Eurodeputados pressionam Mogherini para reconhecer legitimidade de Juan Guaidó
Declaração da Alta Representante da UE para a Política Externa foi recebida com elogios e críticas: houve quem aplaudisse a sua moderação e quem exigisse uma reacção mais assertiva em apoio do presidente da Assembleia Nacional da Venezuela.
Do Parlamento Europeu para a sede do Serviço de Acção Externa da Comissão Europeia, seguiu esta quinta-feira uma carta assinada por dezenas de eurodeputados, de vários partidos e nacionalidades, a exigir à Alta-Representante da União Europeia para a Política Externa, Federica Mogherini, um apoio explícito à proclamação do presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Juan Guaidó, que assumiu a presidência interina do país até à realização de novas eleições democráticas.
Como explicou ao PÚBLICO o eurodeputado social-democrata Carlos Coelho, um dos subscritores da carta, os parlamentares gostariam de ver uma reacção mais robusta da União Europeia em torno da iniciativa do jovem presidente da Assembleia Nacional (Guaidó tem 35 anos), que em frente a uma multidão em Caracas reclamou ter a legitimidade constitucional para substituir Nicolás Maduro como Presidente interino do país e dirigir um governo de transição.
“É essencial prevenir uma guerra civil e criar as condições para a realização de eleições livres e a recuperação económica do país. Houve uma declaração inicial muito afirmativa em relação à Venezuela, que foi divulgada pela União Europeia, mas onde não era feito o reconhecimento oficial da legitimidade de Juan Guaidó como presidente interino”, lamentou Carlos Coelho. Como dezenas dos seus colegas, o eurodeputado quer aumentar a pressão sobre a alta representante e vice-presidente da Comissão Europeia, pedindo-lhe para assumir uma posição mais assertiva e que vá mais além do texto do comunicado oficial emitido em nome dos 28 Estados-membros na noite de quarta-feira.
Nesse documento, a União Europeia exprime o seu “total apoio” às acções encetadas pela Assembleia Nacional, que considera a única instituição democraticamente eleita pelos venezuelanos e cujos poderes exigiu que fossem “imediatamente restaurados e respeitados”. O texto, que foi negociado com todas as 28 capitais da UE, exigia o respeito pelos “direitos cívicos, liberdade e segurança” de todos os parlamentares, e em particular do presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó. E lembrava que para a UE, “a violência ou excessivo uso da força pelas forças de segurança é completamente inaceitável”.
Ao contrário de Coelho, o eurodeputado socialista, Francisco Assis, considerou a posição assumida pela UE como “sensata e correcta". Sublinhou que o bloco europeu tem sabido responder com “firmeza e exigência” às diversas vicissitudes na Venezuela, defendendo intransigentemente a reposição do sistema democrático no país mas evitando uma “polarização excessiva” para impedir que a crise possa evoluir para um confronto armado. “Há aliás uma intensa actividade diplomática precisamente para evitar uma internacionalização do conflito,” cujas consequências poderiam ser muito nefastas, disse Assis.
Carlos Coelho considera que, perante os últimos desenvolvimentos em Caracas, a União Europeia perdeu uma oportunidade de afirmar a sua voz na comunidade internacional, acompanhando os países que imediatamente reconheceram a autoproclamação de Guaidó. “Cada vez mais países estão a reconhecer a Assembleia Nacional como interlocutor e Juan Guaidó como presidente interino do país”, sublinhou Coelho. “O regime, que há muito é uma ditadura, não tem um resquício de legitimidade desde a farsa da Assembleia Constituinte e do circo das últimas eleições presidenciais”, afirmou.
O social-democrata lembrou que no Conselho Europeu o apoio às forças democráticas da Venezuela “sempre foi matéria consensual” e que os 28 sempre mostraram uma frente unida na denúncia da degradação democrática, da destruição económica e da crise humanitária do país. Por isso estranhou o argumento invocado esta quinta-feira pela porta-voz de Mogherini, de que institucionalmente o reconhecimento de Juan Guaidó compete aos chefes de Estado e governo nacionais e não à União Europeia (que não é um Estado). “Parece uma forma de exportar responsabilidades para os Estados membros”, observou.
Mas Francisco Assis compreende as cautelas dos europeus, e revê-se nos apelos tanto do Governo português como da UE para a realização de eleições livres como a única forma para ultrapassar a crise. Notando que os acontecimentos na Venezuela provam que o regime do Presidente Nicolás Maduro está “num estertor total”, “esgotadíssimo” e isolado, o socialista aponta para um “risco de confronto muito claro e muito preocupante” e que será tanto maior quanto mais acossado se sentir o núcleo duro do poder militar que sustenta o governo de Maduro.
“Aquilo já não é um Exército, é uma guarda pretoriana”, distingue Assis, que no entanto não desvaloriza o perigo de uma acção desesperada do regime que resulte num banho de sangue. Porém, o eurodeputado está convencido que com uma “pressão tão grande da população venezuelana e da comunidade internacional, o regime acabará por ceder”.