Sargaço invadiu as águas azul-turquesa e o areal branco das praias do México
Desde 2011 que se detectam grandes acumulações de sargaço na costa do Sudeste mexicano. Mas este ano essa alga acastanhada chegou em quantidades ainda maiores. Porquê?
O sargaço tem invadido as águas azul-turquesa límpidas e o areal branco da costa caribenha do México. Só este ano já se retiraram das praias mais de 120 mil metros cúbicos desta alga. Cientistas têm alertado para o possível desastre ecológico e para as consequências no turismo. Já começaram a instalar-se barreiras no mar para desviar a alga e criou-se um comité técnico-científico para responder a este problema que se arrasta no país (e noutros das Caraíbas) desde 2011 mas que este ano chegou em quantidades ainda maiores.
O sargaço é uma macro-alga marinha castanha do género Sargassum e pertence principalmente às espécies Sargassum natans e Sargassum fluitans. Esta alga sustenta um ecossistema diverso em oceano aberto, no qual vivem tartarugas marinhas, peixes, invertebrados ou aves e é um sítio de reprodução para muitos organismos. Ao longo dos tempos, a distribuição de sargaço tem-se concentrando no mar dos Sargaços, no meio do giro subtropical do Atlântico Norte. Ocasionalmente, esta alga flutua até ao Norte, Leste e Oeste das Caraíbas. Em 2011, houve uma grande afluência de sargaço desde Trindade até à República Dominicana e ainda na costa Oeste de África. No ano seguinte, a costa do Sul de Cuba também foi afectada e em 2014 estendeu-se a mais ilhas e países das Caraíbas.
No México, a acumulação de sargaço também tem sido detectada desde 2011. “Os anos de 2015 e 2018 têm sido especialmente graves no afluxo de sargaço”, diz ao PÚBLICO Brigitta van Tussenbroek, do Instituto de Ciências do Mar e da Limnologia (ICML) da Universidade Nacional Autónoma do México. Ainda não há números oficiais mas pensa-se que este ano o sargaço aumente cerca de duas a três vezes relativamente a 2015. E é provável que continue assim até, pelo menos, Outubro. “Está em todas as Caraíbas com excepção do Sul”, refere, indicado que afecta toda a costa caribenha do México.
As acumulações de sargaço têm sido assim um problema no estado de Quintana Roo, localizado no extremo Sudeste do país, onde ficam destinos turísticos como Cancún. Citado pelo jornal mexicano El Universal, Carlos Joaquin González, governador desse estado, disse que as acumulações são maiores nos municípios de Puerto Morelos, Playa del Carmen e Mahahual. Segundo o Secretário da Ecologia e do Ambiente mexicano, Alfredo Arellano, já foram retirados mais de 120 mil metros cúbicos em sete municípios desde o final de Junho.
Mas de onde vem esta alga? “A hipótese mais provável é que na última década uma nova acumulação se tenha formado na área equatorial do Atlântico Norte, entre África e o Brasil”, responde Brigitta van Tussenbroek. Não se sabe bem quais as causas, mas podem estar ligadas a mudanças nas correntes oceânicas, às alterações climáticas ou aos transportes. “Mas nesta área o sargaço alcança taxas elevadas de crescimento porque [a água] é mais quente e mais rica em nutrientes do que o mar dos Sargaços”, acrescenta.
O grande problema é que a alga chega em grandes quantidades à costa, fica a flutuar no mar ou acumulada na areia e decompõe-se. “Quando chegam quantidades enormes, ficam acumuladas na costa. Dentro de água e na areia começam a decompor-se, o que acrescenta muita matéria orgânica ao sistema, mudando a cor da água”, disse Marta García Sánchez, também do ICML, ao jornal mexicano El Financiero. “Muitos organismos que vivem no fundo [do mar], como os prados marinhos, precisam da luz do Sol. Alguns já desapareceram em algumas zonas.”
Brigitta van Tussenbroek indica ainda que o sulfeto de hidrogénio do sargaço é tóxico para os humanos quando são expostos de forma crónica. E frisa que o mais preocupante são as alterações que pode provocar nos ecossistemas devido ao aumento de nutrientes e de matéria orgânica – afinal, aquelas águas são cristalinas porque têm poucos nutrientes –, o que pode causar a degradação de recifes, prados marinhos ou praias. As duas cientistas chegaram mesmo a afirmar na semana passada ao El Universal que, a muito curto prazo, poderíamos estar perante um desastre ecológico.
E o turismo?
Outras das consequências são as perdas no turismo, o que poderá causar prejuízos não só na região como no país, pois é uma das grandes fontes de rendimento do México. María Teresa Trejo, subsecretária do Planeamento e Política Turística mexicana, garante em comunicado que até ao momento não tem havido cancelamentos por parte dos turistas e que a ocupação hoteleira em Quintana Roo é de 91%. Mas nem todos estão tão optimistas: segundo o jornal The Yucatan Times, na Playa Gaviota Azul, em Cancún, a restauração registou perdas de mais de 95% nas vendas no início de Julho, em apenas duas semanas.
E quanto às agências de viagens? “Temos conhecimento [do problema] mas, até agora, não houve impacto”, disse ao PÚBLICO Alberto Machado, assessor de imprensa da Agência Abreu, adiantando que os hotéis para os quais a agência trabalha têm tentado resolver o problema. A Top Atlântico também referiu que mantém contacto com os principais hotéis e operadores turísticos e consulta as informações das entidades governamentais da região para estar a par da regularidade das limpezas, assim como quais os hotéis que têm mais cuidado nessa limpeza. “Não temos registo de desmarcações, mas no processo de venda há alguns clientes que preferem optar por outros destinos ao serem alertados para esta ocorrência”, lê-se numa resposta enviada pela direcção de marketing e comunicação da agência.
Também o site de viagens TripAdvisor tem fóruns sobre o problema. Alguns turistas têm-se queixado do cheiro forte do sargaço, assim como de operadoras que não os têm alertado para tal. Outros referem que a situação “está tranquila” e que os funcionários do hotel – ou funcionários públicos – limpam todas as manhãs a praia. Alguns trabalhadores na praia também se têm queixado desta situação. É o caso de uma massagista de Puerto Morelos, Lilia del Carmen, ao El Universal: “Tínhamos dez clientes por dia e agora são dois ou até nada.”
Neste momento, para resolver a situação – além da remoção manual ou com máquinas – foi criado o Comité Estatal Técnico-científico com várias instituições científicas para que se meça o dióxido de carbono libertado pelo sargaço, se recolham várias informações meteorológicas e se estude o futuro uso da alga, que agora é usado como alimento para o gado. Também já começaram a ser montadas barreiras – que não afecte as áreas protegidas – para conter e desviar o sargaço dentro do mar e evitar que chegue às praias. A ideia é redireccionar estas algas através das correntes marinhas.
Mesmo assim, Brigitta van Tussenbroek (que faz parte do comité) considera que a resposta tem sido descoordenada e pouco eficaz. Para si, seria necessário “um plano de gestão costeiro integrado para prevenir a chegada de grandes quantidades de sargaço. O melhor seria que não alcançasse a costa. Mas tudo dependerá das condições locais e dos recursos económicos.”
Este problema até já deu origem a uma sessão do artista norte-americano Spencer Tunick conhecido por fotografar várias pessoas em corpo nu. “Invasão de sargaço”, escreveu no Instagram sobre uma fotografia.