Eclectismo e excelência musical em Espinho
Entre 21 de Junho e 20 de Julho, o Festival Internacional de Música de Espinho percorre múltiplos caminhos da música erudita por intérpretes de referência, ao mesmo tempo que confere um lugar especial ao jazz e à música popular brasileira.
Na sua 45.ª edição, o Festival Internacional de Música de Espinho (FIME) faz justiça à sólida reputação construída ao longo das últimas décadas através de uma série de propostas de elevada qualidade artística que se estendem ao longo de um amplo arco temporal: da Idade Média ao nosso tempo. A música erudita ocidental preenche a maior parte dos concertos, mas o jazz tem igualmente um lugar cativo, assim como incursões por outros domínios, como é o caso da música popular brasileira e de propostas menos convencionais como um concerto humorístico.
A abertura, hoje às 22h, no Auditório de Espinho, tem como protagonista David Grimal, violinista com uma intensa carreira internacional, que se distingue também por ter criado em 2004 a orquestra Les Dissonances, uma formação assente no trabalho colectivo sobre as obras e no diálogo entre os próprios instrumentistas, prescindindo da figura do maestro. No FIME, Grimal irá dirigir a Orquestra Clássica de Espinho a partir do violino, sendo solista no Concerto op. 77, de Brahms, e nas Zigeunerweisen (árias ciganas), op. 20, de Pablo de Sarasate.
Outras presenças de vulto na edição de 2019 incluem Andreas Staier (com um recital de pianoforte no dia 6) e o duo formado pelo pianista Alexander Melnikov e pelo violoncelista Alexander Rudin, que apresentam um programa que estabelece uma ponte entre Chopin e Rachmaninov, representantes da estética do Romantismo separados por cerca de um século, e que faz também uma incursão pela Elegia, para violoncelo solo, composta por Andrei Golowin em 1980 (amanhã, às 22h). Quanto a Andreas Staier, que gravou recentemente um magnífico CD com a Orquestra Barroca Casa da Música (À Portuguesa – Iberian Concerts & Sonatas, Harmonia Mundi, 2018), irá interpretar num pianoforte, cópia de Walter & Sohn (ca. 1805), a Fantasia em dó menor, KV 475, Mozart; as Variações Hob. XVII/6, de Haydn; a Fantasia, Wq. 80, de C.P.E. Bach, e a Sonata KV 533/494, de Mozart.
Destaca-se também a estreia no FIME do Kronos Quartet, lendário agrupamento que não conhece fronteiras musicais. A sua versatilidade e eclectismo estarão bem patentes num programa que combina música erudita contemporânea, jazz e arranjos de músicas de tradição oral, e que celebra também os 30 anos da edição de Different Trains, de Steve Reich, cuja gravação pelo Kronos Quartet valeu ao compositor um Grammy em 1989.
Além do Auditório de Espinho, o FIME terá também concertos noutros espaços, alguns de entrada livre. Será o caso da actuação do Lisboa String Trio — constituído por Bernardo Couto (guitarra portuguesa), José Peixoto (guitarra) e Carlos Barretto (contrabaixo) — no jardim interior da Biblioteca Municipal de Espinho no dia 27; da jovem violinista Elicia Silverstein que tocará obras do Barroco e do século XX (de compositores como J. S. Bach, Antonio Montanari, Sciarrino e Berio) na Capela de Nossa Senhora da Ajuda no dia 28; e da estreia em Portugal do sexteto vocal The Gesualdo Six, num repertório que percorre vários séculos: da compositora medieval Hildgard von Bingen até Arvo Pärt e Jonathan Harvey, passando pela polifonia vocal franco-flamenga, inglesa e italiana (dia 29, na Igreja Matriz).
No campo do jazz será possível conhecer ao vivo o projecto A Novel of Anomaly, que conta com a voz multiforme e a grande capacidade de improvisação de Andreas Schaerer, com Luciano Biondini no acordeão e Lucas Niggle na bateria (dia 12). Marcos Valle, uma das referências da música popular brasileira estreará novos arranjos com a Orquestra de Jazz de Espinho na Praça da Piscina Solário Atlântico (dia 13) e o quinteto formado por Danilo Pérez (piano), Avishai Cohen (trompete) e Chris Potter (saxofone), Larry Grenadier (contrabaixo) e Jonathan Blake (bateria) traz a Espinho uma série de composições originais inspiradas na literatura, principalmente da autoria de mulheres escritoras.
No encerramento do FIME (dia 20 de Julho), volta a actuar a Orquestra Clássica de Espinho, desta vez na Praça Dr. José Salvador, tendo como solista o brasileiro Yamandú Costa no violão de sete cordas e direcção musical de Jan Wierzba.
Um concerto grupo de percussão CRASSH no Festival Júnior (30 de Junho); a nova rubrica Concertos Breves, que inclui recitais de órgão por Jonathan Ayerst e António Esteireiro aos sábados ao meio-dia, na Igreja Matriz (dias 6 e 13 de Julho); e a recuperação da temática do humor na música, com a participação do imprevisível e divertido quarteto de cordas MozART Group (dia 6 de Julho); palestras pré-concerto pelo musicólogo João Silva, um workshop por Andreas Schaerer, entre outras actividades, constituem outros momentos de uma programação de grande diversidade, mas ao mesmo tempo criteriosa na selecção dos repertórios e dos intérpretes. Criado em 1964 como evento associado ao projecto pedagógico da Academia de Música de Espinho, o FIME é um dos mais antigos festivais de música portugueses, contando actualmente com o apoio da DGArtes e da Câmara Municipal de Espinho.