navegável e seguro até à fronteira com Espanha. Perto de nós existem dois marcos pombalinos classificados como imóveis de interesse público — mandados construir por Marquês de Pombal, em 1757, serviam para assinalar a zona dos vinhos generosos do Douro, colocada sob a jurisdição da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas Douro.
Criava-se assim a primeira região demarcada de vinhos do mundo. Assistimos neste momento ao lançamento da Val Moreira, uma nova marca de vinhos do Douro e do Porto, tirando partido dos cerca de 25 hectares de vinhas existentes na propriedade. “Foi um achado. É um paraíso”, sublinha Vasco Parente, director do hotel, que por agora conta com sete quartos, restaurante e bar com vista panorâmica e terraço, adega, biblioteca e piscina exterior. “O resto é paisagem.”
A propriedade, com quarenta hectares (vinhas, amendoeiras e oliveiras), foi adquirida por “dois amantes de vinho” (Jorge Rebelo de Almeida, presidente do conselho de administração da Vila Galé, e António Parente, presidente do conselho de administração do Grupo Madre), cujo vulto de perfil, como num episódio hitchcockiano, aparece na marca Xvinus - Fine Wine Company, que já lançou a marca Val Moreira: um branco de 2018 (seis meses de estágio), um tinto de 2017 (uvas colhidas entre os 200 e os 600 metros de altitude), três Portos (porque “herdaram” uma adega com vinho) e azeite com azeitonas colhidas na propriedade.
O investimento de 13 milhões de euros na compra da propriedade reforça a presença da Vila Galé no Douro vinhateiro, onde já existia o Vila Galé Collection Douro, em Lamego, de frente para a Régua. “É especial porque significa um reforço da nossa aposta no agroturismo e no enoturismo e, sobretudo, na área vinícola. Já produzimos vinhos e azeites regionais no Alentejo, perto de Beja, com a marca Santa Vitória. A entrada no mercado dos vinhos do Douro e do Porto com o lançamento da marca Val Moreira é mais um passo nessa estratégia”, refere o presidente do grupo Vila Galé.
“Conseguimos conjugar na perfeição a tradição do douro vinhateiro, a sua gastronomia e a beleza de toda a região”, acrescenta Jorge Rebelo de Almeida. Esta primeira fase do empreendimento, que criou 20 postos de trabalho, mereceu um investimento de oito milhões de euros. Em Junho arrancará uma segunda fase, prevendo-se a construção de mais 42 unidades de alojamento (quartos e suites), na qual a Xvinus vai investir mais cinco milhões de euros. Deverá estar concluída em Junho de 2020.
Milhões à parte, são sete quartos (com as tipologias standard, suite, suite duplex e suite deluxe) com vista para um vale rendilhado e a sensivelmente 800 metros da N222, a tal que colecciona adjectivos e onde raramente passa um carro. Quem aqui chega, quer provar o Douro (o vinho, mas também o pão de milho e de centeio cozido no mesmo forno a lenha que ao domingo assa o cabrito, o folhado de maçã de Armamar e outras iguarias locais), mas quer sobretudo sentir o Douro, mergulhar na piscina e ficar a ver as sombras das colinas devorarem lentamente o vale.
Depois, se a fome vencer a preguiça, descer ao open space recepção/bar/restaurante (o percurso através de socalcos pode fazer-se em viatura própria ou a recepção providencia transporte imediato) e continuar a usufruir da vista imensa a par da essência dos pratos tradicionais com um twist — como o Creme de espargos verdes, crocante de salpicão e cebolinho, o Torricado de alheira de Lamego com ovo de codorniz ou o Portobello gratinado, requeijão, presunto, tomate cherry e azeite seco de manjericão (entradas); os Medalhões de bacalhau, esmagada de batata, grelos salteados, ovo escalfado e molho de vinho branco, a Sela de borrego, risotto de ervilhas e cogumelos silvestres ou o Cachaço de porco Bísaro, batatas novas, pak choi e uvas em vinho do Porto (pratos principais); o Folhado de maçã de Armamar, leite de amêndoa e gelado de nata, a Cavaca de Resende e compota de pêra com gengibre ou Vaso de chocolate com vinho do Porto Val Moreira.
A carta dispõe também de um prato “da nossa tradição” por dia. Pastéis de massa tenra com arroz de feijão manteiga (segunda-feira), Filetes de polvo com arroz de grelos (terça), Arroz de pato à antiga (quarta), Lombos de bacalhau à Margarida da Praça (quinta), Empada de caça com espinafres salteados (sexta), Trutas do rio Cavado com presunto e batata cozida (sábado) e Cabrito assado com batata e grelos salteados (domingo).
Entre o restaurante, janelões XXL, e a piscina — ou entre a piscina e o restaurante — vale a pena reservar um momento para visitar a adega escavada (visitas e provas todos os dias das 10h às 18h), o antigo lagar em granito, a prensa e a barrica com (cheiro a) Porto com 90 anos e o mural de 180m por 1,60m com uma paisagem do Douro composta por sete mil rolhas assinada por Saimir Strati (Tirana, Albânia, 1966), artista plástico premiado com dez recordes mundiais do Guinness (em 2004 conquistou um dos seus recordes com o maior mosaico do mundo feito com 300 mil rolhas de cortiça, que retrata José Saramago. E para revistar Aquilino Ribeiro e Miguel Torga na biblioteca contígua.