PSD: Um encontro para fechar a silly season e abrir a guerra
Conselheiros nacionais do PSD reuniram-se pela primeira vez desde que Pedro Santana Lopes saiu do partido. Mas a sombra de Santana não faltou ao encontro.
O primeiro Conselho Nacional do PSD pós-férias, realizou-se esta quarta-feira à noite, nas Caldas da Rainha, com três assuntos na agenda, o último dos quais terá acabado por ser adiado para Novembro: documento estratégico sobre Saúde, regulamento eleitoral e propostas de alteração estatutária.
A reunião, com início previsto para as 21h, mal tinha começado à hora de fecho desta edição e já tinha muitos conselheiros inscritos para intervir. Começaram a falar o presidente da distrital de Leiria e o presidente da Câmara de Caldas da Rainha, para dar as boas-vindas. Mas logo foram apresentadas duas moções, uma sobre empresas e inovação e outra sobre apoio à comunidade portuguesa na Venezuela (ambas aprovadas).
O cenário da reunião foi descrito como sendo parecido com o dos congressos, com os elementos da mesa num palco em tons de laranja e muitos conselheiros presentes. Tendo em conta algumas vozes ouvidas pelo PÚBLICO durante o dia, o encontro ameaçava ficar marcado pela análise ao estilo de liderança que Rui Rio (não) exibiu durante o Verão, pelas mais recentes sondagens, pelos ataques internos aos críticos no PSD e pelo rigor com que a direcção tem tratados casos relacionados com os gastos das campanhas para as autárquicas de 2017. "Estou cheiinho de medo", disse Rio à entrada, respondendo aos críticos passados e futuros.
A posição “meiga” de Rui Rio sobre a “taxa Robles” (e a proposta, muito parecida, que Rio ontem prometeu apresentar em sede de Orçamento do Estado), a entrevista em que Pedro Duarte se disponibilizou para vir a ser candidato à liderança e o documento sobre políticas de saúde eram dados como exemplos de outros temas que poderiam criar tensão e que serviriam para mostrar que a silly season acabou e começou a guerra a sério. Tanto para o PSD como para o líder mostrarem o que valem.
A propósito da "taxa Robles", Rui Rio explicou antes do conselho nacional a sua ideia. "Acho que faz muito sentido o PSD, em sede de Orçamento, apresentar uma proposta que materialize isto: que aqueles que andam a provocar preços especulativos paguem um imposto superior àqueles que não o fazem”, disse, citado pela Lusa e referindo que, em França, quem “retém imóveis” durante décadas não paga qualquer imposto sobre as mais-valias. Rui Rio explicou estar a falar de diferenciar a taxa do IRS já existente sobre mais-valias e não "de uma nova taxa".
A histórica militante Virgínia Estorninho, horas antes de falar aos restantes conselheiros (o que viria a acontecer ainda antes do período da ordem do dia) assumiu ao PÚBLICO as razões que a levaram às Caldas da Rainha e os assuntos sobre os quais gostaria de falar: a saída de Pedro Santana Lopes do PSD, que se terá tornado no ausente mais presente na reunião; e o desafio de Rui Rio aos críticos, para que abandonassem o partido.
O presente-ausente
A conselheira nacional, que é também deputada municipal em Lisboa, não gostou de ouvir Rui Rio e quis manifestar o seu descontentamento na presença do líder do partido. “Espero que em deixem falar e vou dizer aquilo que tenho de dizer”, declarou horas antes de a reunião começar.
Mas se esta questão a incomoda, a saída de Pedro Santana Lopes do partido incomoda-a muito mais. A histórica do partido não aceita a “traição” de deixar o PSD. “Sinto-me totalmente traída, aquilo que ele fez não tem perdão”, desabafa, referindo que o ex-provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa foi “desleal para com o PSD e para com os 44 e tal por cento de militantes que votaram nele nas eleições directas".
“Santana Lopes deixou-nos a todos dependurados, não soube perder, e na política é preciso saber perder”, declara, sublinhando que “uma pessoa que teve tantas responsabilidades no PSD não podia sair para formar um partido novo”.
Mais um caso de contas
Horas antes de a reunião começar nas Caldas da Rainha, soube-se que o PSD contactou o mandatário financeiro do candidato à Câmara Municipal de Oeiras por causa de uma dívida de cerca de 80 mil euros relacionada com a campanha.
A notícia foi confirmada ao PÚBLICO por Ângelo Pereira, que foi o cabeça de lista do PSD àquele município em 2017, e acabou por marcar o ambiente em que decorreu a reunião. A direcção nacional, contactada pelo PÚBLICO, não quis comentar o caso.
Ângelo Pereira disse não perceber a atitude da direcção nacional do partido, uma vez que as contas foram apresentadas à sede nacional e auditadas por uma empresa. “Não percebo a que é que se deve este eventual processo. Todos os gastos foram concertados com a direcção anterior”, assegurou, acrescentando que já pediu uma reunião ao secretário-geral para resolver a questão. O seu mandatário financeiro terá sido contactado no final de Julho.
Lembrando que foi candidato em condições difíceis – tendo como adversários Isaltino Morais e Paulo Vistas –, Ângelo Pereira diz ter gasto 200 mil euros na campanha “muito menos do que Francisco Moita Flores em 2013 e o mesmo que Isabel Meireles, agora vice-presidente do PSD, quando foi candidata em 2009”.
O vereador aponta uma explicação para este caso. “Não quero acreditar que seja uma perseguição política por ter sido apoiante de Pedro Santana Lopes [nas directas do PSD]. Isto está a parecer-me um ataque político”, afirma.
O líder da distrital de Lisboa, Pedro Pinto, assegura não ter sido contactado por ninguém da direcção sobre o assunto nem a possibilidade de ser interposto um processo em tribunal ao candidato. “Não acredito que seja verdade. É disparate demais para ser verdade”, disse, recusando fazer mais comentários. com Sónia Sapage