Puigdemont aguarda pela "receita" de Sánchez para resolver a crise catalã

De volta à Bélgica, o ex-presidente da Generalitat avisa que a bancada parlamentar catalã não passou um cheque em branco ao novo Governo de Madrid e exige um plano que ponha fim ao impasse político.

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Carles Puigdemont, com Quim Torra, na delegação da Catalunha junto à UE LUSA/STEPHANIE LECOCQ
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Jornalistas estrangeiros fizeram selfies com Puigdemont após a conferência de imprensa Reuters/ERIC VIDAL

O novo presidente do Governo espanhol, Pedro Sánchez, tem que passar rapidamente “das palavras aos actos” e apresentar ao Parlamento, e ao país, o seu plano para “solucionar a questão política do direito de autodeterminação da Catalunha”, defendeu este sábado o ex-president do governo autónomo da Catalunha, Carles Puigdemont, que regressou a Bruxelas depois de quatro meses e quatro dias de detenção e julgamento na Alemanha para “prosseguir a luta” pela causa independentista.

Pronunciando-se pela primeira vez sobre o novo chefe do executivo espanhol, empossado no início de Junho na sequência da moção de censura que derrubou o anterior Governo do PP, responsável pela aplicação do artigo 155.º da Constituição que retirou a autonomia à Catalunha, Carles Puigdemont aconselhou o líder do PSOE a não interpretar o apoio recebido da bancada parlamentar catalã como um “cheque em branco” e a “fazer os trabalhos de casa” durante o período de férias, para que na reentré política possa haver maior clarificação sobre o que pretende fazer para resolver a crise que se vive na Catalunha.

“Não se pode querer os votos para se tornar presidente e depois não actuar em conformidade. Todos esperamos para ver qual é a receita Sánchez, se é que existe, para lidar com um problema político, que é a petição para o exercício da autodeterminação do povo catalão”, insistiu Puigdemont, que lembrou que “todos os estados de graça acabam” e por isso Pedro Sánchez terá de fazer mais do que prometer diálogo. “Tem a responsabilidade de ir mais além e passar das palavras aos actos”, reclamou.

Carles Puigdemont apresentou-se feliz, e por vezes até emocionado, numa concorrida conferência de imprensa na delegação da Catalunha junto da União Europeia, à qual acorreram vários dirigentes políticos catalães, alguns dos quais exercem funções no actual governo autónomo saído das eleições de 22 de Dezembro, e outros que participaram no anterior executivo, dissolvido pelo Parlamento de Madrid com a aplicação do artigo 155.º da Constituição. “Este é um encontro entre o governo de 155 no exílio, e o governo que derrotou o 155”, brincou Puigdemont, que como todos os anteriores líderes da Generalitat, continua a reter o título de president.

O líder independentista refugiou-se na Bélgica em Outubro do ano passado, quando foi acusado de rebelião e sedição pela justiça espanhola, depois de ter organizado um referendo e declarado unilateralmente a independência da Catalunha. Puigdemont acabou por ser detido na Alemanha, em viagem de volta a Bruxelas depois de uma conferência na Finlândia: o juiz do Supremo Tribunal espanhol, Pablo Llarena, tinha emitido uma ordem internacional para a sua captura. Essa ordem foi cancelada há uma semana, depois de a justiça alemã deitar por terra as acusações mais graves contra o antigo líder da Generalitat.

Autodeterminação é o tema das conversas

Ao seu lado no pódio da delegação catalã, este sábado, esteve o novo presidente do governo autónomo, Quim Torra, que subscreveu todos os reparos do seu antecessor à "situação de extrema gravidade política” que se vive na Catalunha, com exilados e presos políticos, repressão e uma “farsa de justiça”. “O que se passa é mais do que uma indecência. É a maior vergonha da Espanha democrática”, considerou.

Torra disse que o impasse político na Catalunha exige “diálogo, diálogo, diálogo” e mais uma vez disse estar disponível e preparado para se sentar à mesa e, sem pré-condições, discutir com o Governo de Madrid até aparecer uma solução política para a crise catalã. Segundo lembrou, num primeiro encontro com Pedro Sánchez ficou claro que as posições de Madrid e Barcelona são “absolutamente opostas” — se for necessário, o processo de diálogo poderá decorrer sob mediação internacional, acrescentou.

No entanto, tal como Puigdemont, Torra sublinhou que existe um contexto para as negociações, e que este é o mesmo que determina a acção política da Generalitat e do parlament da Catalunha: “O tema desta legislatura é a defesa do direito à autodeterminação, e associado a ele, naturalmente, o tema da liberdade. Não podemos perder isso de perspectiva. É a isso que temos de dar resposta”, afirmou.

Na Bélgica, onde funciona o autoproclamado Conselho da República da Catalunha e onde vai continuar a residir, Carlos Puigdemont está preparado para continuar a bater-se pela causa da soberania. “A minha viagem até aqui não foi fácil. Mas não vou parar aqui. Continuarei a viagem, até ao último canto deste continente, em defesa da causa justa da autodeterminação”, prometeu, garantindo que não vai parar “até que os presos sejam libertados, os exilados regressem e os catalães possam decidir sobre o seu futuro sem a ameaça da violência”.

Questionado sobre se teria condições para se manter no combate pela independência a partir do estrangeiro, Puigdemont disse que nunca como agora sentiu maior apoio dos europeus sobre as demandas dos catalães. “Hoje, em todo o mundo, todos conhecem a nossa causa. Nunca teríamos chegado onde chegamos sem o apoio popular, e creio que no próximo 11 de Setembro [dia nacional da Catalunha] todos poderão ver a força do nosso movimento.”

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