Pais, as aulas estão à porta, nada de stress!

Quem fica mais ansioso antes do novo ano lectivo, pais ou filhos? O PÚBLICO foi ouvir os conselhos de alguns especialistas para tornar o regresso às aulas um momento natural.

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Com todo o corrupio em torno do início do ano lectivo é caso para dizer "calma e seja feliz", uma quase tradução do inglês “don’t worry, be happy”. Para que tudo corra bem é necessário não deixar o arranque do ano lectivo para a última da hora e dar algumas responsabilidades aos mais pequenos, aconselham os especialistas ouvidos pelo PÚBLICO. Por exemplo, os filhos podem organizar o material e livros. Depois, cabe aos pais transmitir-lhes alguma tranquilidade e, muito importante, deixá-los ser crianças e brincar.

1. Como ter tudo preparado para o início de aulas?

Primeiro, faça uma lista do que é preciso. No topo costumam estar os manuais escolares que, pela primeira vez este ano, são gratuitos, a nível nacional, do 1.º  ao 6.º ano. Depois há que comprar o restante material escolar que, por norma, consta de uma lista dada pela escola. No entanto, ter tudo a postos não se cinge ao material ou à secretária arrumada. “Dificilmente se terá a certeza de ter tudo preparado, mas, no essencial, importa vincar que mais importante do que o material, importa ir preparando um conjunto de questões paralelas”, diz o pedagogo Renato Paiva. Como por exemplo? “Desde regular rotinas de sono até à preparação e reflexão sobre que condutas pretendemos, que preocupações teremos em consideração, que apoios possam ser necessários...”, acrescenta o autor de livros como Ensina o Teu Filho a Estudar e O Segredo para Alcançar Sucesso na Escola. Se, depois, algo importante escapar, também não é o fim do mundo, salvaguarda.

Para João Lopes, professor da Escola de Psicologia da Universidade do Minho, “não é necessária qualquer preparação especial. Bastará ter os materiais necessários e comparecer no início das aulas”. Tão simples quanto isto. No entanto, ambos aconselham os pais a mostrarem-se tranquilos e confiantes para que os filhos também o estejam. “E se sintam entusiasmados com o regresso às aulas”, acrescenta Renato Paiva.

2. Como transmitir confiança aos filhos, sobretudo quando mudam de escola?

“Em primeiro lugar, não se percebe por que é que voltar às aulas há-de provocar stress, mudando-se ou não de escola”, começa por dizer João Lopes. Mas se uma criança sentir ansiedade, “terá simplesmente que aguentar. Isso não lhe provocará qualquer dano”, assegura. “Diria mais: a maioria das crianças está é ansiosa por rever os colegas”, acrescenta. 

Viver em constante stress é uma bola de neve. “Uma sociedade, que vive demasiado preocupada com o stress, é certamente uma sociedade stressada pelas suas preocupações e não pelas situações em si”, alerta. Para quê entrar em quase “pânico em situações absolutamente vulgares, como é o caso do regresso às aulas”? Não adianta de nada. Só vai pôr a criança ainda mais ansiosa.

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Mas, se for daqueles pais que não conseguem evitar a ansiedade, faça um esforço por não demonstrá-la, aconselha Renato Paiva. É meio caminho andado para que a criança se sinta segura e confiante. “E a criança saber o que vai encontrar é uma mais-valia para não ficar stressada!”, continua o pedagogo. Por isso, cabe aos pais tranquilizar os filhos, falando-lhes sobre a mudança “Abordar, mais em concreto, o que vai ser diferente, para preparar a criança para o que vai encontrar , fornecendo estratégias sobre o que fazer em determinadas situações para que não seja apanhada desprevenida”. 

3. Não os stressar com exames, testes e trabalhos de casa

Já se sabe que não há milagres e que os bons resultados vêm com dedicação e esforço. Para o professor João Lopes, “a melhor forma de diminuir o stress e incerteza face aos testes, é estudar. Com tempo e com método”. Ora, aí está. Estar atento nas aulas, fazer os TPC e estudar para os testes. O aluno deve partir do princípio de que “existe um percurso que não começa nas vésperas dos testes e exames”, sublinha Renato Paiva. O que fazer então? “Promover um estudo atempado e regular, salientar a importância de não acumular dúvidas, organizar-se atempadamente para que nas épocas de testes e exames não tenha trabalho de estudo acumulado para evitar maratonas de estudo”, aconselha Renato Paiva, que ressalva, que se deve “atribuir maior importância ao processo, à atitude e ao empenho do que ao resultado do teste em si”.

4. Conhecer os professores e os amigos dos filhos?

Neste ponto os dois especialistas em educação estão de acordo. Mas, para João Lopes, é mais importante conhecer o professor no 1.º ciclo, precisamente por ser um único professor a leccionar as várias disciplinas, “tem influência máxima sobre as crianças”, diz. Pelo que, continua, “será mais importante conhecê-lo, sobretudo para aquilatar da sua competência para ensinar”. 

