"Estado não vai apoiar rendas em casas de luxo"

Ana Pinho, secretária de Estado da Habitação, está muito confiante no Programa de Arrendamento Acessível, em cujo decreto lei e respectivas portarias está agora a trabalhar. Diz que falta pouco para poder "desmistificar" o que tem vindo a ser dito sobre o programa.

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daniel rocha
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O gabinete da secretária de Estado da Habitação, Ana Pinho, está a trabalhar nos decretos-lei e portarias decorrentes das quatro autorizações legislativas que falta implementar para concluir a Nova Geração das Políticas de Habitação, o Programa de Arrendamento Acessível, a penalização dos prédios devolutos, as alterações ao regime de obras coercivas e a construção de habitação a custos controlados. Diz que haverá novidades ainda este mês de Fevereiro, para ver a funcionar nomeadamente o Programa de Arrendamento Acessível “no mais curto espaço de tempo”. E diz que ainda não perdeu nenhuma corrida, nem nunca falhou um prazo.

A necessidade de aumentar a oferta de habitação no mercado de arrendamento era uma das bandeiras deste Governo. A legislatura está a chegar ao fim e há cada vez menos casas: em 2013 eram 45 mil. Em 2018 eram 16 mil. Não sente que está a perder esta corrida?

Não. Estou em funções há um ano e meio, e neste espaço de tempo não só aprovámos a Nova Geração das Políticas de Habitação (NGPH), como temos 17 dos 21 instrumentos previstos já em vigor. Reerguer uma política de habitação que não tinha dotação orçamental nem nenhum apoio a programas habitacionais desde 2007 são coisas que levam tempo. O Estado não tem casas fechadas por seu belo prazer para abrir repentinamente. Envolve sempre uma obra. A captação de oferta privada, que pode ser ligeiramente mais rápida, também demora. Quando estiver em vigor o Programa de Arrendamento Acessível (PAA), a adesão ao programa vai ser progressiva dependendo da disponibilidade das habitações, ou porque terminaram contratos anteriores, ou porque foram feitas obras. E também é preciso divulgar o programa, conhecê-lo, acreditarem nele. Quando o programa estiver em vigor é que vai ser feito o trabalho de divulgação e desmistificação.

O anterior presidente do IHRU chamou ao programa de arrendamento acessível um “bolo rei só com favas” e disse que “quem aderir à renda acessível perde dinheiro, fica com renda limitada, não escolhe inquilinos e paga seguros”. Os benefícios fiscais são suficientes para convencer os privados?
O programa é de adesão voluntária. Nós estamos a trabalhar num programa que é atractivo para senhorios e inquilinos, e que tem obrigações para ambos. Os inquilinos, por exemplo, também terão de ter um seguro. Mas se achássemos que não ia funcionar, estávamos a trabalhar de forma inglória e ninguém o quer fazer.

A definição do valor da renda que vai ser cobrada parece ser crucial para captar o interesse dos proprietários. E isso já está definido, será 20% abaixo da mediana do preço médio cobrado pelo mercado do INE…

Há outros elementos. Os mesmos metros quadrados em sítios diferentes, com acessibilidades diferentes, com coeficientes de conservação diferentes têm necessariamente de ter valores diferentes. O preço não é uma ciência. Por isso qualquer fórmula vai ser sempre uma aproximação à realidade.

O valor patrimonial tributário (VPT) já devia reflectir muitas dessas questões, como a área, a qualidade do alojamento, a localização. E é um indicador que já é cruzado nas estatísticas do INE.

O VPT tem em linha de conta o que pode valorizar mais ou menos um alojamento em particular no mercado, mas há coisas que não tem em conta, como se o fogo está ou não mobilado, se a cozinha está ou não equipada, enfim, coisas muito importantes para o arrendamento e pouco ou nada importantes para o VPT. Procuramos, sobretudo, ir a coisas facilmente verificáveis e que não sejam alvo de disputa, porque isso vai influir no preço.

Como vai ser, então, apurado o valor de referência do Arrendamento?

O primeiro dos factores será necessariamente a área, mas até essa vai ser ponderada. O metro quadrado num T0 é sempre mais caro do que num T5. Por isso teremos factores de correcção que minimizem estas discrepâncias. Depois, teremos outras questões ligadas à qualidade do próprio alojamento, e que vamos poder verificar com a certificação energética, que é um bom indicador da qualidade de obras e acabamentos. Se o imóvel tiver uma boa classificação energética, o preço de arrendamento pode ser um pouco mais alto porque a família vai gastar menos em aquecimento, arrefecimento, iluminação. Outros ponderadores incluem se está mobilado, equipado, se tem garagem, se tem elevador, etc. O valor de referência de arrendamento é o valor apurado pelo PAA e não o valor apurado pelo INE. O valor do INE é a mediana dos preços de arrendamento para aquela localização no semestre anterior.

Foi o Governo que pediu ao INE para trabalhar em medianas e não em médias?

E é muito importante ter a certeza de que o apoio público vai estar na mediana dos preços e não na média. Porque é ao grosso da oferta que me estou a dirigir e não a uma média aritmética de valores influenciado por três ou quatro casos muito altos de rendas premium. Este programa orienta-se para a classe de rendimentos intermédios, da família corrente portuguesa que neste momento tem dificuldade em aceder ao arrendamento. Não vão haver subsídio do Estado a casas de luxo

Como garante isso?

A fórmula que está a ser trabalhada valoriza acessibilidade, equipamento, mobiliário, estacionamento, estado de conservação. Outras coisas que levam as casam a subir preços, como piscina, jardins privativos, e outros elementos deste género, nunca vão entrar para cálculo do valor de referência, e por isso o preço não sobe por isso existir. Ou seja, se um privado tiver de baixar 40 ou 50% da renda que poderia obter no mercado livre para obter um benefício fiscal abaixo disso, não vão obviamente pretender entrar no programa. É só fazer as contas.

O preço dos seguros também é importante. Como vai ser definido?

O PAA tem como objectivo ter rendas a custo mais baixo, mas também criar um microclima de estabilidade e segurança para os dois lados. Estamos a trabalhar na possibilidade de haver uma oferta de três seguros. Um, pago pelos proprietários, para cobrir o risco de incumprimento: se o inquilino deixar de pagar a renda, o seguro vai pagar ao proprietário, mas vai cair sobre o inquilino. O segundo seguro é pago pelo inquilino e visa cobrir quebra de rendimento. Sempre que há uma situação inesperada para o agregado, a ideia é dar um tempo para que o agregado se possa recompor. Aqui, o seguro paga uma percentagem da renda ao senhorio, e não vai pedir o dinheiro de volta ao inquilino. Estes seguros são obrigatórios para quem aderir ao programa. O terceiro seguro é um seguro de danos, para substituir a caução. Mas aqui pode ser facultativo.

No Alojamento Local foi exigido um seguro que não existe no mercado. Já tem garantias que estes vão existir?

Estamos a consultar seguradoras sobre este tema desde Agosto de 2017. Mas como é óbvio, elas também não criam os produtos sem verem o decreto-lei cá fora. Quando o decreto sair, as seguradoras criam o produto.

Quando é que acha que vai ter este programa a funcionar?

A autorização legislativa só foi aprovada em Dezembro. Agora entra em processo legislativo, vai a reunião de secretários de Estado, Conselho de Ministros, é publicado o decreto-lei, saem as portarias e está em vigor.

Quando?

Nunca falhei um prazo. Não vai ser agora [A autorização legislativa tem vigência de 90 dias. Termina antes do fim de Março].

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