E se o financiamento dos partidos servisse também para dar bolsas de estudo?
Deputado Paulo Trigo Pereira propõe a criação de um regime jurídico para as fundações e associações partidárias, que passariam a receber uma pequena parte (5%) do financiamento que os partidos ganham consoante o número de votos. Esse dinheiro seria para pagar bolsas de estudo, promover grupos de estudo ou debates – mas nunca para financiar as actividades partidárias eleitorais.
Se estivéssemos na Alemanha, a pergunta não faria o leitor franzir o sobrolho: todos os partidos alemães têm uma fundação ou associação que desenvolve projectos como a atribuição de bolsas de estudo em vários níveis de ensino, e que recebem para isso um financiamento estatal. É esse modelo que o deputado não-inscrito Paulo Trigo Pereira gostaria de ver replicado em Portugal, onde actualmente só se contam o Instituto Amaro da Costa, o Instituto Sá Carneiro e a Fundação Res Pública, ligadas, respectivamente, ao CDS, ao PSD e ao PS.
“A qualidade da democracia depende da qualidade dos partidos políticos e dos seus quadros. Os partidos são uma peça fundamental do sistema político e assumem-se como instrumento de participação cívica e eleitoral e até de transformação social. Em Portugal, alguns partidos criaram fundações e associações, mas não desempenham hoje as funções que deveriam e o seu financiamento é escasso”, descreve Paulo Trigo Pereira. O deputado, que foi eleito em 2015 pelo PS como independente e que deixou a bancada socialista em Dezembro, admite que se inspirou fortemente no sistema de funcionamento das fundações políticas alemãs – e que também existem na Áustria França, Espanha, Holanda, Suécia ou Brasil -, cujo financiamento é quase totalmente público, modelo que quer replicar.
Para isso, entrega nesta segunda-feira um projecto de lei sobre a criação de um regime jurídico das fundações e associações ligadas a partidos políticos. Propõe que, sem aumentar o financiamento público conjunto que já é atribuído anualmente aos partidos, seja criada e regulada uma subvenção pública geral para as fundações, que devem ter uma real e efectiva autonomia administrativa e financeira em relação aos respectivos partidos políticos.
Este subsídio geral seria calculado a partir da actual subvenção anual que os partidos políticos recebem por obterem mais de 50 mil votos nas eleições legislativas (correspondente a 1/135 do IAS e deduzida a redução permanente de 10%). Ou seja, em Outubro deste ano, cada voto irá representar para o respectivo partido um encaixe de 2,898 euros por cada ano da legislatura.
Se este regime estivesse em vigor, a fundação associada a cada partido receberia, em Janeiro do próximo ano 14 cêntimos por cada voto obtido nas urnas. Como se chega a este valor? O deputado não-inscrito propõe que 0,037% do valor por voto seja “desviado” do financiamento dos gastos correntes do partido para a formação – ou seja 5% do bolo total que o partido recebe. Só este ano, e sem contar com as campanhas eleitorais, o Parlamento vai pagar 14,4 milhões de euros em subvenções para os sete partidos representados no Parlamento e aos dois sem representação que tiveram mais de 50 mil votos em 2015 - PCTP/MRPP e PDR (de Marinho Pinto).
Segundo Trigo Pereira, para além da subvenção geral, as fundações partidárias poderão ainda receber financiamento directo e específico dos ministérios da Educação e Ensino Superior, por exemplo, para bolsas de estudo no ensino superior.
Este financiamento tem que ser exclusivamente afecto às actividades de ensino e formação das fundações, sendo proibido o seu uso para financiar directa ou indirectamente a gestão corrente do partido, campanhas eleitorais ou de referendo ou ainda outras associações ligadas ao partido. A violação desse princípio implica a devolução do financiamento já recebido e a proibição de se candidatar a este apoio durante os dois anos seguintes. Tal como o restante financiamento dos partidos políticos, também as fundações e associações partidárias passam a ser fiscalizadas pela Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.
Trigo Pereira realça que ao nível da União Europeia há um regime idêntico para as fundações políticas associadas aos partidos políticos europeus, e em 2018 receberam do orçamento geral da UE 19,8 milhões de euros.
O texto da proposta do deputado não-inscrito para um regime para as fundações estipula que estas têm como objectivo “contribuir para o esclarecimento plural e para o exercício das liberdades e direitos políticos dos cidadãos”; estudar e debate os problemas da vida política, económica, social e cultural (a nível nacional e internacional; “promover a formação e a preparação política de cidadãos” para participarem activamente na vida pública; “promover a formação dos membros do partido político ao qual estão associadas” e “contribuir para a promoção dos direitos e liberdades fundamentais e o desenvolvimento das instituições democráticas”.
A intenção, resume Paulo Trigo Pereira, é “alimentar” os partidos com competências técnicas nas políticas públicas, mas também com gente preparada para os “embates ideológicos e socioculturais que marcam a arena política e que requerem protagonistas capazes de defender e esclarecer acerca dos seus programas, filosofia e ideologia políticas”.
Para isso, podem organizar seminários, conferências e workshops, conceder apoios à investigação em temáticas relevantes para os objectivos programáticos dos respectivos partidos, fazer formação para os quadros e membros do partido.