Câmara de Braga permite hotel junto às Convertidas contra voto do vereador do Urbanismo
O executivo municipal accionou o mecanismo de excepcionalidade previsto no PDM para abrir as portas à reconversão de um edifício junto ao Recolhimento das Convertidas, edifício classificado pela DGPC, num hotel de cinco pisos, com 110 quartos. O vereador do Urbanismo, Miguel Bandeira, considera que o impacte da obra prevista a nível patrimonial é elevado e votou contra.
O Recolhimento das Convertidas, edifício barroco com três pisos, construído na primeira metade do século XVIII pelo arcebispo Rodrigo de Moura Teles para servir de abrigo a mulheres e classificado como Monumento de Interesse Público pela Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), pode, no futuro, estar ladeado de um hotel de cinco pisos no edifício de dois pisos que lhe é contíguo, em plena Avenida Central.
Em reunião decorrida na terça-feira, o executivo municipal bracarense aprovou o regime de excepcionalidade previsto no PDM, mecanismo que permite a modificação da altura e da volumetria do imóvel, no âmbito do projecto. Apesar de a proposta ter merecido o voto favorável de cinco dos elementos da maioria PSD/CDS-PP, que detém o poder, e do PS, a vereadora da Cultura e da Educação, Lídia Dias, recusou votar, alegando interesses pessoais no assunto, e o vereador Miguel Bandeira, responsável pelo Urbanismo e pelo Património, votou contra.
Membro independente do executivo liderado por Ricardo Rio desde 2013, o geógrafo de formação alegou, num despacho a acompanhar a proposta, a existência de um “elevado impacte morfo-volumétrico incidente no Recolhimento das Convertidas”. Salientou também que a “presumida excepcionalidade do hotel não pode, nem deve, sobrepor-se à excepcionalidade primordial do imóvel classificado”.
A versão actual do projecto, elaborada pelo gabinete de arquitectura Ferreira de Almeida – foi responsável, por exemplo, pela reabilitação do Quarteirão das Cardosas, no Porto, um processo que gerou controvérsia e mereceu, por exemplo, a contestação do Icomos Portugal – contempla 110 quartos e seis pisos (um no subsolo), num imóvel hoje degradado que integra a Zona Especial de Protecção do Recolhimento das Convertidas.
Após a reunião de câmara, Miguel Bandeira disse ter votado contra o ponto em questão “em consciência”, com o conhecimento prévio de Ricardo Rio, “não por estar contra a edificação do hotel”, mas pelo teor do projecto. “Teria de ser um edifício adequado à presença das Convertidas [para votar a favor]”, afirmou o vereador.
O projecto, no entanto, mereceu o parecer favorável da Direcção Regional da Cultura do Norte. A directora de Serviços de Bens Culturais da instituição, Elvira Rebelo, escreveu, em 19 de Outubro de 2018, que o projecto poderia avançar desde que investigasse e respeitasse os vestígios arqueológicos passíveis de serem encontrados naquele espaço e fizesse as devidas adaptações arquitectónicas.
Ricardo Rio escudou-se precisamente nesse documento para avançar com o pedido de excepcionalidade para o projecto, que está sujeito, a partir de agora, ao prazo de um ano para o licenciamento. O autarca disse que respeitou o voto contra de Miguel Bandeira, tal como os votos contra de outros vereadores do seu executivo em ocasiões anteriores, e defendeu “o carácter de excepcionalidade” devido à conjectura económica do turismo que se vive na cidade. “No contexto local, a capacidade hoteleira não ultrapassa as 7500 camas, o que é manifestamente limitado”, disse. “Se o Bom-Jesus vier a ser património da humanidade, o turismo vai crescer e carece de oferta”.
O presidente da câmara alegou ainda que o alargamento do edifício pela encosta que se estende até ao Campo Novo, praça do século XVIII, não vai gerar um “impacto visual grave para quem está na Avenida Central”.
Já um dos vereadores do PS, Artur Feio, que também votou favoravelmente à proposta, por entender que o edifício, devoluto, precisa de ocupação e que a cidade precisa de mais capacidade hoteleira, pediu a demissão do vereador do Urbanismo. O responsável socialista alegou que Miguel Bandeira mostra muita “incapacidade decisória” nos assuntos a seu cargo e criticou a incoerência de ter votado favoravelmente em projectos anteriores, a seu ver mais controversos, como o hipermercado na Rua do 25 de Abril, próxima do centro histórico. “É o arrastar de uma situação de um vereador que, desde 2013, tem tido dificuldades em dossiers muito sensíveis”.
CDU pede mais tempo
Além de Miguel Bandeira, o vereador Carlos Almeida (CDU) também votou contra o regime de excepcionalidade, por entender que não estão “garantidas todas as condições de avaliação do impacte do projecto”. Tal como o vereador do Urbanismo, o responsável comunista não disse estar contra o hotel, mas sim contra as dimensões atribuídas, tendo, por isso, sugerido que a decisão fosse adiada para outra reunião.
O vereador da CDU mostrou-se ainda preocupado pelo facto do projecto poder abrir um precedente relativamente a outras iniciativas imobiliárias que possam ser levadas a cabo no centro histórico ou nas imediações.