Assim não, senhor Presidente
Senhor Presidente, é impossível conciliar duas perspetivas diferentes de Serviços de Saúde, a bismarquiana e a beveridgiana, uma financiada por seguros sociais de saúde e outra pelos impostos dos cidadãos, o que seria a quadratura do circulo.
Foi divulgado largamente nos media que o Sr. Professor iria vetar a Lei de Bases da Saúde, proposta pelo Governo, se tal não obtivesse um consenso alargado.
Não me vou debruçar sobre a legalidade desta atitude, pouca usual na nossa democracia, de influenciar desta maneira os eleitos pelo povo na Assembleia da República, por que para tal me falta o engenho e a arte. Vou apenas falar dos argumentos utilizados para rejeitar tal lei.
A lei mudaria de quatro em quatro anos conforme o PS estivesse ou não no governo da nação. Fraco argumento que é desmentido pelos factos, senão vejamos: a chamada lei Arnaut, votada apenas pelo PS, PCP, UDP, José Justiniano Pinto (independente), que o seu partido votou contra, esteve em vigor durante 11 anos (1979 a 1990). A revisão feita em 1990, com os votos do PSD, CDS, Carlos Macedo (independente), que previa o apoio ao “desenvolvimento do setor privado da saúde (...) em concorrência com o setor público”, durou 28 anos. Em aparte digo que foram suficientes para pôr o SNS no estado comatoso em que se encontra.
Chegamos assim à conclusão que o Presidente quer uma lei que continue a apoiar o desenvolvimento do sector privado, pois seria a única maneira de os partidos da direita a aprovarem.
Senhor Presidente, é impossível conciliar duas perspetivas diferentes de Serviços de Saúde, a bismarquiana e a beveridgiana, uma financiada por seguros sociais de saúde e outra pelos impostos dos cidadãos, o que seria a quadratura do circulo. E nem é o seguro social que a direita pretende, mas um sistema à norte-americana baseado em seguros privados que neste grande país deixam sem assistência 50 milhões de cidadãos.
Os deputados têm de decidir se querem um sistema universal, como foi o SNS de Arnaut e Mário Mendes que unificou a assistência com a previdência, ou se querem voltar ao tempo do Estado Novo com uma saúde para reformados e desempregados, com dificuldade de acesso e de baixa qualidade, e outra para a força de trabalho empregada que quanto mais dinheiro tiver mais saúde tem.
Lembre-se, Senhor Presidente, dos números vergonhosos de assistência que Portugal exibia nos tempos do "Estado Novo", com uma taxa de mortalidade infantil de 55 por mil nados, quando agora se discute se está entre 3,2 e 2,7%.