Muito qualificados, muito machistas
Para quem acha que o feminismo é uma coisa ultrapassada – e curiosamente existe gente, incluindo mulheres, que pensa isso – os números mostram o quão longe estamos do objectivo da igualdade entre homens e mulheres.
Quando, na jorna, os proprietários rurais pagavam menos às mulheres do que aos homens, tinham o argumento da força física: em média, os homens são capazes de carregar mais cestos de uvas do que as mulheres. Davam mais lucro – mais quilos de fruta despachados – ao fim do dia.
Da jorna para as empresas com um nível de qualificação mais elevado perdeu-se o argumento da força física, manteve-se o machismo estrutural. Segundo os últimos dados, é precisamente nos níveis mais elevados que a disparidade salarial entre homens e mulheres aumenta. Os homens ganham cerca de mais 26,4% do que as mulheres, uma média de 670 euros a mais. A lei sobre a igualdade salarial entre homens e mulheres tem 40 anos – e, no entanto, é aqui que estamos. Para quem acha que o feminismo é uma coisa ultrapassada – e curiosamente existe gente, incluindo mulheres, que pensa isso – estes números mostram o quão longe estamos do objectivo da igualdade entre homens e mulheres.
Rosa Monteiro, a secretária de Estado da Igualdade, diz que isto não se resolve com uma lei. É evidente que não. Os patrões das empresas machistas arranjarão seguramente uma mão-cheia de argumentos para justificar os salários femininos mais baixos – devem ser todas, seguramente, piores profissionais.
A lei agora aprovada é imensamente cautelosa. Primeiro vai exigir às empresas uma política remuneratória que não discrimine e “assente em critérios objectivos”; depois as empresas têm de demonstrar à Autoridade para as Condições de Trabalho, aos tribunais, à Comissão de Igualdade, que não discriminam, a partir de queixas que lhes sejam feitas. O Ministério do Trabalho passa a apresentar estatísticas anuais sobre as diferenças salariais. Será pedido às empresas onde as desigualdades sejam reveladas que apresentem um plano de mudança.
O facto de o Governo ter tido necessidade de repetir uma lei que foi feita há 40 anos mostra como fomos capazes de conviver com a ilegalidade durante tanto tempo, muitas vezes encolhendo os ombros. A lei não vai mudar as coisas do dia para a noite, como assinala a secretária de Estado. Mas a igualdade nas empresas não pode demorar mais 40 anos a chegar.