Os prémios da Caixa são um abuso
O anúncio do pagamento de prémios excepcionais aos trabalhadores da Caixa não é apenas causa de perplexidade por vir de uma administração do rigoroso Paulo Macedo; é principalmente um insulto a todos os que através dos seus impostos tiveram de resgatar a Caixa da falência. Expliquemo-nos: nem os resultados da CGD são assim tão excepcionais para justificar o bodo aos trabalhadores, nem se encontra nenhum motivo para que a administração não se preocupe acima de tudo em devolver ao Estado o dinheiro que o Estado investiu na limpeza das suas contas. Os prémios de Paulo Macedo aos funcionários bancários mais favorecidos do país só se entendem e aceitam sem protesto porque a redoma com que o Governo protege o sector público em detrimento do interesse geral do país é cada vez mais nítida, sólida e inquestionável.
Comprar paz social com dinheiro faz parte do cardápio de soluções dos conflitos laborais em democracia, e percebemos que Paulo Macedo e os seus pares tenham usado este argumento velho e relho para esvaziar a greve marcada para esta sexta-feira. Com 194 milhões de lucros no primeiro semestre, a administração da Caixa tinha até alguma folga financeira para esse gesto magnânimo. O problema é que há uma condição ética e uma exigência cívica a perturbar este raciocínio aparentemente bondoso. Há uma história que arrasa a lógica convencional da negociação. Se a Caixa dá lucro (e ainda assim menos do que boa parte dos concorrentes directos), é porque pôde contar com quase quatro mil milhões de euros do Estado, uma soma que arrastou o défice público para os 3% em 2017.
Devolver o mais rapidamente possível à sociedade o dinheiro que a sociedade aplicou na salvação da Caixa é a primeira obrigação da sua administração e dos seus trabalhadores, porque a reestruturação que foi imposta ao banco pela Comissão Europeia para autorizar o seu resgate é, apesar de tudo, mais suave da que seria aplicada por accionistas privados ou credores externos. A Caixa flutua, porque o país pagou por isso e nesta fatalidade custa ver razão para prémios excepcionais. Paulo Macedo e a sua equipa arrogam-se agir de forma diferente apenas porque em Portugal o Estado e o sector público são entes ungidos por protecções especiais e inacessíveis ao comum dos cidadãos. Se o “orçamento é de todos os portugueses”, como disse e bem o ministro Mário Centeno, o dinheiro da recapitalização da CGD também o devia ser.