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As contas da Web Summit que ficaram por fazer

Ainda não se sabe ao certo quem vai pagar os 11 milhões anuais, pagos como uma espécie de patrocínio, e nunca se vai saber como é que o dinheiro é usado. Para todos os efeitos, até podemos estar a pagar o salário de Paddy Cosgrave.

Com a permanência da Web Summit em Lisboa até 2028, quando se pensava que iria de malas aviadas para Valência ou Berlim, esta assume uma estratégia de ligação automática da feira de tecnologia a uma cidade — neste caso, a capital portuguesa —, tal como acontece em vários outros grandes acontecimentos. E o casamento com Lisboa é de tal comprometimento que até inclui uma cláusula que implica o pagamento de 340 milhões de euros por ano em caso de divórcio.

Em troca, recebe o quê? Votos de apoio político e respaldo institucional, a garantia de aumento da capacidade da FIL no Parque das Nações, e dinheiro. Neste último caso, ainda há contas por fazer, quando tudo devia ter ficado claro no dia do anúncio, de forma proactiva. Se o dinheiro é público, há que dar contas do seu destino. Não é por nada de especial, e só mesmo porque é assim que tem de ser numa democracia como a nossa.

Até aqui, a despesa com este evento era de 1,3 milhões de euros por ano, valor que passa para 11 milhões de euros a partir do ano que vem. Isso equivale a um aumento da factura superior a oito vezes, ritmo a que o evento não irá certamente crescer. Estamos a pagar mais pela companhia da Web Summit? Sim, estamos. É proveitoso? Calculo que sim, porque facilmente o retorno directo e indirecto na economia é superior (há dados divulgados pelo Governo que apontam para receitas fiscais de 30 milhões, mas sem que se saiba como é que o cálculo foi feito). Vale a pena discutir estes números? Obviamente que vale, tal como vale a pena saber quem paga o quê, e se é possível saber como é que o dinheiro é usado.

Para já, quem paga é o Turismo de Portugal, a AICEP, e o Fundo de Desenvolvimento Turístico de Lisboa, e, embora se desconheça quem paga exactamente o quê, diz o Governo — depois de questionado —, não há grandes diferenças entre organismos. Está-se agora a estudar a participação de uma quarta entidade, o que viria aliviar as contas individuais do bolo dos 11 milhões.

Sobre a forma como o dinheiro é usado parece que não há nada a fazer. A partir do momento em que é atribuído, como se fosse um patrocínio — e a maior parte é em dinheiro “vivo”, além da prestação de serviços —, perde-se o seu rasto. Para todos os efeitos, até podemos estar a pagar o salário de Paddy Cosgrave. E isso é assim neste caso como noutros eventos, sejam eles do desporto ou da área médica.

Há, aliás, uma equipa específica do Turismo de Portugal cuja missão é trazer grandes acontecimentos e congressos para Portugal, privilegiando os que trazem maior número de pernoitas quanto aos participantes e dando apoios financeiros (embora a uma escala muito menor, uma vez que em 2017 foram apoiados 61 eventos, incluindo aqui a Web Summit, e gastos 850 mil euros).

Para entrar na primeira liga dos eventos, é natural que a FIL tenha de se expandir, tal como se pretende fazer agora à boleia da Web Summit. Neste momento, os quatro pavilhões (a Web Summit usa também a Altice Arena) permitem ocupar uma área de 40.000 metros quadrados, quando o salão automóvel de Frankfurt, apenas para dar um exemplo, tem cerca de 200.000 de área de exposição. E uma das grandes vantagens para as contas do turismo, com o aeroporto em sobrecarga, é a de colocar grandes eventos como o da Web Summit fora da época alta. Já fora de Lisboa será mais difícil, com a descentralização a ser mais facilitada em encontros de média dimensão.

Contas feitas, não tenho dúvidas de que a permanência da Web Summit traz vantagens consigo, mas também tenho a certeza de que a factura devia vir discriminada logo desde o primeiro dia.

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