Relação recusa recurso de autarca de Gaia no processo que visava o ex-adjunto
Tribunal diz que as expressões usadas por Bruno Santos no blogue Aventar “aceitam-se no âmbito da liberdade de criticar” e da “liberdade de expressão”.
O Tribunal da Relação do Porto considerou improcedente o recurso que o presidente da Câmara de Vila Nova de Gaia, o socialista Eduardo Vítor Rodrigues, apresentou no âmbito do processo que moveu ao ex-adjunto do gabinete de apoio à presidência, Bruno Santos, confirmando a decisão da primeira instância que mandou arquivar o processo.
Na origem do recurso - apresentado também pelo município, assistente no processo - está uma queixa-crime do autarca apresentada por Eduardo Vítor Rodrigues, em Outubro de 2016, contra o seu ex-adjunto, também militante do PS, por causa de um texto por este publicado no blogue Aventar com várias considerações críticas sobre a actuação do presidente da autarquia.
A queixa foi arquivada primeiro pelo Ministério Público e, mais tarde, pelo Tribunal de Instrução Criminal (TIC) do Porto. A Eduardo Vítor Rodrigues restava o Tribunal da Relação do Porto. Na sequência do recurso, constituiu-se como assistente, bem como o município de Vila Nova de Gaia, e pede a abertura de instrução, alegando que as afirmações “vertidas pelo arguido Bruno Santos no blogue afrontaram a honra e consideração de ambos os assistentes”.
O que Bruno Santos escreveu resume-se a meia dúzia de linhas. “São já muitos os exemplos na Câmara Municipal de Gaia de inaugurações de equipamentos fantasma – o actual presidente da câmara chegou a inaugurar maquetas – e promessas de realizações que nunca chegam a ver a luz do dia, a não ser nas páginas dos jornais”, escreveu. “A terceira maior câmara do país não pode ser gerida por um presidente de junta”, afirma o ex-colaborador numa alusão a Eduardo Vítor Rodrigues que, antes de assumir a presidência do município, liderou a Junta de Freguesia de Oliveira do Douro.
Considerando que “a câmara tem que ser comandada por alguém com estatura política e preparação estratégica que veja além da festa da broa e do porco no espeto”, Bruno Santos aludiu à promessa pós-eleitoral do autarca sobre o ensino gratuito do mandarim nas escolas públicas de Gaia e, a este propósito, acusa-o de ter preferido” financiar o Lancaster College, onde a classe alta aprende a língua de Sua Majestade com 75 bolsas de estudos”.
Embora considere “as expressões desvaliosas para o carácter e probidade morais do assistente”, o Tribunal da Relação diz que elas são aceitáveis “no âmbito da liberdade de crítica”, porque “não se destinam a atingir a vida privada do assistente, ou seja, não tem um cunho pessoal, destinam-se tão só ao recorrente enquanto presidente da Câmara de Vila Nova de Gaia”. Entende, por outro lado, que as “expressões configuram um juízo de opinião e não uma imputação de factos pessoais”.
O acórdão a que o PÚBLICO teve acesso refere que “o arguido não é jornalista de formação e, mal ou bem, trata estas questões como munícipe que tem um blogue. As expressões utilizadas são ainda uma manifestação de liberdade de expressão, como forma de criticar o funcionamento de uma instituição” e que a “conduta do arguido terá de ser aferida entre a protecção do direito à informação, num sentido do direito de crítica, mesmo que injusta ou não coincidente com a verdade”.
Para os juízes da segunda secção criminal do Tribunal da Relação, “a conduta do arguido não se afigura criminalmente censurável, não brigando com a honra e consideração pessoa decido ao senhor presidente da câmara”, um destacado dirigente do PS nacional e distrital.
O PÚBLICO pediu uma reacção a Eduardo Vitor Rodrigues, mas o autarca recusou falar.
No ano passado, o autarca foi condenado por difamação e injúria, na sequência de uma queixa-crime do seu ex-adjunto Bruno Santos, a quem Eduardo Vítor Rodrigues foi ainda condenado a pagar uma indemnização de 1200 euros. Em causa estava um texto publicado no Facebook no qual o autarca usava termos como “vigarista” e “corrupto” para atacar o seu alvo, dizendo que “o lugar dos lambe-cus oportunistas e desleais (…) é na rua”. E defendia que “os impostos (…) não podem pagar desleais massagistas de hemorróidas dos chefes”. Eduardo Vítor Rodrigues disse então que pretendia recorrer.