Invenções para resolver os problemas do dia-a-dia
Robôs humanóides, casas inteligentes, carros conectados. A maior feira de electrónica do mundo oferece uma visão de um futuro em grande. Mas há muitas pequenas empresas a tentar tornar mais fácil o dia de amanhã.
Muitos gigantes da tecnologia usaram o arranque da CES, a grande feira de tecnologia de Las Vegas, para anunciar um futuro “revolucionário”, cada vez mais conectado e com máquinas mais inteligentes.
A Samsung apresentou uma gigantesca televisão de 219 polegadas. A LG voltou a pôr em palco um sofisticado robô humanóide, criado para ajudar em tarefas domésticas. A Bosch mostrou como a sua tecnologia pode ser usada em todo o tipo de equipamentos interligados, de carros a cortadores de relva. Enquanto isso, pequenas startups demonstraram que a tecnologia também resolve problemas simples: lavar os dentes em segundos, ensinar crianças a usar o dinheiro ou medir uma parede antes de comprar um sofá.
Na CES, foram destacadas 12 startups de entre 1200 que estão no Eureka Park, o espaço da feira dedicado às empresas emergentes. A vencedora recebe um espaço de maior destaque no evento, que prevê acolher até ao final da semana mais de 180 mil participantes.
Este ano, a distinção nas startups foi para a Moasure, que desenvolveu um dispositivo que cabe na palma na mão e que tem um apenas botão. O Moasure mede perímetros, volumes, áreas e ângulos de objectos ou de espaços, através dos movimentos do utilizador que o segura. Basta, por exemplo, que o utilizador leve o aparelho de uma parede até outra para medir o comprimento daquela divisão. Mesmo que seja preciso fazer um desvio pelo meio (para contornar um móvel ou mesmo passar por uma divisória), o aparelho mede a distância em linha recta entre os dois pontos. As medições são registadas no telemóvel.
Já a americana FenSens pretende mostrar que a tecnologia para estacionar um carro com a ajuda de um assistente digital pode funcionar em qualquer veículo, e não apenas em carros de gama alta, equipados com dispositivos sofisticados e que têm um preço a condizer.
A startup criou uma moldura que é colocada em redor da matrícula e tem pequenas câmaras e sensores. Este é dos poucos casos em que usar o telemóvel pode ajudar à condução: os sensores estão ligados aos smartphones dos condutores e auxiliam no estacionamento. Em caso de assalto, o aparelho também funciona como um localizador e, em algumas cidades dos EUA, os sensores podem ser usados para pagar a taxa de estacionamento do parquímetro mais próximo.
O preço do FenSens ronda os 130 euros. “O nosso objectivo é mostrar que a tecnologia dos carros novos está acessível a todos, ao utilizar os smartphones que muitos já temos nos bolsos”, destacou o fundador, Andy Karuza. “Antes da tecnologia de condução autónoma, que vai chegar, mais ainda vai demorar alguns anos a popularizar-se, há outros problemas que temos de resolver.”
A QT Medical, também dos EUA, trouxe um aparelho que permite fazer um electrocardiograma caseiro — com a mesma precisão de um exame médico, afirma a empresa.
O aparelho foi criado pelo médico cardiologista Ruey-Kuang Cheng, que gere a divisão de pediatria do posto médico da Universidade da Califórnia em Los Angeles. Tem o selo da Food and Drugs Administration (FDA), a entidade que regula o uso de dispositivos médicos daquele país. “Contrariamente a outros produtos regulados pela FDA, como é o caso do Apple Watch, o nosso aparelho tem vários sensores. Isso quer dizer que tem mais precisão”, argumentou Ruey-Kang Chang. Para o usar, são colocados dez eléctrodos sem fios em zonas específicas do corpo e a informação é enviada para um médico para ser analisada.
Cheng diz que a tecnologia pode ser usada, por exemplo, para ajudar trabalhadores e enfermeiras em centros de dia a detectar problemas de saúde em utentes.
