Porto discute na segunda-feira que espaços de consumo assistido quer para a cidade

Relatório final da Comissão de Acompanhamento da Toxicodependência aponta para um consenso sobre a necessidade de se criarem espaços de consumo assistido. Maioria dos especialistas considera que unidade móvel é insuficiente e deverá ser sempre acompanhada por um espaço fixo, ainda que amovível.

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As salas de consumo assistido devem ajudar a diminuir a consumo a céu aberto Paulo Pimenta

A Assembleia Municipal (AM) do Porto vai reunir-se na próxima segunda-feira para analisar o relatório final da Comissão de Acompanhamento da Toxicodependência, criada em 2016. Os especialistas ouvidos pela comissão são unânimes em apontar a necessidade de se criarem espaços de consumo assistido na cidade, mas o relatório não aponta qualquer recomendação sobre o modelo a seguir, deixando às forças políticas a possibilidade de o fazerem. O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, já disse que apoiaria a criação de uma unidade móvel, mas quem trabalha no terreno diz que isso é pouco.

A comissão, criada em Julho de 2016 por proposta conjunta do grupo independente de Rui Moreira e do PS, deveria acompanhar a realização de um estudo sobre a criação de salas de consumo assistido, que se mostrou favorável a essa hipótese. O grupo criado no seio da AM considerou, contudo, que precisava de ouvir alguns especialistas para dar o trabalho por concluído. É o relatório que resultou dessas audições que está agora pronto para ser discutido pelos deputados municipais.

Há matérias que estão já desactualizadas – como a referência insistente ao Bairro do Aleixo como um dos principais locais de tráfico e consumo de droga e, por isso mesmo, como o espaço mais vezes apontado como ideal para a instalação de uma eventual sala de consumo assistido. Mas há, sobretudo, muito consenso em torno da necessidade de se criarem espaços deste género e uma preferência clara pela criação de uma unidade móvel e uma estrutura fixa, ainda que amovível – solução, aliás, que já fora apresentada à Câmara do Porto e à Administração Regional de Saúde (ARS) do Norte por um consórcio de seis organizações não-governamentais que trabalham no apoio aos toxicodependentes.

À questão colocada pelos deputados municipais sobre se o modelo a adoptar deveria ser fixo ou móvel, Rui Morais, psicólogo e membro do Caso — Consumidores Associados Sobrevivem Organizados (uma das estruturas do consórcio) remeteu para a proposta apresentada: “O documento contempla uma sala fixa na zona Ocidental com uma estrutura amovível e depois uma equipa móvel que possa circular por outros locais onde exista consumo a céu aberto.”

Também José António Pinto, assistente social da Junta de Campanhã apontou o mesmo caminho: “Devia haver uma unidade fixa e uma unidade móvel, que se pudesse deslocar”, cita o relatório. Maria Dulce Pinto, directora executiva do agrupamento de centros de saúde do grande Porto, chamou a atenção para o problema de uma estrutura móvel só servir duas pessoas de cada vez, o que no seu entender é insuficiente, enquanto Abílio Meneses, técnico nos projectos de redução de riscos e minimização de danos, explicou que dificilmente os toxicodependentes serão capazes de cumprir os horários que uma carrinha móvel faça. “Nós somos animais de hábitos e se tivermos uma sala fixa a que podemos acorrer diariamente a qualquer hora é lá que vamos”, disse.

"Criação de unidade fixa"

É com base nestas e outras opiniões que as forças políticas representadas na AM deverão apresentar as suas recomendações. Pelo grupo de Rui Moreira, André Noronha confirmou que está a ser preparada uma recomendação, mas recusou-se a adiantar o seu conteúdo. Gustavo Pimenta, do PS, explica que o partido ainda está a ultimar a proposta que o partido irá apresentar, mas adianta que esta deverá recomendar a criação “de uma unidade fixa mas amovível e o reforço das instituições que estão no terreno de forma a capacitá-las para serem elas próprias a operar as salas móveis [carrinhas]”.

O PÚBLICO não conseguiu obter a posição do PSD e Rui Sá, da CDU, explicou que só esta sexta-feira é que serão decididos os termos da recomendação comunista. Já o Bloco de Esquerda não deverá apresentar uma proposta muito diferente daquela que foi chumbada pela AM em 2016. “Ainda vamos decidir os termos exactos, mas deve ir no mesmo sentido de criação de espaços de consumo assistido, porque as audições na comissão reforçam essa urgência”, diz Pedro Lourenço. Bebiana Cunha, do PAN – Pessoas Animais Natureza defende um modelo “biopsicossocial, em que se trabalhe com as pessoas, trazendo-as de volta para o sistema”, e que envolva obrigatoriamente a Câmara do Porto e a ARS Norte.

Esse envolvimento, nomeadamente ao nível do financiamento, é a grande questão que poderá subsistir no final da AM de segunda-feira – e que, por si só, poderá atrasar de novo o avanço dos espaços de consumo assistido.

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