Pode um restaurante abandonar o TripAdvisor? O tribunal decide
Restaurante espanhol pediu 660 mil euros de indemnização por não o deixarem sair da plataforma e pelos danos morais infligidos pelos comentários negativos.
Antigamente, gerir um restaurante exigia a escolha de um bom cozinheiro, a contratação de empregados de mesa competentes e a garantia da utilização dos melhores produtos na confecção dos pratos. Nos últimos anos, ter um restaurante passou a ser sinónimo de mais uma preocupação: a gestão da presença nas redes sociais. Para o bem e para o mal.
Em Valência, Espanha, uma empresa levou a tribunal o TripAdvisor, o maior site mundial de avaliações de locais turísticos. O motivo? O dono alega que não autorizou a plataforma a incluir o seu restaurante na base de dados da aplicação e que quando assumiu a gestão da página criada por um utilizador, não lhe foi garantida uma forma de apagar o perfil. Antonio Calero, proprietário do complexo Marina Beach Club, exige à TripAdvisor uma indemnização de 660 mil euros por “danos morais”, noticia o El País.
O restaurante do Marina Beach Club – ou “Tóxico Beach”, como o baptizou um cliente que acredita ter ficado indisposto depois de comer um tártaro no local – tem 3.5 pontos em cinco na plataforma. As queixas são recorrentes, algumas acusando os empregados de tratarem os clientes como se fossem “gado”, de “enganarem a Segurança Social” ou de terem “pessoal mal qualificado”.
“Não lhe parece grave que acusem o meu cliente de cometer delitos?”, questionou o advogado de Calero, durante o julgamento que se realizou em Barcelona. Bradford Young, vice-presidente da TripAdvisor, respondeu-lhe de forma serena com a ajuda de um intérprete. O homem de fato imaculado, como descreve o El País, argumentou que os comentários são controlados, mas só até certo ponto.
Existem dois filtros prévios aos comentários: um software e humanos, se alguma coisa falhar. “Recebemos milhões de comentários e sabemos os que são normais. Quando algum não o é, salta à vista. Assim podemos controlar a fiabilidade das opiniões e quais são fraudulentas.”, disse.
Posto isto, os comentários negativos ao Marina Beach sucederam-se e Calero reclamou o direito de gerir o perfil do seu restaurante. O TripAdvisor não verifica a veracidade dos comentários, apenas comprova que os estabelecimentos se tratam de “locais abertos ao público e que servem comida, num determinada localização”, afirmou o vice-presidente. Young sublinhou que o proprietário teria todo o direito a gerir a página do restaurante criada por um estranho, mas que encerrá-la não poderia.
Young explicou que se deixasse que os restaurantes deixassem a aplicação depois de estarem registados, estaria a atentar contra a liberdade de expressão. “Se não houver um perfil criado, um utilizador não pode dar a sua opinião nem partilhar a experiencia que teve desse lugar e isso é um direito básico”, notou. Uma das caras da empresa lembrou igualmente que estaria a limitar o “direito à informação” dos viajantes. E o mesmo disse sobre os comentários negativos: “Isto não são os anos 50. Não vamos calar uma pessoa só porque a sua opinião não agrada a um restaurante”.
O advogado, porém, entende as coisas de outra forma. “Se não te registas, dizem mal de ti. Se te registas, tens que ceder os teus dados e esforçar-te para provar que as criticas não têm motivo de ser”. “Somos trabalhadores forçados do TripAdvisor”, lamentou o advogado nas alegações finais do julgamento. “Porque tenho de estar todo o dia de olhos postos na Internet a ver se alguém disse que a minha comida era nojenta?”.
Para o dono do Marina Beach Club, deveria ser permitido sair do TripAdvisor e assim o problema estaria resolvido. Para a empresa norte-americana, mais do que tudo, trata-se de liberdade de expressão. Eis o poder das redes sociais.