Marcelo preocupado com o “fechamento” dos partidos
Não são tanto as relações familiares no Governo que preocupam o Presidente, mas a tendência de os partidos, em alguns momentos, de escolherem apenas pessoas do seu núcleo duro: “os puros”.
O Presidente da República está preocupado com a tendência dos partidos para se “fecharem”, em momentos difíceis, sobre o círculo mais íntimo do seu líder. Não são apenas as relações familiares no Governo que o incomodam, mas a escolha sistemática de pessoas do núcleo duro do líder, em particular os amigos de infância e juventude ou aqueles com quem se partilham interesses económicos, aos quais se recorre para fechar o partido ou o Governo sobre si próprio.
“O problema grave não é das famílias, mas o fechamento dos partidos no núcleo duro do líder, nos puros. Se é família ou não, é secundário”, disse fonte próxima de Marcelo Rebelo de Sousa ao PÚBLICO, sublinhando que essa tendência não é exclusiva do PS, pois também já aconteceu em alguns momentos do PSD.
No actual Governo socialista, além das relações familiares, há amigos pessoais do primeiro-ministro – como Pedro Siza Vieira ou Eduardo Cabrita, ambos contemporâneos de António Costa na Faculdade. Na memória está ainda a contratação do “maior amigo” de Costa, Diogo Lacerda Machado, que não chegou a integrar o Governo mas foi o representante do Estado em várias negociações, como a privatização da TAP, para onde acabou por ser nomeado como administrador não executivo.
“O PS está a fechar-se, como o PSD nalguns momentos anteriores também se fechou”, acrescentou a mesma fonte, sublinhando que entre os sociais-democratas, mais do que relações familiares, são identificáveis proximidades da máquina partidária, interesses económicos e relações de amizade próxima.
Isso acontece sobretudo em momentos de combate, mas, no caso do actual Governo, a convicção em Belém é a de que António Costa vai fazer o mesmo se vier a formar um novo Governo. “Já fez as remodelações que tinha a fazer, vai manter os mesmos, à excepção de três ou quatro pastas: Educação, Ciência e talvez a Justiça. Não pode mudar mais nada”, diz a mesma fonte.
O Presidente da República tem desvalorizado a polémica desde a última remodelação governamental, quando Mariana Vieira da Silva, filha do ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, José Vieira da Silva, se tornou ministra da Presidência. Na altura, disse que o que estava em causa era “mérito próprio” e lembrou que a situação já existia na composição inicial do Governo. “Já naquela ocasião havia dois ministros que, pelo mérito próprio, sendo embora cônjuges, tinham assento no Conselho de Ministros [Eduardo Cabrita e Ana Paula Vitorino], e já havia um ministro e uma secretária de Estado que, pelo mérito próprio, eram pai e filha com assento em Conselho de Ministros [José António Vieira da Silva e Mariana Vieira da Silva, que agora passou a ministra]”.
Esta semana, depois de serem conhecidas outras nomeações de familiares de membros do Governo, como a nomeação da mulher de Pedro Nuno Santos, ministro das Infra-estruturas e da Habitação, para o gabinete do secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro (com quem já trabalhava há anos), Marcelo voltou a lembrar esse facto: “Aceitei a solução nomeada pelo Presidente Cavaco Silva (…) Depois disso, não nomeei nenhum outro membro do Governo com relações familiares, com exercício de funções no executivo e com assento em Conselho de Ministros.”
Com esta posição, resumia a questão das relações familiares ao elenco governativo e afastava todas as outras situações relacionadas com adjuntos, chefes de gabinete e afins. Mas nem por isso o PS lhe agradeceu, pelo contrário. Porfírio Silva, deputado e secretário nacional do PS próximo de António Costa, veio lembrar que o actual Presidente da República também é filho de um ex-ministro, sem dizer que isso aconteceu no anterior regime político.