Portugal forçado a manter almofada financeira confortável
Para proteger o país contra futuras crises no mercado, ao pagamento antecipado da dívida do FMI continua a estar associada a obrigação de manter um excedente de tesouraria que dê mais confiança aos investidores.
A manutenção nos cofres do Estado de uma almofada financeira significativa é uma das condições para que Portugal possa, até ao final do ano, amortizar na sua totalidade o empréstimo concedido pelo FMI.
Na negociação com as autoridades europeias sobre a autorização que estas precisam de dar aos pagamentos antecipados de Portugal ao Fundo ficou previsto que, à semelhança do que já tinha acontecido no passado, o Estado português continue a contar com um excedente de tesouraria equivalente a 40% das necessidades de financiamento previstas para os 12 meses seguintes, apurou o PÚBLICO. A autorização só será aprovada oficialmente durante a próxima semana.
O objectivo da imposição desta almofada é que Portugal fique mais precavido contra a ocorrência de choques que dificultem o acesso do país ao financiamento de mercado. Pela negativa, a manutenção de excedentes de tesouraria elevados forçam o Estado a emitir mais dívida do que a estritamente necessária e a ter de suportar os seus respectivos encargos.
De acordo com as últimas estimativas apresentadas pela Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública - IGCP, o Estado deve acabar este ano com uma almofada de 7900 milhões de euros, um valor que corresponde a 51,6% dos 15.300 milhões de euros de necessidades de financiamento previstas para 2019.
Na gestão da sua dívida pública, o Estado continuará assim com uma margem de manobra relativamente reduzida para baixar o nível da almofada financeira que tem de manter, o que, constituindo um sinal de confiança para os investidores, tem também como consequência que o valor da dívida se mantenha a um nível mais elevado. O IGCP antecipa que, apenas a partir 2021 se registe um regresso da almofada aos níveis mais baixos existentes antes da crise.
Na quarta-feira, na conclusão do debate parlamentar sobre o OE 2019, o primeiro-ministro anunciou que Portugal irá pagar, até ao final do ano, os cerca de 4700 milhões de euros que ainda deve ao FMI. Esta sexta-feira, no comunicado com que concluiu a visita da missão de avaliação pós-programa ao país, o próprio Fundo confirmou esse pagamento, dizendo que esse passo irá reforçar a confiança dos investidores no país e representar uma nova poupança com juros, uma vez que o Estado pode neste momento substituir esta dívida por outra, emitida nos mercados a taxas de juro mais baixas ou prazos mais alargados.
Com o empréstimo todo pago, Portugal irá deixar de estar sujeito a relatórios semestrais de análise à economia no âmbito da avaliação pós-programa do FMI. As equipas do Fundo continuarão contudo a visitar Portugal de seis em seis meses, uma delas no âmbito da avaliação anual do artigo 4.º e a outra para um assegurar um acompanhamento regular, como acontece com a generalidade dos países. As avaliações pós-programa das autoridades europeias mantêm-se.
No comunicado emitido esta sexta-feira, o FMI reviu a sua estimativa de crescimento para este ano de 2,3% para 2,2% e manteve a sua projecção de um abrandamento progressivo da economia portuguesa nos anos seguintes, com uma queda da variação do PIB para 1,8% já em 2019 e, depois, até aos 1,4% no médio prazo.
O FMI reafirma assim a sua convicção de que Portugal não conseguirá sustentar um nível de crescimento semelhante aos dos últimos anos, já que este está acima do seu potencial.
A Comissão Europeia, que também concluiu esta sexta-feira a sua missão de avaliação pós-programa também defendeu esta ideia, afirmando que "o crescimento económico deverá moderar ainda mais ao longo dos próximos dois anos, reflectindo uma conjuntura mais fraca para os principais parceiros comerciais de Portugal, bem como um PIB potencial baixo, limitado por rigidez estrutural na economia portuguesa".
Para as finanças públicas, o FMI identifica consequências rápidas deste abrandamento económico. Dado que prevê um crescimento de 1,8% em 2019, contra os 2,2% em que se baseia o OE, o FMI acaba por antecipar um défice em 2019 de 0,4%, acima dos 0,2% estimados pelo Governo.
E reafirma, à semelhança da Comissão Europeia, o apelo para que Portugal vá mais longe na redução do défice e da dívida. “As condições favoráveis actuais fornecem uma oportunidade para antecipar a consolidação orçamental plurianual prevista no Programa de Estabilidade do Governo, acelerando deste modo a redução da dívida”, diz o comunicado.