Livrar de livros antigos e receber outros novos (usados)
Uma plataforma portuguesa de doação de livros gratuita quer aproximar os jovens dos livros e da leitura. Para entrar no "movimento de partilha" basta fazer um registo no site e combinar uma troca ou doação para virar a próxima página.
Quem quiser livrar-se do pó nas prateleiras tem agora uma nova forma de doar livros — e, quiçá, devorar um novo, usado. Chama-se Livrar e é o último dos três pilares do Cultura para Todos, um dos projectos vencedores do primeiro Orçamento Participativo Portugal, a ganhar forma, mais precisamente numa plataforma online.
Nela, qualquer pessoa pode trocar livros que estejam arrumados a um canto, sem uso, por outros que despertem mais interesse a quem ainda não os leu. Basta, para isso, registar-se no site, lançado esta quinta-feira, 13 de Dezembro, e inserir os títulos que se querem doar. Ou, então, pesquisar pelos livros que se gostaria de receber e entrar em contacto com quem estiver a tentar livrar-se deles.
Com uma ressalva: nos primeiros 15 dias após um título ficar disponível, apenas as bibliotecas registadas (públicas, privadas, escolares, entres outras) podem pedir para o receber. Findo esse período, o volume fica acessível a todos e é o seu dono que decide a quem dar. Os livros não podem ser vendidos e, por isso, todo o processo é gratuito, exceptuando possíveis custos de envio se assim for acordado entre as duas partes.
O “movimento de partilha” arrancou “de forma espontânea” com João Gonçalo Pereira e Tiago Veloso, quando os dois amigos lisboetas decidiram tentar a sua sorte na primeira edição do Orçamento Participativo Portugal. Recém-licenciados, João em Ciência Política e Tiago em Administração Pública e Politicas do Território, os jovens cruzaram caminhos no associativismo académico e na Juventude Socialista e repararam que "o acesso à leitura não era verdadeiramente democrático", conta o primeiro ao telefone com o P3. Quiseram assim arranjar uma forma de facilitar o contacto entre bibliotecas com acervos pouco diversos e pessoas que, por exemplo, tenham herdado uma colecção de livros de História.
Em 2017, o concurso disponibilizou três milhões de euros para projectos apresentados por cidadãos nas áreas da cultura, agricultura, ciência, educação e formação de adultos. “E, para nossa surpresa, ganhámos”, ri-se João Gonçalo, que aos 27 anos trabalha na Junta de Freguesia da Ajuda.
Na altura, a dupla propôs que o programa se focasse na “doação de livros em boas condições por parte de pessoas singulares a bibliotecas públicas” e que, em troca, os doadores recebessem “um vale para a compra de um livro numa livraria”. “Assim, é incentivada a leitura e compra de livros, bem como a doação de obras às bibliotecas”, escreveram, na proposta que acabou por somar 6614 votos. Desta primeira ideia, o programa evoluiu para a plataforma Livrar com a ajuda do actual gestor do projecto, o Gabinete de Estratégia Planeamento e Avaliações Governamentais (GEPAC). Ângela Ferreira, secretária de Estado da Cultura, inseriu o primeiro livro esta manhã: O Conde d'Abranhos, obra póstuma de Eça de Queirós que inclui ainda o conto A Catástrofe. “Um livro lido por muitos olhos será, seguramente, mais útil", salientou, apelando à adesão de bibliotecas e leitores.
Antes do novo site, que assinala a conclusão do Cultura para Todos, com um investimento global de 200 mil euros, foi lançado em Abril o És. Cultura'18, uma acção que promove o acesso gratuito a espaços e eventos culturais aos jovens residentes nascidos em Portugal em 2000. Até agora, “mais de 2300 jovens usufruíram desta iniciativa” e o governo está a considerar prolongá-la além de Abril de 2019, “apostando, assim, na formação de novos públicos”.
O Repositório Nacional de Objectos em Formatos Alternativos, que facilitou o acesso a livros e documentos em braille para cegos, foi outra das partes do projecto que quis levar a cultura a todos.