Os brasileiros “mantêm a mesma alegria, mas bebem com maior conhecimento”
Milhares de visitantes cada vez mais interessados e informados, com vontade de experimentar vinhos diferentes e de aprender, foi o que perto de 80 produtores de vinho e enólogos portugueses encontraram no Rio de Janeiro durante três dias.
Foram mais de nove mil os brasileiros que, entre 31 de Maio e 2 de Junho, passaram pelo Vinhos de Portugal no Rio, no CasaShopping, Barra da Tijuca, onde era possível provar os vinhos dos 78 produtores presentes no evento organizado pelos jornais PÚBLICO, O Globo e Valor Econômico, em parceria com a ViniPortugal.
Muitos estiveram também nas provas especiais, que tiveram o seu momento mais alto com a vertical de Pêra-Manca, o vinho icónico da Fundação Eugénio de Almeida, apresentada pelo seu enólogo, Pedro Baptista. Quando os bilhetes para esta prova foram postos à venda, contou Simone Duarte, da Out of Paper, responsável pela curadoria do Vinhos de Portugal, esgotaram em 15 minutos.
Marta e Emanuel Oliveira foram dois dos visitantes que estiveram na prova (participaram, aliás, em praticamente todas as provas, dirigidas por críticos de vinho portugueses e brasileiros e ainda pelo Master of Wine brasileiro Dirceu Vianna Júnior). “Gostámos tanto que agora vamos a São Paulo para a degustação do Barca Velha”, diz Emanuel. São Paulo irá receber no próximo fim-de-semana, entre os dias 7 e 9, uma prova do mais famoso vinho português, o Barca Velha, também apresentado pelo respectivo enólogo, Luís Sottomayor, da Casa Ferreirinha, Sogrape. Estes eventos, dizem os dois visitantes, “conseguem tornar acessíveis os grandes vinhos”, que, de outra forma, não teriam possibilidade de conhecer.
Fiéis do evento desde o primeiro ano – esta foi já a sexta edição no Rio e será a terceira em São Paulo – os dois irmãos contam que inicialmente tinham algum conhecimento do vinho português, que compravam “sobretudo nas viagens ao exterior, porque no Brasil o preço era ainda muito alto”. Agora, prossegue Emanuel, “temos a sensação que o preço está ficando mais acessível, embora os vinhos de alta gama ainda sejam caros”.
Apesar das taxas cobradas à entrada dos vinhos portugueses no Brasil continuarem muito elevadas – uma queixa que se ouve a todos os produtores aqui presentes – tem-se notado da parte de compradores como as grandes superfícies e as garrafeiras um esforço para passar a negociar directamente com os produtores, cortando os intermediários, o que pode justificar a redução de preço que Emanuel se refere.
O maior desafio dos produtores de vinho é aumentar a capacidade negocial
Este factor está a ajudar Portugal a aproximar-se do segundo lugar, podendo, se a tendência se mantiver, ultrapassar em breve a Argentina e ficando apenas abaixo do Chile na lista dos maiores vendedores de vinho ao Brasil.
O que é que Emanuel e Marta descobriram de novo, nestes anos de visitas ao evento? “Eu descobri o branco, que não conhecia”, confessa Marta. “Fizemos uma degustação maravilhosa, a grande batalha dos tintos, não sei qual a região mais maravilhosa”, diz, referindo-se à prova dirigida por Dirceu Vianna Júnior, que desafiou os enólogos presentes – David Baverstock do Esporão (Alentejo), Osvaldo Amado da Global Wines (Bairrada), Tomás Roquette, da Quinta do Crasto (Douro), e Sara Dionísio da Casa de Mouraz (Dão) – a defender cada um a respectiva região, apresentando argumentos para convencer a audiência de que é a melhor de Portugal.
No final, David Baverstock, que veio pela primeira vez ao Vinhos de Portugal (a aposta da organização é em ter cada vez mais produtores e enólogos pessoalmente no Brasil, permitindo o contacto directo com o consumidor final) declarava-se muito divertido com a experiência e, sorridente, prometia, para a próxima “preparar-se melhor” para enfrentar a veemência dos seus adversários.
O enólogo do Esporão considera que o conhecimento que os brasileiros têm dos vinhos portugueses “ainda não é famoso”, mas não tem dúvidas de que “querem aprender”, o que “dá trabalho, mas é muito interessante”. Já Luís Sottomayor, da Casa Ferreirinha, tem uma percepção diferente, sublinhando “a alegria e a curiosidade dos brasileiros a provar vinho”.
A cada viagem que faz ao Brasil nota “um maior conhecimento”. Os brasileiros, conclui, mantêm a mesma alegria, mas bebem com mais conhecimento”. Isso “nota-se nas perguntas que fazem e no estilo de vinho que querem provar” e se “há uns anos havia perguntas que uma pessoa ficava sem saber como reagir, hoje são perguntas com pés e cabeça”.
Os irmãos Emanuel e Marta confirmam que estes têm sido dias de descobertas. “As vinhas velhas, nossa, não conhecia”, destaca ela. O Dão foi outra das grandes surpresas, com as provas a desfazer totalmente a impressão de que este era “um vinho difícil de beber”. No final da conversa, Emanuel despede-se com uma convicção: “Se me perguntar onde estão os melhores vinhos do mundo, eles não estão na França, estão em Portugal e certamente, no meu entender, no Alentejo”.