Cem dias de Bolsonaro no poder: chegada de brasileiros a Portugal continua a crescer

A presidente da Casa do Brasil em Lisboa diz que a nova vaga migratória é “muito diferente das outras, com um aglomerado de perfis” e que veio para ficar, para “construir aqui”.

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Miguel Manso

Na semana em que se assinalam os cem dias da tomada de posse de Jair Bolsonaro como Presidente do Brasil, a Casa do Brasil em Lisboa faz um balanço e indica que são cada vez mais os brasileiros, de todas as classes e perfis, que procuram “melhor qualidade de vida” em Portugal.

Muitos destes estão “bem informados e já com uma imigração planeada”, outros são atraídos por “contos” nas redes sociais sobre um “el dourado”, que não existe, conta a presidente da Casa do Brasil, Cyntia de Paula, explicando, em entrevista à Lusa, porque é que também os pedidos de retorno ao país de origem estão a crescer, como confirmam dados da Organização Internacional para as Migrações (OIM).

A presidente da Casa do Brasil disse que, sobretudo no último ano, iniciou-se uma nova vaga de imigrantes brasileiros para Portugal, que se acentuou no final de 2018 e início deste ano.

A responsável referiu que esta “é uma nova vaga muito diferente das outras, com um aglomerado de perfis” e que veio para ficar, para “construir aqui”.

No ano passado, só a Casa do Brasil em Lisboa atendeu 476 novas pessoas (estão apenas contabilizados os que procuram pela primeira vez a associação). Em 2019, desde Janeiro, tinham sido atendidas 278 novas pessoas, disse a responsável, que faz parte da associação desde 2012 e é presidente desde 2017.

Na história da imigração brasileira já houve momentos de muita afluência como o final dos anos 1990 e início dos anos 2000, recorda, reafirmando que neste momento “há uma chegada bastante expressiva”.

Perfis diversos

Esta nova vaga é composta por diversos grupos: pessoas com menos qualificações profissionais, um maior número de pessoas com mais qualificação, e muitos estudantes universitários, que já estavam a chegar desde 2009, mas que continuam a crescer, explicou.

Mas há também a introdução de uma nova comunidade: a dos aposentados. São pessoas que têm rendimentos próprios no Brasil e a possibilidade de ter agora em Portugal o visto para aposentado. E ainda uma classe mais alta, que dentro do bolo da nova chegada não é “tão representativa”, adiantou Cyntia de Paula.

Os mais representativos “são os profissionais mais qualificados, da faixa entre os 30 e os 40 anos”, acrescentou.

Dos que vão à Casa do Brasil, o motivo comum que os leva a deixar o país de origem é “a procura de uma melhor qualidade de vida”, assegurou.

“Desde a destituição da Presidente Dilma [Rousseff — que sucedeu a Lula da Silva na presidência do Brasil] que sentimos que há na população brasileira uma descrença muito ligada às questões económicas, como o desemprego, que cresceu nesse tempo e já vinha a crescer antes”, referiu também.

“E sentimos que há um descontentamento e uma incerteza do que vai ser o Brasil, no próximo mês, por exemplo. No próximo ano, então, a incerteza é muito maior”, acrescentou.

Por isso, chegam “com uma preocupação com melhor qualidade de vida, melhor oportunidade de trabalho, mas sobretudo de segurança”.

"Uma população que quer contribuir"

“Sentimos que é uma comunidade que vem, não só para trabalhar e mandar remessas para o Brasil, como acontecia no passado. Mas uma população que quer contribuir para Portugal, que quer aqui trabalhar, trazer os seus conhecimentos, aplicar aqui a sua profissão, investir, pequenos investidores, pequenos empresários — porque não só a classe alta faz investimento”, sublinhou Cyntia de Paula.

Ou seja, trata-se de uma comunidade que “veio para contribuir”, que pretende construir e trazer para Portugal as suas famílias.

“Sentimos já a chegada de famílias, o que revela um maior planejamento do processo migratório. Alguns até já vieram num passeio a Portugal antes, ou estudaram melhor o processo”, conta.

Mas, também “continuam a chegar alguns com menos conhecimento da situação, nomeadamente do problema da habitação nos grandes centros urbanos, que é uma das dificuldades novas que antes não se colocava tanto”.