Quando o mundo acabar, eu vou estar em Portugal

Entretanto, já enviámos dinheiro para Portugal, os bilhetes de avião para as férias da Páscoa estão comprados (com seguro) e dia 12, quando o mundo acabar, estaremos em Portugal, no conforto do lar e das nossas famílias, à beira-mar a assistir ao último pôr do Sol, não para nós, mas para os britânicos, entregues a si mesmo numa jangada de pedra.

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Reuters/PETER NICHOLLS

Mais uma semana decisiva, mais uma rejeição no Parlamento, ou nem isso em caso de derrota certa, e o adiamento do fim do mundo, desta é que é, para 12 de Abril, e o mundo já não acaba a 29 de Março apesar das mil promessas a pés juntos de Theresa May, primeira-ministra por enquanto e enquanto deixarem.

Não fosse o diabo tecê-las, e porque dia 29 vamos ao teatro, os bilhetes foram comprados com seguro em caso de cancelamento. Sim, eu sei, se o mundo chegar ao fim, as seguradoras acabam também, eu incluído e no além o dinheiro não vale nada. Mas é sempre bom sentirmos um conforto, um pouco de segurança, no coração, e por isso lá comprei os bilhetes com seguro.

Entretanto, já enviámos dinheiro para Portugal, os bilhetes de avião para as férias da Páscoa estão comprados (com seguro) e dia 12, quando o mundo acabar, estaremos em Portugal, no conforto do lar e das nossas famílias, à beira-mar a assistir ao último pôr do Sol, não para nós, mas para os britânicos, entregues a si mesmo numa jangada de pedra, não à deriva, mas a caminho de uma qualquer planície abissal no fundo dos oceanos.

De facto, e no meio desta confusão toda, a única boa notícia é podermos sair desta terra de doidos enquanto 12 de Abril não chega. 

Porque de pouco importa se o Reino Unido sai a 29 de Março ou a 12 de Abril quando a saída sem acordo continua a ser a única possível. E sim, se a União Europeia não receasse o não acordo, não teria havido lugar a qualquer prolongamento do prazo de saída. As duas partes precisam tanto uma da outra! E no entanto...

E no entanto ninguém se resolve, a Europa exige eleições, a Europa exige um novo referendo, a Europa manda e a Europa decide, mas os britânicos não querem e os britânicos não podem com outras vontades que não as suas e por isso dizem não, não e não e mil vezes não sem nunca se decidirem sobre aquilo que querem. Estão no seu direito, é o seu país.

Mas neste jogo da corda em que ninguém perde e ninguém cede a saída continua a ser a mesma de sempre, sem acordo, sem regresso, boa sorte e até qualquer dia.

12 de Abril calha a uma sexta-feira. Às 23h, o Reino Unido sairá oficialmente da União Europeia. Está bem pensado, para evitar uma desvalorização acentuada da libra e os mercados só abrem na segunda-feira. No entanto, o exército já há muito que se prepara para sair à rua. Sem acordo, é provável a queda do governo. Ainda ninguém sabe o que vai ser dos aeroportos e das fronteiras e se a coisa correr mal talvez esteja tudo fechado enquanto os britânicos atiram as mãos ao ar e fazem contas à vida. Mas o mundo não acaba e o país, afinal, não irá ao fundo apesar de há muito meter água.

Uma semana depois, e depois das férias, estaremos de volta e a casa, os empregos e a vida que Portugal não nos pôde dar estarão no mesmo lugar à nossa espera. Sim, a vida vai ficar mais cara e vai haver menos trabalho, mas isso é para os mesmos de sempre, os que votaram para sair, os que não vivem em Londres.

A esses, peço por favor que apertem os cintos de segurança e se agarrem ao lugar, vem aí uma tempestade. Ou se calhar ainda é a mesma tempestade de sempre e de há muito, a das suas vidas, agora mais violenta. 

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