Xi aterra em Pyongyang para estreitar laços com Kim e enviar mensagem a Trump
O Presidente chinês e o líder norte-coreano deverão alinhavar posições antes de Xi se encontrar com Donald Trump à margem da cimeira do G20, no final deste mês em Osaka, no Japão.
Com pompa e circunstância, o Presidente chinês, Xi Jinping, aterrou esta quinta-feira no Aeroporto Internacional de Sunan Pyongyang, na Coreia do Norte. Cumprimentou o seu homólogo norte-coreano, Kim Jong-un, e, passando por mais de 100 mil norte-coreanos com bandeiras, faixas e flores, viajaram até ao Palácio do Sol de Kumsusan, onde debateram a situação política internacional, segundo a agência chinesa Xinhua.
É a primeira visita de um chefe de Estado chinês à Coreia do Norte em 14 anos - dessa vez, o anfitrião foi Kim Jong-il, e o visitante Hu Jintao. Nos quatro encontros anteriores foi Kim quem se deslocou a Pequim. A viagem tem como objectivo estreitar os laços entre Pequim e Pyongyang, mas também servirá, porventura, para alinhavar posições antes de Xi se encontrar com o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, à margem da cimeira do G20, no final deste mês em Osaka, no Japão. A desnuclearização da Coreia do Norte será certamente um dos principais temas na agenda dos dois líderes.
Outro dos temas em discussão entre Xi e Kim será o aproximar dos elos económicos e humanitários entre os dois países – Pequim já é um dos principais parceiros económicos de Pyongyang. A China poderá também enviar centenas de toneladas de arroz ao seu aliado para combater os efeitos da seca extrema que tem atingido a Coreia do Norte, juntando-se à Coreia do Sul neste esforço.
A visita de Xi acontece meses depois de as relações entre os dois históricos aliados se terem deteriorado: a cada provocação nuclear norte-coreana, a China respondeu com uma posição cada vez mais dura, chegando inclusivamente a votar a favor de resoluções no Conselho de Segurança das Nações Unidas a condenar Pyongyang.
Simbolismo e substância
Os analistas, diz o Guardian, esperam que o chefe de Estado chinês apoie as exigências norte-coreanas no encontro com Trump: alívio das sanções em resposta a cada passo que Pyongyang der no sentido da desnuclearização. Washington nunca aceitou esta exigência, contrapondo que apenas aliviará as sanções após a desnuclearização total. Foi a principal razão para as duas cimeiras entre Kim e Trump terem falhado – na primeira faltou um roteiro concreto, na segunda um consenso mínimo.
Mas mesmo que Pequim o defenda, as discussões entre Xi e Kim podem não ser “substantivas”, como defende Zhao Tong, especialista na Coreia do Norte do Carnegie Tsinghua Centre, ao jornal britânico, por os dois líderes “não terem suficiente confiança mútua” neste momento.
Obstáculo que Kim dá sinais de querer ultrapassar. E tem fortes motivações para o fazer: precisa de mostrar ao mundo que continua a contar com o apoio de Pequim, ainda que por vezes discordem em alguns pontos. Sem o apoio chinês, o regime norte-coreano ficará completamente isolado internacionalmente.
“A visita será mais sobre simbolismo do que substância, mas ambas as nações sentem as pressões vindas de Washington – a Coreia do Norte por causa da desnuclearização e a China por causa do comércio. E Xi e Kim poderão beneficiar muito se se aliarem contra a administração Trump”, explicou Harry Kazianis, director de Estudos Coreanos do Centre for the National Interest, think tank sediado em Washington, ao South China Morning Post.
A posição dos media norte-coreanos aponta precisamente nesse sentido. “O camarada Xi Jinping visita o nosso país quando há grandes e sérias tarefas, derivadas de relações internacionais complexas, o que mostra que o partido e Governo chineses dão uma grande importância à amizade entre os dois países”, escreveu em editorial o jornal norte-coreano Rodong Sinmun. “A amizade entre a Coreia do Norte e a China é inquebrável”.
Entre os principais eventos da visita de dois dias de Xi está a homenagem à Torre da Amizade de Pyongyang, monumento dedicado às tropas chinesas que salvaram a Coreia do Norte das forças da Coreia do Sul e da coligação das Nações Unidas, lideradas pelos Estados Unidos, na Guerra da Coreia.
“Para a Coreia do Norte, os encontros que se seguirão servem para mostrar aos Estados Unidos que a China a protege e para enviar uma mensagem a Washington de que deve parar com a sua postura de pressão máxima”, explicou Lim Eul-chul, professor de Estudos Norte-Coreanos na Universidade de Kyungnam, em Changwon, na Coreia do Sul.
Pyongyang tem encetado uma estratégia de diversificação de alianças para receber apoios nas negociações com Washington. No final de Abril, Kim viajou até Vladivostok para se reunir com o Presidente russo, Vladimir Putin, mas o encontro acabou sem propostas concretas para se ultrapassar o impasse nas negociações, ainda que tenha sido caracterizado como “muito significativo”.
Putin limitou-se a dizer que Pyongyang estava pronta para avançar com a desnuclearização mas que precisava de “garantias de segurança” multilaterais, e não apenas dos Estados Unidos.
Pyongyang também tem dado alguns passos de aproximação com o seu vizinho do Sul, negociando o atenuar das tensões com passos significativos – pequena desmilitarização da fronteira e reabertura de centros industriais. Kim encontrou-se com o seu homólogo sul-coreano, Moon Jae-in, por duas vezes – uma na zona de desmilitarização e outra em Pyongyang -, algo histórico por si só. Mas, no final de Março, a diplomacia entre as duas Coreias sofreu um revés: o regime norte-coreano anunciou a retirada dos seus 20 representantes do gabinete de ligação na fronteira.