Setúbal usa tambores para lembrar que “o rio é a nossa casa”
O cortejo emblemático e inclusivo do Festival de Música de Setúbal vai na manhã desta sexta-feira percorrer as ruas “roubadas” ao rio.
A 9.ª edição do Festival de Música de Setúbal (de 23 a 27 de Maio) volta ao tema “Sinta-se em casa” e vai acordar a cidade ao som de 800 tambores tradicionais e originais. “O cortejo parte do Cais 3, às 10h30, junto ao rio, e daí partirá para um desfile pelo centro da cidade, com término na Praça do Bocage”, explica o professor e músico Fernando Molina, que vai dirigir os participantes.
Esta “viagem musical” percorrerá as ruas por onde antes já correu o rio Sado e servirá para assinalar o início de mais uma edição de um festival que promove “a inclusão social pela música”. Objectivo desde logo espelhado na “participação mais empenhada e numerosa por parte da APPACDM [Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental] de Setúbal”, diz o coordenador desta performance e desfile de percussão, que foram reforçados em consonância com a realização do simpósio internacional Música, Saúde e Bem-Estar (que explora comunicações à volta de trabalho com idosos, pessoas com demência, sem-abrigo, refugiados e prisioneiros).
Música para todos
Segundo Fernando Molina, a “maré sonora que inunda a cidade proporciona um dos momentos mais exuberantes e coloridos deste festival”, e não quer deixar de frisar que só é possível “graças à dedicação e empenho de todos os professores envolvidos”. Para concluir: “É um evento pleno de alegria em clima de festa e de música para todos.”
Divertido, classifica-a como uma “bombalhada valente” que vai despertar a cidade. Entre tambores tradicionais, latas de conserva e baldes — reciclados, pintados e adaptados pelos alunos do concelho —, tudo servirá para marcar o ritmo da festa.
Quem quiser “fazer barulho” pode levar um instrumento de percussão, “clássico ou improvisado”, diz Molina, que convida todos a assistir ao concerto matinal dos BolSol, em que também participará, no cais, em conjunto com Nuno Carpinteiro (acordeão), Manuel Amarelo (trompete e flautas) e David (guitarra e cavaquinho). Um dos temas que destaca chama-se Círculo, que propõe uma dança de roda colectiva e feliz, “em círculo”.
Ao longo destes nove anos, 30% das crianças de Setúbal estiveram de alguma forma ligadas ao festival, informa o percussionista. “Já encontrei alguns adultos de gravata que me vêm lembrar que passaram pelas minhas mãos. Houve até quem se tornasse músico”, diz, entre o orgulhoso e o divertido.
Artistas aclamados juntam-se à comunidade
Para o director artístico britânico do encontro, Ian Ritchie, “o Festival de Música de Setúbal é um fenómeno cultural único e continua a reunir artistas convidados internacionalmente aclamados, de Portugal e do estrangeiro, com a comunidade local — envolvendo mais uma vez mais de 1500 jovens — a fazer música e a enriquecer a vida cultural desta linda cidade”.
O ex-cantor, barítono, destaca a abertura do festival, nesta quinta-feira à noite, “com a maravilhosa cantora Beatriz Nunes e o seu quarteto de jazz” (21h, Fórum Municipal Luísa Todi, com o Conservatório Regional e o Coro Infantil de Setúbal), “seguido no dia seguinte pelo reputado maestro Paulo Lourenço, com o Coro de Câmara da Escola Superior de Música de Lisboa” (sexta-feira, às 21h, Igreja de São Julião, Migrating Bird).
E lembra “como todos os artistas convidados vêm partilhar as suas competências e o palco com os jovens locais de Setúbal”. O mesmo se passará com a Orquestra Sinfónica Portuguesa, “num programa centrado em Gustav Mahler, juntamente com jovens instrumentistas da região de Setúbal e dirigidos pela maestrina Joana Carneiro” (domingo, às 21h, Fórum Municipal Luísa Todi, A Vida Divina).
Uma das originalidades e virtudes desta festa da música está relacionada com “o socialmente inclusivo e artisticamente aventureiro Ensemble Juvenil de Setúbal”, que, “no seu quinto ano de existência ininterrupta, junta-se a vários músicos do Reino Unido, incluindo o trompetista Clarence Adoo, paralisado num acidente de viação há mais de 20 anos, o trombonista John Kenny (juntamente com o seu carnyx — um antigo instrumento celta), o trompetista Torbjörn Hultmark e a cantora e compositora Merit Ariane”. Juntos, vão fazer-se ouvir no domingo, às 19h, no Fórum Municipal Luísa Todi.
O Festival de Música de Setúbal é apoiado por Helen Hamlyn Trust, pelo Município de Setúbal e, lembra o director artístico, “por muitos parceiros locais, instituições e indivíduos, cujas contribuições financeiras, tempo, esforço e empenho fazem com que tudo aconteça”.
Os concertos distribuem-se por espaços da cidade como a Casa da Avenida, o Salão Nobre dos Paços do Concelho, a Igreja de São Julião, o Museu do Trabalho Michel Giacometti, o Fórum Municipal Luísa Todi e o Palácio da Bacalhôa (Azeitão). A 1.ª parte do simpósio Música, Saúde e Bem-Estar realiza-se no Auditório da Escola de Hotelaria e Turismo de Setúbal (domingo, às 14h30). Sinta-se em casa.