Cientistas criam “transportadores” de medicamentos contra cancro com novos compostos

Os cientistas geraram em laboratório, a partir da síntese de moléculas derivadas de um composto orgânico, o aminoácido serina, lipossomas, pequenas vesículas esféricas que existem no organismo e que “transportam” por exemplo moléculas que propagam o sinal nervoso nas células nervosas

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Paulo Pimenta

Cientistas criaram em Portugal “transportadores” de medicamentos contra o cancro com compostos derivados de aminoácidos que foram testados com sucesso em culturas de tumores, foi esta segunda-feira divulgado.

O trabalho, cujos resultados foram publicados recentemente na revista científica Nanoscale, foi realizado por investigadores da Universidade do Porto e do Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia (INL), em Braga.

Em concreto, os cientistas geraram em laboratório, a partir da síntese de moléculas derivadas de um composto orgânico, o aminoácido serina, lipossomas - pequenas vesículas esféricas que existem no organismo e que “transportam” por exemplo moléculas que propagam o sinal nervoso nas células nervosas, sendo apontadas como um excelente veículo para a libertação controlada de medicamentos.

Na sua constituição natural, os lipossomas são formados por camadas de lípidos (que são igualmente compostos orgânicos).

Em vez de criarem lipossomas com lípidos, que “são caros e muitas vezes não são estáveis quimicamente”, os cientistas da Universidade do Porto geraram lipossomas com base em duas moléculas semelhantes aos lípidos, mas que são derivadas do aminoácido serina e mais versáteis, explicou à Lusa um dos investigadores, Eduardo Marques, que estudou a formação dos lipossomas.

Os lipossomas são “uma das estratégias para transportar” a “doxorrubicina”, medicamento usado na quimioterapia para tratar cancro da bexiga, da próstata e do sangue (leucemia) e que foi utilizado no estudo, acrescentou.

A partir das moléculas sintetizadas por uma outra equipa da Universidade do Porto, liderada pela investigadora Luísa do Vale, os cientistas verificaram que formavam lipossomas “estáveis e robustos”.

Um grupo de trabalho do Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia, coordenado pela investigadora alemã Jana Nieder, passou à aplicação prática, ao “encapsular” o medicamento anti-cancro “doxorrubicina” nos lipossomas (vesículas esféricas ou nanoesferas que são aquosas no interior) e testar o seu desempenho em culturas de células cancerígenas.

O resultado foi que os lipossomas se mantiveram intactos com a droga, penetraram nas células, libertaram o medicamento e mataram os tumores. O efeito do medicamento foi observado nas células devido às suas propriedades fluorescentes (as moléculas que o compõem emitem luz depois de serem excitadas com uma fonte de luz).

Em declarações à Lusa, Jana Nieder, que lidera o Departamento de Nanofotónica do INL, referiu que as vesículas esféricas permitiram que o medicamento chegasse “em grandes quantidades” às células cancerígenas, com a droga a ficar “confinada nas vesículas durante um período prolongado”.

Para a cientista, o método poderá ser usado no futuro como “uma estratégia” para eliminar cirurgicamente e “em segurança” os tumores malignos, “reduzindo drasticamente os efeitos secundários da quimioterapia”, que mata as células cancerígenas afetando as células normais, e “melhorando significativamente a qualidade de vida dos doentes”.

De acordo com o investigador Eduardo Marques, da Universidade do Porto, a “aplicação prática” dos lipossomas gerados em laboratório com novos compostos no transporte de medicamentos contra o cancro “deu resultados promissores”, mas foi um “pequeno passo”.

Numa próxima fase da investigação há que testar o efeito dos lipossomas com as moléculas derivadas de serina noutras concentrações e com moléculas adicionadas que os conduzam no organismo para atacar os tumores sem serem destruídos pelo caminho por macrófagos, células que protegem o organismo contra corpos estranhos. No final, o medicamento terá de ser libertado de forma controlada para ser eficaz.