Bastonária dos enfermeiros: “Sabemos dos transtornos da greve mas o ónus da negociação está no Governo”

Ana Rita Cavaco terá perguntado ao secretário de Estado em que medida a Ordem dos Enfermeiros extravasou o seu papel enquanto associação profissional, mas diz que este não lhe soube responder.

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nuno ferreira santos

O secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Francisco Ramos, anunciou esta terça-feira que suspendeu relações institucionais com a Ordem dos Enfermeiros. Em causa estão as posições e declarações da bastonária sobre a greve em blocos operatórios. O PÚBLICO falou com Ana Rita Cavaco, que sublinha concordar com a greve em curso e com a sua forma de financiamento através de crowdfunding.

O Governo cortou relações com a Ordem dos Enfermeiros devido a declarações suas a propósito da greve nos blocos operatórios. Esta decisão dificulta um desfecho negocial destas greves cirúrgicas?
Eu não sei porque a negociação da carreira é feita com os sindicados e não com a Ordem. Aqui estão em causa questões da regulação deste título profissional, que interferem na vida diária dos doentes e dos enfermeiros e que não tem nada a ver com a 'greve cirúrgica' ou com a carreira. Uma das coisas em agenda esta terça-feira era a questão dos sistemas de informação. Os enfermeiros queixam-se, e muito bem, que passam muitas horas ao computador, a fazer registos duplicados e coisas que lhes retiram tempo para estar com os doentes. A Ordem investiu, inclusive financeiramente, no novo modelo, libertando-os mais para os cuidados directos aos doentes. Este trabalho está parado desde a mudança da equipa ministerial, bem como as substituições de enfermeiros que estão em baixa prolongada, ou daqueles que infelizmente faleceram. Está tudo parado. E puseram alguns temas em agenda que não têm nada a ver com as negociações. O que eu vejo pela reacção dos enfermeiros nestas últimas horas é que isto faz com que as pessoas fiquem ainda mais irritadas. E não faz sentido nenhum: nós continuamos disponíveis para cumprir as nossas competências como sempre temos feito. Quando exercemos cargos públicos, não há lugar para estados de alma nem questões pessoais.

A Ordem dos Enfermeiros é acusada pelo Governo de extravasar o seu papel enquanto associação profissional. Uma Ordem não é um sindicato. Quer comentar? 
Tive oportunidade de fazer essa pergunta hoje, olhos nos olhos, ao secretário de Estado. Não basta vir dizer e atirar para o ar, que extravasa a suas competências, sem concretizar. Ambos temos responsabilidade em cargos públicos, em níveis diferentes. O senhor secretário de Estado não me soube responder. 

Continua favorável ao prolongamento desta greve, apesar de todas as consequências, nomeadamente no adiamento de cirurgias?
Continuamos a apoiar esta greve, como temos feito sempre relativamente a todas as outras greves dos enfermeiros porque elas representam reivindicações justas. É evidente que sabemos dos transtornos desta greve mas o ónus da negociação não está nos enfermeiros que querem negociar, está no Governo que não consegue aproximar as posições em nada. Nas negociações com os sindicatos, a única coisa em que o Governo cedeu foi na criação da categoria do enfermeiro especialista mas, [esta medida] não tem impacto nenhum financeiro. Portanto, em termos de dinheiro, nem um cêntimo mais. E relativamente à idade da reforma também não. 

Concorda com o financiamento desta greve? Não acha que coloca em causa a credibilidade da classe?
Não. Até porque ouvi com atenção as dúvidas do senhor primeiro-ministro, que em 2013, para financiar a sua campanha à Câmara de Lisboa, utilizou exactamente a mesma plataforma — a PPL — para fazer uma angariação de fundos, e portanto ela é válida para toda gente. É uma plataforma transparente, como já várias pessoas vieram explicitar. Não podemos dizer que gostamos desse tipo de angariação de fundos quando nos dá jeito, e depois dizer que levanta dúvidas, até porque essa questão está ultrapassada.

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