Governo cria apoios ao cuidador informal mas terá tudo de passar primeiro por projectos-piloto

Proposta estabelece dois tipos de cuidador, o principal e o não-principal. Prevê ainda criação de formação, do descanso do cuidador, assim como de um subsídio para alguns cuidadores.

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Nelson Garrido

Os ministros da Saúde e do Trabalho e Segurança Social apresentaram esta sexta-feira as linhas gerais da proposta de lei do Governo que cria apoios ao cuidador informal. Prevê a criação de formação, do descanso do cuidador, assim como de um subsídio para alguns cuidadores. Mas caso venha a ser a aprovada, a proposta de lei do Governo levará pelo menos um ano a chegar a todos o país. Todas as medidas terão de ser testadas em projectos-piloto, que irão cobrir cerca de 15% do território.

Apesar da expectativa que se poderá ter criado, a iniciativa apresentada não é um estatuto do cuidador informal. “Aprovar um estatuto era um pouco começar pelo tecto. Faz mais sentido que, na sequência dos projectos-piloto, se faça a consolidação da rede interministerial e nacional e depois talvez venha a ser interessante que se traduza na criação de um estatuto. Não nos parece necessário trazer essa formalidade”, disse o ministro do Trabalho e Segurança Social, José Vieira da Silva.

“O objectivo é criar condições para colocar no terreno em 2019 experiências e instrumentos, com uma cooperação clara entre [os ministérios da] Saúde e Trabalho e Segurança Social, para quando houver uma aplicação da lei, exista já experiência acumulada do que pode ser a rede de apoio ao cuidador. Valorizamos a existência de experiências-piloto”, explicou, referindo que várias das medidas que agora existem como o subsídio de reinserção social ou a rede nacional de cuidados continuados integrados começaram com projectos-piloto.

Se a proposta for aprovada, os projectos-piloto estarão no terreno durante um ano. E só depois avançará para todo o território nacional. Segundo dados de José Vieira da Silva, actualmente cerca de 230 mil pessoas recebem complementos de dependência, sendo este para já o universo de pessoas que possam precisar de um cuidador informal. Quanto aos projectos-piloto, adiantou o ministro, irão abranger 15% do território nacional.

Mas Vieira da Silva não adiantou um número concreto de pessoas a participar na experiência. “Os projectos-piloto terão uma relevância significativa do ponto de vista da dimensão. Procuraremos que tenham a colaboração das autarquias e que se situem em todas as regiões do país, tendo em atenção as características sociodemográficas e as diferentes respostas públicas que já existem no terreno, quer da Saúde quer da Segurança Social.

Dois tipos de cuidador

Na sua definição de conceitos, para o Governo a pessoa cuidada é aquela que precisa de cuidados permanentes por se encontrar em situação de dependência e para ser titular desta designação tem de receber uma destas três prestações sociais: complemento por dependência de 2.º grau, subsídio de assistência de terceira pessoa ou complemento de dependência de 1.º grau.

A secretária de Estado da Segurança Social, Cláudia Joaquim, explicou que a iniciativa do Governo define dois tipos de cuidador informal: principal e não-principal. Em qualquer um dos casos tem de ser familiar até 4.º grau da pessoa cuidada, seja em linha recta ou colateral. Mas para ser considerado cuidador principal, tem de “acompanhar de forma permanente e viver com a pessoa cuidada e não recebe salário por actividade profissional ou cuidados que presta à pessoa cuidada”. Já o cuidador não-principal “acompanha a pessoa cuidada de forma regular, pode não ser permanente, e pode receber salário por actividade profissional”. O reconhecimento do cuidador será feito pela Segurança Social, depois de apresentado requerimento.

A diferença de definição de cuidador informal, acrescenta a secretária de Estado, “está relacionada com as medidas de apoio” previstas para cada um dos casos. “Para o cuidador principal destaco três medidas: criação de um subsídio de apoio a atribuir mediante a condição de recursos - temos a percepção que podem estar mais expostos a um maior risco de pobreza, porque não há salário -, criação de medidas que facilitem a integração no mercado de trabalho quando cesse a função de cuidador e o acesso ao regime de seguro social voluntário para através do pagamento desta contribuição criar a sua carreira contributiva para efeitos de reforma. Haverá uma alteração ao código contributivo para se criar uma taxa específica de 21,4%.”

Mas o acesso a este subsídio não será na fase dos projectos-piloto. Vieira da Silva explicou que este apoio, cujo valor não foi quantificado, “só será uma realidade aquando da generalização da lei” a todo o território. “Não seria possível do ponto de vista legal instituir um subsídio no quadro dos projectos-pilotos. O que haverá são subsídios de acção social no âmbito dos projectos-piloto”, disse o ministro, acrescentando que estes testes “ajudarão a determinar o valor da prestação social que vier a ser dada”.

Já para os cuidadores não-principais não está previsto um subsídio de apoio. Para estes o Governo prevê medidas para que possam conciliar os cuidados que prestam com a sua actividade profissional e de continuidade ou reintegração no mercado de trabalho. Mas não houve indicação de que medidas podem ser estas.

Descanso para o cuidador

Ficará também, se esta for proposta aprovada, assegurado o descanso do cuidador informal, que tanto pode passar por períodos mais prolongados como descansos mais pontuais de uma manhã ou uma tarde. Nesta área, o Governo pretende socorrer-se de vários parceiros: a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, Instituições Particulares de Solidariedade Social, lares, autarquias e comunidade.

A secretária de Estado da Saúde Raquel Duarte explicou que entre as medidas que poderão avançar primeiro, caso a proposta do Governo venha a ser aprovada, estão a da formação em literacia e a do descanso do cuidador, divulgando uma medida que já existe e que tem sido pouco usada: o recurso à rede de cuidados continuados. “Das 4800 camas disponíveis, entre 2016/18 menos de 6000 pessoas usaram esta medida. Pretendemos criar quotas de vagas disponíveis nas unidades de internamento de longa duração e medidas de referenciação para garantir que as pessoas têm vaga e acesso à cama.

Esta quota definida é de 5% de camas nas unidades de internamento de longa duração, o que representa 250 camas. Raquel Duarte explicou que a medida “permitirá receber 2500 pessoas num ano, estimando que cada uma terá em média 30 dias de internamento anuais”. Número de camas que é insuficiente, reconhece, e por isso defende que os projectos-piloto serão fundamentais para testar outras alternativas, como lares e apoio domiciliária que permita que a pessoa cuidada fique em casa e o cuidador tenha o seu descanso. “Terá de ser encontrada em conjunto com as autarquias e a comunidade. Pretendemos arranjar resposta possível sustentável e possível de aplicar nas diferentes regiões.”

A ministra da Saúde Marta Temido adiantou que outra das medidas previstas neste pacote de apoio ao cuidador informal é a criação de “um contacto de referência, que será um profissional de saúde”. A mesma adiantou que será a experiência resultante dos projectos-piloto a determinar “qual será o melhor profissional para ser o contacto de referência”.

O documento juntar-se-á aos projectos de lei do CDS, entregues também esta semana no Parlamento, e do BE e PCP que já foram apresentados na generalidade no ano passado. Na comissão de trabalho já está criado um grupo específico que irá analisar com maior detalhe todas as iniciativas.

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