Apesar do potencial, vários médicos têm vindo a alertar que a medição num contexto informal (como a que é feita através de relógios inteligentes e pulseiras desportivas) pode levar a um aumento da ansiedade dos utilizadores que têm dificuldades em interpretar os resultados.
Um anel que é um rato
Numa altura em que o rato do computador celebra cinco décadas, a proposta da Padrone, uma startup Suíça, é substituí-lo por um anel. O pequeno aparelho utiliza realidade aumentada e câmaras. Permite aos utilizadores controlar o cursor no ecrã, através de movimentos com a mão sobre a secretária, ou outra superfície, de uma forma semelhante ao que aconteceria com um rato de plástico e metal.
Para o futuro, a equipa tem planos para desmaterializar também o teclado — o que acabaria com os problemas do chá quente entornado em cima das teclas.
O dinheiro físico também está a desaparecer, com cada vez mais crianças a crescer num mundo em que tudo se paga com um cartão ou com o telemóvel (quando não é o frigorífico inteligente da LG a encomendar leite).
Com isto em mente, uma equipa de programadores londrina criou um mealheiro electrónico, a que chamou Pigzbe, para ajudar crianças a compreender o conceito cada vez mais abstracto do dinheiro. Não tem notas lá dentro, mas as crianças podem acumular pontos ao jogar jogos didácticos que as ensinam sobre o mundo financeiro.
“Há quem nos critique, porque estamos a transformar o mealheiro tradicional em algo perverso, e a ensinar as crianças ‘cedo de mais’, mas a nossa investigação mostra que os hábitos financeiros se ganham aos sete anos”, disse o fundador Filippo Yacob. Não é a primeira vez que Yacob usa brinquedos para ensinar conceitos abstractos às crianças. Quando se tornou pai, inventou o Cubetto, um robô de madeira para ajudar crianças com três anos as bases da programação.
Cápsulas de água
Com os olhos num futuro mais sustentável, a startup Mitte quer convencer os visitantes da CES a comprarem menos garrafas de água. Enquanto a LG apresentava uma máquina que permite fazer cervejas com cápsulas (ao estilo das máquinas de café e aproveitando a moda da cerveja artesanal), esta empresa alemã propôs uma máquina para purificar e personalizar água da torneira com cápsulas que dão minerais diferentes.
“Queremos que as máquinas de água sejam vistas da mesma forma que as máquinas de café expresso”, disse aos jornalistas Karan Sarin, responsável pelo marketing da equipa.
O maior objectivo é parar o desperdício enorme que as garrafas de plástico geram. Há três cápsulas diferentes à escolha, com diferentes minerais e diferentes níveis de pH, tal como a águas minerais engarrafadas.
Durante a apresentação das 12 startups, foram ainda mostrados auriculares para proteger os ouvidos, sensores para medir a temperatura corporal de mulheres a tentar engravidar, programas de gestão de trânsito e um programa de computador que monitoriza estragos causados por tempestades e outros desastres naturais e que ajuda os afectados a interagir com seguradoras.
A startup Waverly Labs também voltou a subir a palco, depois de já ter marcado presença na CES em anos anteriores. A empresa desenvolve auriculares inteligentes que traduzem automaticamente a conversa de outra pessoa directamente ao ouvido do utilizador. É o tipo de tecnologia em que gigantes como a Microsoft e o Google também estão a trabalhar.
Apesar de não ser eleita a vencedora, a startup que mais atenção gerou do público foi a Y-Brush, um projecto francês que criou um aparelho (cujo aspecto faz lembrar uma dentadura) para ajudar as pessoas a lavar os dentes em apenas dez segundos. Pode ser usado por qualquer pessoa, mas um dos objectivos é sobretudo facilitar a higiene dentária a crianças com deficiências e a pessoas idosas que tenham dificuldades em fazer uma escovagem tradicional.
A empresa diz que o resultado é idêntico ao de uma limpeza profissional num dentista. Basta colocar o aparelho na boca e carregar no botão de começar.
O PÚBLICO viajou a convite da CES