Descoberta alga marinha capaz de limpar águas contaminadas

A alface-do-mar possui a capacidade de remover elementos tóxicos de águas contaminadas pelas actividades humanas. De rápido crescimento e acção, esta pode ser uma alternativa ecológica e sustentável para tentar travar os efeitos da poluição.

Alface-do-mar (<i>Ulva lactuca</i>)
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Alface-do-mar (Ulva lactuca) Bruno Henriques
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Alface-do-mar (Ulva lactuca) Bruno Henriques

A alface-do-mar (Ulva lactuca) pode ser uma nova solução económica e sustentável para a descontaminação das águas. Com uma média de remoção de metais pesados – como o mercúrio, o crómio ou o chumbo – de 73%, esta alga de rápido crescimento utiliza ainda o dióxido de carbono como fonte de carbono, reduzindo a pegada ambiental. Este trabalho de investigação conduzido pela Universidade de Aveiro espera agora que esta espécie de alga marinha seja cultivada em várias massas de água afectadas por níveis elevados de contaminação.

“As algas são uma alternativa eficiente para a remoção destes elementos [tóxicos] pois levam a uma elevada diminuição da concentração dos contaminantes num período curto de tempo, sendo uma metodologia mais económica e mais ecológica que os métodos clássicos que são menos eficazes e mais caros”, explica ao PÚBLICO Bruno Henriques, investigador do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM) e do Departamento de Química da Universidade de Aveiro.

Alguns dos principais contaminantes das massas de água como lagos e rios são o mercúrio, um metal tóxico para a saúde humana ou o cádmio, presente em fertilizantes. Os resultados da remoção dos metais pesados conseguidos pela alga foram de “98% para o mercúrio, 87% para o chumbo, 86% para o cobre, 77% para o níquel, 74% para o manganês, 72% para o crómio, 56% para o cádmio e 48% para o arsénio”, segundo o artigo científico publicado na revista Science of the Total Environment.

Uma alga com um “desempenho superior”

A alface-do-mar foi recolhida pela equipa multidisciplinar na Ria de Aveiro. Esta alga foi escolhida não só pelas suas já conhecidas capacidades de acumulação e tolerância aos metais pesados, mas também devido à sua ampla distribuição, o seu rápido crescimento e a sua resistência a altos níveis de salinidade. Esta última competência permite alargar as zonas em que esta alga pode ser cultivada. “Torna possível a sua [alface-do-mar] utilização em efluentes que também têm na sua composição elevadas concentrações de vários iões sem que tal situação seja causadora de morte da alga ou diminua de forma relevante a sua capacidade de remover os contaminantes”, nota o investigador português.

A sua capacidade de remover os metais pesados das águas contaminadas tem origem “num processo que envolve a adsorção, isto é, a ligação dos elementos potencialmente tóxicos presentes na água na superfície das algas, mas também a sua incorporação pela alga designada por absorção”, contextualiza Bruno Henriques. Esta acção simultânea de adsorção e absorção permite a esta alga incorporar nos seus tecidos os elementos químicos das águas, libertando-as de toxidades.

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Os investigadores Eduarda Pereira, Joana Almeida, Bruno Henriques e Paula Figueira Universidade de Aveiro

Estes elementos perigosos para a saúde humana e para o meio ambiente continuam a poluir as águas através de actividades humanas como a produção energética, o uso de pesticidas e fertilizantes ou as indústrias metalúrgicas. No entanto, a alface-do-mar não é a única alga com a capacidade de limpar águas contaminadas. “A alga vermelha Gracilaria gracilis ou a alga castanha Fucus vesiculosus são também capazes de remover elementos potencialmente tóxicos das águas, embora a Ulva lactuca tenha apresentado desempenho superior”, acrescenta o investigador da Universidade de Aveiro.

Cultivar para descontaminar

A equipa de investigação da Universidade de Aveiro, em cooperação com a Universidade do Porto e o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, observou ainda os benefícios desta alga dada a sua rápida actuação – quase metade da remoção dos elementos químicos ocorre nas primeiras 12 horas depois de a alga ser depositada – e crescimento. O “rápido crescimento destas algas contribui para que consigam remover os contaminantes em cada vez maior quantidade pois o aumento de massa traduz-se num maior número de locais na superfície aos quais estes elementos se podem ligar”, observa o investigador. Assim, a equipa de investigação pretende cultivar a alface-do-mar nas águas mais contaminadas.

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A alga Ulva lactuca pode permitir uma limpeza eficaz e ecológica das águas contaminadas Universidade de Aveiro

“As algas poderão ser cultivadas em locais muito afectados por descargas de elementos potencialmente tóxicos através da introdução da alga no local a descontaminar se as condições forem adequadas ao seu crescimento ou cultivando as algas num outro local e transportando estas para os locais a serem descontaminados”, sugere Bruno Henriques. Apesar da baixa exigência nutricional desta alga marinha, para que se desenvolva é necessário existirem condições específicas como o acesso a luminosidade.

As vantagens desta alga não ficam por aqui: os investigadores asseguram que também permite reduzir o teor de fosfatos e nitratos nas águas e diminuir a pegada de carbono. Agora, os investigadores ambicionam estudar os mecanismos por detrás da captação e acumulação destes elementos pelas algas e alargar este estudo a outro tipo de contaminantes. O rápido crescimento e actuação desta macroalga podem permitir uma limpeza eficaz, ecológica e económica das águas contaminadas por todo o país.

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