Estão cravados numa ligeira encosta, protegidos pela sombra do arvoredo da montanha e refrescados pela água que vai jorrando serra abaixo. É o rio Gresso, que desce do cimo da serra do Arestal, a quase 800 metros de altitude, até ao rio Vouga. Diz-se (e com razão) que este é um dos rios de montanha mais bonitos do país. Repleto de cascatas e quedas de água, o Gresso é dono de uma paisagem muito particular. Parte dela decora um trilho de passadiços localizado em Sanfins, freguesia de Rocas de Vouga, município de Sever do Vouga.
Tem cerca de 1,5 quilómetros de extensão mas é apenas a amostra de um percurso, ao longo do rio, bem maior. Com essa garantia: o tamanho não retira valor aos passadiços do Gresso. Com um circuito circular, estendem-se ao longo de quatro pontes e algumas escadas em madeira (tudo somado, dá umas quantas subidas e descidas). Sem perder de vista (e do ouvido) as quedas de água do rio que deu nome a uma marca de lacticínios – a fábrica que mais tarde passou a adoptar a marca comercial Gresso foi instalada em Sanfins.
Os passadiços de Sever do Vouga resultaram de um projecto apresentado ao Orçamento Participativo local e são a prova de que os passadiços não se medem aos palmos, ainda que por ali ninguém se aventure a colocá-los no patamar dos trilhos dos municípios vizinhos de Arouca (passadiços do Paiva) e de Aveiro (passadiços de Esgueira). Mesmo sabendo-se que os do Gresso também não são os mais pequenos do país – os de Vila de Rei têm pouco mais de 500 metros. A perspectiva é que eles sejam encarados como parte integrante de uma proposta maior.
E foi o que a Fugas fez, à boleia de uma das caminhadas da Desafios – Desporto e Aventura para partir à descoberta dos passadiços de Sanfins, com direito a prosseguir caminho no sentido do rio. A proposta apresentada por esta empresa severense assenta num passeio de quase 12 quilómetros – com passagem por caminhos de asfalto, rurais, de montanha e florestais -, com direito a pausa para almoço.
Para os menos dados a caminhadas mais prolongadas, a sugestão poderá, então, passar por fazer o circuito dos Passadiços e complementá-lo com parte do percurso pedestre dedicado ao rio (PR10). O importante é ir, meter pernas ao caminho, e apreciar as piscinas naturais, as cascatas e as quedas de água daquele afluente do Vouga.
Sem nome, de beleza rara
Ao longo dos sete quilómetros de extensão do Rio Gresso há duas cascatas que se destacam. Uma abaixo de Sanfis e a outra a montante da ponte entre Sanfins e Mouta. Ambas de uma beleza rara, mas aparentemente sem nome. São as menos conhecidas de Sever do Vouga, terra da afamada Cascata da Cabreia – queda de água com 25 metros de altura –, e isso ajuda a torná-las ainda mais especiais. Será difícil encontrar alguém por ali, permitindo-lhe usufruir, com toda a calma, da paisagem verdejante que ladeia o rio. O único barulho que irá ouvir é o da água a cair nas rochas.
O percurso desenhado pela Desafios segue, depois, em direcção a Couto de Esteves, freguesia vizinha de Rocas do Vouga, ao longo de uma das levadas que acompanham o Gresso. “Ainda é muito usada no Verão para irrigar as terras de cultivo à volta”, destaca Bruno Costa, o guia que nos acompanha ao longo da caminhada. Noutros tempos, a água servia, também, para alimentar alguns moinhos, entretanto desactivados.
Esta parte do rio Gresso tem vindo a ser especialmente procurada para a prática de caminhadas aquáticas, modalidade pouco conhecida mas especialmente recomendada a quem gosta de acrescentar um pouco mais de aventura aos passeios na natureza. Conforme o nome indica, caminha-se ao longo do leito do rio, passando por pequenas cascatas e quedas de água, mas, aparentemente, sem doses extraordinárias de adrenalina. “É uma actividade de aventura e de risco controlado, que não obriga a uma boa forma física em geral nem a saber nadar”, assegura Bruno Costa.
O “ouro branco"
Ainda que grande parte do percurso seja feito junto ao rio, este trilho a ele dedicado não é feito só de paisagem e de cursos de água. Há pontos de passagem dignos de referência, pela história que ajudam a contar e pelo que representam para o município. É o caso da Quinta do Linheiro, pertencente à Fundação Bernardo Barbosa de Barros, onde se pode observar a dinâmica agrícola, com especial destaque para os mirtilos (Sever do Vouga reclama o título de capital nacional deste pequeno fruto e todos os anos promove uma feira a ele dedicada). Reza a história que foi nos terrenos da Quinta do Linheiro que foram feitas as primeiras experiências de introdução deste fruto no concelho.
Outros dos pontos de interesse deste roteiro reside na Cooperativa Agrícola de Sanfins, que conta a história do leite Gresso, que, no fundo, é parte importante da história do concelho. A produção de leite foi de tal forma importante para Sever do Vouga que até lhe chamavam o “ouro branco”. Foi ali que nasceram as duas mais antigas cooperativas de leiteiras do país, uma delas a Cooperativa Agrícola de Sanfins.
Oficialmente constituída em 1937 – ainda que a tradição dos lacticínios naquela pequena localidade remonte a 1803 -, passou a fazer parte, em 1962, da União de Cooperativas da Lacticínios de Entre Douro e Vouga; e, mais tarde, da LACTICOOP (1972) e da LACTOGAL (1996). A LACTOGAL utilizou a fábrica de Lacticínios da Cooperativa de Sanfins até Dezembro de 2008, altura em que mudou para uma fábrica nova, construída em Oliveira de Azeméis – a cooperativa ainda se mantém em actividade, mas com outros serviços.
Memórias de outros tempos que ajudam a explicar a aposta da Desafios em iniciar este périplo ao longo do rio Gresso, com uma curta visita ao Museu Municipal. É lá que está contada esta e outras partes da história do território que foi também um centro mineiro (minas do Braçal, da Malhada e do Coval da Mó).