Para Renato Paiva, conhecer os professores é uma boa forma de articular estratégias “sempre que necessitamos de um trabalho em equipa”. Para o pedagogo, é importante ir falando com os professores para receber e dar feedback. “Ajuda a não deixar prolongar no tempo situações menos positivas e trocar informações sobre como melhorar todo um sistema em benefício da criança”, aconselha. Não precisa de falar todos os dias e a toda a hora, mas sim, que a comunicação seja regular. 

Quanto aos amigos dos filhos, é importante conhecê-los para se perceber o tipo de companhias. “Saber que gostos têm, que tipo de influência podem causar”, enumera Renato Paiva. João Lopes acrescenta que este “conhecimento também é mais importante na adolescência, para salvaguardar eventuais situações indesejáveis”. E adverte para o facto de que “os adolescentes problemáticos tendem a procurar adolescentes problemáticos, o que significa que, mais importante do que conhecer os amigos, é perceber qual é o tipo de desenvolvimento do próprio filho”. Conselho de ouro: “Se a evolução for favorável e o sujeito for orientado para as tarefas escolares, seguramente não irá procurar companhias eventualmente problemáticas.”

5. Como reagir e intervir se o seu filho ou filha se porta mal?

“Seja em que contexto for, as regras são para cumprir; e as regras e condutas comportamentais também”, defende Renato Paiva. Opinião corroborada por João Lopes que diz mesmo que, se o seu filho se portar mal, deve ser chamado à atenção. “Neste caso, os professores têm de intervir imediatamente e aplicar as consequências inerentes ao tipo de mau comportamento”, sublinha João Lopes que se tem dedicado à área dos problemas de comportamento e de aprendizagem em contexto de sala de aula.

Muito importante: Não se esqueça que os mais novos são uma esponja, absorvem tudo o que vêem e depois tudo funciona como uma espécie de espelho. Na prática, quando se portam mal, se lhes responderem aos gritos, baterem ou humilharem, é natural que reproduzam esses comportamentos na escola. “Devemos manter uma postura tão serena quando possível, somos o modelo a imitar e é a serenidade que queremos transmitir”, aconselha Renato Paiva. Quando a criança se porta mal, o melhor é conversar, clarificar e relembrar as regras. “Ajuda a focar e acalmar”, defende, aconselhando a “acolher a criança de forma mais emocional para que se acalme. Um abraço forte e prolongado dá uma ajuda imensa, e depois sim, racionalmente repreender o comportamento indesejado”.

6. O que fazer quando a criança é vítima de bullying?

Incentivar a denúncia do abuso. Nisto estão os dois especialistas de acordo. “Esconder e aguardar que as coisas se resolvam só piora a situação. Quanto mais precocemente se agir, melhor será para todos”, afirma Renato Paiva. Assim como “utilizar todas as medidas necessárias para que os abusadores fiquem impossibilitados de repetir as ofensas”, acrescenta João Lopes. Para o pedagogo, o contexto em que a criança está inserida “deve dar uma resposta firme. A vítima tem de se sentir protegida e apoiada”. Defende mesmo que é prioritária a comunicação e articulação de estratégias entre a escola e a família. Em casos mais graves, deve ser chamada a Escola Segura da PSP a intervir. 

7. A criança deve ter muitas actividades extra-curriculares? 

Não, deixe-os brincar, saltar à corda e correr até caírem de sono na cama. “Brincar é fundamental para o desenvolvimento infantil”, diz Renato Paiva. “Eles precisam de tempo para ser crianças, tempo para brincar, conviver e tempo para, com calma aprender e crescer”, sublinha.

Há crianças que têm o dia cheio de actividades depois das aulas, desde os trabalhos de casa às explicações, passando pelas línguas e o desporto. Acaba por ser um “lufa-lufa de logística diária para os pais e crianças, a andar a saltar de actividade em actividade, que naturalmente causa desgaste físico e emocional”, diz. Mas a criança acaba também “saturada com actividades estruturadas”, alerta. 

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Para João Lopes, há que saber gerir o tempo, ainda que seja difícil. “Até a própria escola ocupa tempo a mais na vida das crianças”, refere. Muitas passam o dia na escola, quando antigamente, iam da escola para casa. Nesse tempo, lembra, “as crianças eram muito deixadas a seu próprio cargo ou de irmãos e brincavam com frequência na rua ou nos campos”. O que “hoje é impossível (na rua há hoje muitos carros e no campo quase não há crianças).” 

No meio de tudo isto, onde fica a imaginação e a criatividade, “que são características bastante apreciadas e valorizadas quando somos adultos”, continua. Essas fomentam-se e promovem-se com “momentos e actividades destruturadas, sem hora nem dia marcado”, diz.

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